Ano da crucificação
Embora não haja consenso sobre
a data exata da crucificação, os estudiosos geralmente concordam que ela
ocorreu numa sexta-feira de ou próxima da Páscoa judaica (15 de Nisan), durante
o governo de Pôncio Pilatos (c. 26-36). Como o calendário hebreu era utilizado
no tempo de Jesus e ele incluía a determinação dada de uma nova fase da lua e
do amadurecimento da colheita da cevada, o dia - e mesmo o mês - exato da
Páscoa judaica num determinado ano é tema de muita especulação. Várias
abordagens já foram utilizadas para estimar o ano da crucificação, inclusive o
uso dos evangelhos canônicos, a cronologia da vida de Paulo de Tarso, assim
como diferentes modelos astronômicos. Estas estimativas para o ano da
crucificação resultaram numa faixa entre 30 e 36 d.C. Uma data frequentemente
sugerida é sexta-feira, 3 de abril de 33.
Crucificação vista a partir da cruz. 1886-1894. Por James Tissot, atualmente no Brooklyn Museum, em Nova Iorque. |
Dia da semana e hora
O consenso entre os estudiosos
modernos é de que os relatos do Novo Testamento representam a crucificação
ocorrendo numa sexta-feira, mas datas de quinta ou quarta já foram propostas.
Alguns deles propuseram a data de quinta baseadas num "duplo sabbath"
causado por um sabbath de Páscoa adicional caindo entre o pôr do sol de uma
quinta e a tarde de uma sexta à frente do sabbath semanal de costume. Outros
argumentaram que Jesus foi crucificado numa quarta e não numa sexta, com base
na menção de "três dias e três noites" em Mateus 12:40 antes de sua
ressurreição, celebrada no domingo, ao que foram contestados por acadêmicos
explicando que esta tese ignora o idioma judaico, no qual um "dia e
noite" pode se referir a qualquer parte de um período de 24 horas, que a
expressão em Mateus é idiomática e não uma afirmação de que Jesus teria passado
72 horas no túmulo e que muitas referências à ressurreição no terceiro dia não
requerem literalmente três noites.
Em Marcos 15:25, afirma-se que
a crucificação ocorreu na hora terceira (9 da manhã) e que a morte de Jesus
ocorreu na hora nona (3 da tarde). Porém, em João 19:14, Jesus ainda está
perante Pilatos na hora sexta. Os acadêmicos já apresentaram diversos
argumentos para tratar desta aparente contradição, alguns sugerindo uma
reconciliação, por exemplo, baseando-se na tese da utilização do sistema
horário romano em João, mas não em Marcos, argumento rejeitado por outros.
Diversos estudiosos notáveis argumentaram que a precisão moderna na marcação
dos horários durante o dia não deve ser projetada nos relatos evangélicos, escritos
numa época quando não havia a padronização dos mecanismos de contagem de tempo
e nem um registro exato das horas e minutos estava disponível. Geralmente o
horário era aproximado para a o período de três horas mais próximo.
Os três evangelhos sinóticos
fazem referência a um homem chamado Simão Cirineu, que foi obrigado a carregar
a cruz, enquanto que, no Evangelho de João, diz-se que Jesus
"suportou" sua própria cruz (João 19:17).
O Evangelho de Lucas também
descreve uma interação entre Jesus e as mulheres que estavam na multidão de
lamentadores que o seguia, citando Jesus dizendo: «Filhas de Jerusalém, não
choreis por mim; mas chorai por vós mesmas e por vossos filhos, porque dias
virão, em que se dirá: 'Bem-aventuradas as estéreis, os ventres que nunca
geraram e os peitos que nunca amamentaram.' Então começarão a dizer aos montes:
'Cai sobre nós', e aos outeiros: 'Cobri-nos', porque se isto se faz no lenho
verde, que se fará no seco?» (Lucas 23:28-31).
Tradicionalmente, o caminho que
Jesus tomou é chamado de Via Dolorosa (latim para "Caminho Doloroso")
e é uma rua na Cidade Velha de Jerusalém. Ele está marcado por nove das
quatorze "Estações da Cruz" e passa pela Igreja Ecce Homo. As demais
cinco estações estão localizadas dentro da Igreja do Santo Sepulcro.
Não há referências à lendária
Santa Verônica nos evangelhos, mas fontes como a Acta Sanctorum descrevem-na
como uma mulher piedosa de Jerusalém que, por pena de Jesus que carregava sua
cruz até o Gólgota, deu-lhe seu véu para que ele limpasse a testa e o rosto.
Local da crucificação
A localização precisa da
crucificação permanece tema de muitas conjecturas, mas os relatos bíblicos
indicam que ela ocorreu fora dos muros da cidade, num local acessível aos que
passavam e passível de ser observado a distância. Eusébio de Cesareia
identificou sua localização como sendo ao norte do Monte Sião, local
consistente com os dois locais mais citados em tempos modernos.
Calvário é uma palavra que
deriva da palavra latina para "caveira" (calvaria), que é utilizada
na tradução Vulgata como "local da caveira", a explicação dada nos
quatro evangelhos para a palavra aramaico Gûlgaltâ,
que era o nome do local da crucificação. Os evangelhos não explicam por que ele
era chamado assim, mas diversas teorias já foram propostas. Uma é de que, como
o local se prestava às execuções públicas, o Calvário poderia estar repleto de
caveiras de vítimas abandonadas (o que seria contrário às tradições funerárias
judaicas, mas não às romanas). Outra é de que o Calvário foi chamado assim por
causa de um cemitério próximo (o que é consistente com ambos os locais
propostos em tempos modernos). Uma terceira teoria é de que o nome deriva do
contorno físico do local, o que seria mais consistente com o uso da palavra no
singular, ou seja, "local da caveira". Mesmo sendo geralmente chamado
de "Monte do Calvário", o local era provavelmente uma pequena colina
ou um formação rochosa.
O local tradicional, localizado
dentro da atual Igreja do Santo Sepulcro no Bairro Cristão da Cidade Velha, foi
atestado já no século IV. Um segundo local (geralmente chamado de
"Calvário de Gordon"), localizado mais ao norte da Cidade Velha,
perto de um local popularmente chamado de Túmulo no Jardim, tem sido alardeado
como o local correto desde o século XIX, principalmente pelos protestantes.
Pessoas presentes na crucificação
Mateus 27:1-66 apresenta
diversos indivíduos presentes na crucificação. Dois "rebeldes" ou
"ladrões" foram crucificados juntamente com Jesus, um à direita e
outro à esquerda (v. 38). Há ainda o centurião e outros soldados guardando
todos os crucificados (v. 54). Além disso, observando à distância, estavam
"muitas mulheres", seguidoras de Jesus durante o seu ministério (v.
55), principalmente "Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago e de José e a
mulher de Zebedeu" (v. 56).
Lucas 23:28-31 afirma que, no
caminho do Calvário, Jesus falou com diversas mulheres que estavam na multidão,
chamando-as de "filhas de Jerusalém". Estudiosos bíblicos já
apresentaram diversas teorias sobre a identidade delas e também das que estavam
presentes na crucificação, incluindo entre elas Maria, mãe de Jesus, e Maria
Madalena.
Lucas não menciona que a mãe de
Jesus estava presente durante a crucificação, porém João 19:26-27 relata a sua
presença e afirma que, na cruz, "Jesus, vendo a sua mãe e perto dela o
discípulo a quem ele amava, disse a sua mãe: Mulher, eis aí teu filho!".
O Evangelho de João também
coloca outras mulheres (as Três Marias) ao pé da cruz, afirmando que
"Perto da cruz de Jesus estavam sua mãe, e a irmã de sua mãe, Maria,
mulher de Cléopas, e Maria Madalena." É incerto se o Evangelho de João se
refere no total a três ou quatro mulheres na cruz. Referências às mulheres
também aparecem em Mateus 27:56 e Marcos 15:40 (que também menciona Salomé).
Comparando as referências, todos parecem incluírem Maria Madalena.
O Evangelho de Marcos afirma
que soldados romanos também estavam presentes na crucificação: «O centurião,
que estava em frente de Jesus, vendo-o assim expirar, disse: Verdadeiramente
este homem era Filho de Deus.» (Marcos 15:39)
Método e forma da crucificação
Como o Novo Testamento não
fornece detalhe exatos sobre o processo da crucificação de Jesus, vários
elementos do método empregado tem sido tema de debates.
Formato do cadafalso
Ainda que a maior parte dos
cristãos acredite que o cadafalso no qual Jesus foi executado seja a
tradicional cruz de duas traves, existe um debate sobre o ponto de vista
defendido por alguns de que uma estaca simples teria sido utilizada. As palavras
gregas e latinas utilizadas nos primeiros escritos cristãos são ambíguas. Os
termos em grego koiné utilizados no
Novo Testamento são stauros e xylon. Esta última significa
"madeira" (uma árvore viva, lenha ou um objeto construído de
madeira); nas formas antigas do grego, o primeiro termo significava uma estaca
vertical ou um poste, mas em grego koiné
ele também é utilizado para descrever a cruz. A palavra latina crux também foi aplicada a objetos que
não são cruzes.
Porém, os primeiros escritores
cristãos que trataram do formato do cadafalso no qual Jesus morreu
invariavelmente o descrevem como tendo uma trave horizontal. Por exemplo, na
Epístola de Barnabé, que é certamente anterior a 135 e que pode ser do século
I, a época em que relatos evangélicos sobre a morte de Jesus foram escritos, o
cadafalso foi descrito como similar à letra "T" (a letra grega tau) e à posição assumida por Moisés em
Êxodo 17:11-12. Justino Mártir (100-165) explicitamente afirma que a cruz de
Cristo era formada por duas traves: "Aquele cordeiro que se comandou que
fosse inteiramente assado era um símbolo do sofrimento na cruz que Cristo iria
suportar. Para o cordeiro que é assado, é assado e recebe acompanhamentos na
forma da cruz. Pois uma vara é transfixada através das partes baixas até a
cabeça e outra pelas costas, no qual são presas as pernas do cordeiro".
Pregos
A assunção de que foi utilizada
uma cruz com duas traves para crucificar Jesus não determina o número de pregos
utilizado e algumas teorias sugerem três enquanto outras sugerem quatro. Porém,
por toda a história, um grande número de pregos foram propostos, números tão altos
quanto 14 já foram propostos. Estas variações também aparecem nas
representações artísticas da crucificação. Na Igreja Ocidental, antes do Renascimento,
geralmente quatro pregos apareciam, com os pés colocados um ao lado do outro.
Após, a maior parte traz apenas três pregos, com um pé colocado sobre o outro.
Os pregos quase sempre são representados na arte, embora os romanos por vezes
apenas amarrassem as vítimas nas cruz. A tradição também influenciou emblemas
cristãos, como no caso dos jesuítas, em cujo monograma estão três pregos e a
cruz.
O local onde os pregos foram
batidos, se nas mãos ou nos pulsos, também é incerto. Algumas teorias sugerem
que a palavra grega cheir para mão
inclui o pulso e que os romanos geralmente eram treinados para passar os pregos
pelo espaço de Destot (entre os ossos
capitato e semilunar) sem fraturar nenhum osso. Outra teoria sugere que a
palavra grega para mão também incluía o braço e que os pregos foram batidos
perto do rádio e da ulna no braço. Cordas podem ter sido utilizadas para
amarrar as mãos além do uso dos pregos.
Plataforma de apoio
Outro assunto discutido tem
sido o uso de um hypopodium como uma plataforma de apoio para os pés, dado que
as mãos podem não ter sido capazes de suportar o peso. No século XVII, Rasmus
Bartholin considerou diversos cenários analíticos sobre o tema. No século XX, o
patologista forense Frederick Zugibe realizou diversos experimentos de
crucificação se valendo de cordas para pendurar pessoas em vários ângulos e
posições de mãos. Seus experimentos apoiam uma suspensão em ângulo, uma cruz de
duas traves e, talvez, uma forma de apoio para os pés, dado que uma suspensão
na forma Aufbinden a partir de uma estaca única (como utilizada pelos nazistas
no campo de concentração de Dachau durante a Segunda Guerra), a morte ocorre
rapidamente.
As últimas palavras de Jesus
Os evangelistas registraram
sete frases ditas por Jesus enquanto estava na cruz:
“Pai, perdoa-lhes; pois não
sabem o que fazem.” (Lucas 23:34) - imediatamente ao ser crucificado.
“Em verdade te digo que hoje,
estarás comigo no Paraíso.” (Lucas 23:43) - respondendo ao "bom
ladrão".
“Eis aí tua mãe!” (João
19:24-27) - ao entregar Maria, sua mãe, aos cuidados de João.
“Eli, Eli, lamá sabactâni? que
quer dizer, Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mateus 27:46);
também em “Eloí, Eloí, lamá sabactâni? que quer dizer, Deus meu, Deus meu, por
que me desamparaste?” (Marcos 15:34) - imediatamente antes de morrer.
“Tenho sede.” (João 19:28) - para
se cumprir a Escritura.
“Está consumado.” (João 19:30)
- após beber o vinagre e imediatamente antes de morrer.
“Pai, nas tuas mãos entrego o
meu espírito.” (Lucas 23:46) - imediatamente antes de morrer.
Todas as frases são exclamações
curtas. Veja abaixo sobre como, em face à asfixia por exaustão, obter ar
suficiente para falar numa cruz pode ser uma tarefa muito dolorosa e cansativa
para a vítima.
As últimas palavras de Jesus
tem sido o tema de uma diversidade de ensinamentos e sermões cristãos e
diversos autores escreveram obras especificamente dedicadas a elas. Porém, como
as últimas palavras diferem entre os quatro evangelhos, James Dunn demonstrou
dúvidas em relação à sua historicidade.
Fenômenos durante a crucificação
Marcos menciona uma escuridão
durante o dia quando Jesus foi crucificado e o véu do Templo se rasgou em dois
quando Jesus morreu. Mateus segue Marcos, adicionando um terremoto e a
ressurreição dos santos. Lucas também segue Marcos. Em João, não há referência
a estes sinais milagrosos, com exceção da própria ressurreição.
Escuridão e eclipse
Na narrativa dos evangelhos
sinóticos, enquanto Jesus estava preso na cruz, o céu se "escureceu"
por três horas, da hora sexta até a nona (do meio-dia às três da tarde). Tanto
o orador romano Júlio Africano e o teólogo cristão Orígenes se referem ao
historiador grego Flégon como tendo escrito "a respeito do eclipse durante
o tempo de Tibério, em cujo reinado Jesus parece ter sido crucificado, e aos
grandes terremotos que ocorreram".
Júlio Africano se refere ainda
às obras do historiador Thallus ao negar a possibilidade de um eclipse solar:
"Esta escuridão que Thallus, no terceiro livro de sua
"História", chama, para mim sem razão, de um eclipse solar. Pois os
hebreus celebram a Páscoa no décimo-quarto dia de acordo com a lua e a Paixão
de nosso Salvador cai no dia anterior à Páscoa; mas um eclipse do sol ocorre
apenas quando a lua entra na frente do sol". Uma eclipse solar ocorrendo
juntamente com uma lua cheia é uma impossibilidade científica. O apologista
cristão Tertuliano escreveu "Na mesma hora, também, a luz do dia foi
retirada, quando o sol, na mesma hora, estava no seu fulgor meridiano. Os que
não sabem que isto foi previsto sobre Cristo, sem dúvida acreditam que se
tratou de um eclipse. Vocês próprios tem um relato do augúrio mundial em vossos
arquivos". A escuridão foi reportada em lugares tão distantes quanto
Heliópolis e, aparentemente, a ocorrência sobrenatural também foi citada por
São Paulo ao converter Dionísio ao cristianismo.
Humphreys e Waddington, da
Universidade de Oxford, reconstruíram os cenários para um eclipse lunar naquele
dia. Eles concluíram que:
“Este eclipse foi visível a
partir de Jerusalém a partir da aparição da Lua... visível primeiro em
Jerusalém por volta de 6:20 da tarde (o início do sabbath judaico e também o
início da Páscoa judaica em 33 d.C.) com aproximadamente 20% do seu disco na
umbra da sombra da terra... O eclipse terminou trinta minutos depois, por volta
de 6:50.”
Estes autores notaram que a
referência do apóstolo Pedro a uma "lua de sangue" em Atos 2:20 (um
termo comumente utilizado para um eclipse lunar por causa da cor avermelhada da
luz refratada na Lua através da atmosfera terrestre) pode ser uma referência a
este eclipse. Deve-se ter em mente, porém, que, no versículo anterior da mesma
passagem, São Pedro explicitamente menciona que "O Sol se converterá em
trevas", o que sugeriria um eclipse solar em conjunção com um outro lunar.
O véu do Templo, terremoto e a ressurreição dos santos
Os evangelhos sinóticos afirmam
que o véu do templo se rasgou de cima a baixo. De acordo com Josefo, a cortina
do templo de Herodes teria quase sessenta metros de comprimento, com quatro
milímetros de espessura. De acordo com Hebreus 9:1-10, esta cortina
representava a separação entre os homens e Deus, além da qual somente o
sumo-sacerdote poderia passar e, mesmo assim, somente uma vez por ano para
adentrar-se na presença de Deus e se redimir dos pecados de Israel (capítulo 16
do Levítico).
O Evangelho de Mateus afirma
que houve também terremotos, partindo rochas e abrindo os túmulos dos santos
(que posteriormente ressuscitaram após a ressurreição de Jesus). Estes santos
ressuscitados foram para a cidade sagrada e apareceram para diversas pessoas,
mas o seu destino jamais foi elaborado.
Significados teológicos
Os relatos sobre a crucificação
e a subsequente ressurreição de Jesus fornecem um rico contexto para a análise
cristológica, dos evangelhos canônicos até as epístolas paulinas.
Na cristologia agente joanina,
a submissão de Jesus à crucificação é um sacrifício feito como um "agente
de Deus" ou "servo de Deus", em prol de uma eventual vitória.
Este argumento elabora sobre o tema salvífico do evangelho de João, que começa
em João 1:29 com a proclamação de João Batista: "Eis o Cordeiro de Deus,
que tira o pecado do mundo!".
Um elemento central na
cristologia apresentada nos Atos dos Apóstolos é a afirmação na crença de que a
morte de Jesus na cruz aconteceu "com Deus sabendo com antecedência e de
acordo com um plano definido". Neste ponto de vista, como em Atos 2:23, a
cruz não é vista como um escândalo, pois a crucificação de Jesus "pelas
mãos dos sem lei" é vista como sendo o cumprimento do plano de Deus.
A cristologia de Paulo tem um
foco específico na morte e ressurreição de Jesus. Para ele, a crucificação está
diretamente relacionada à sua ressurreição e o termo "a cruz de
Cristo" utilizado em Gálatas 6:12 pode ser visto como uma abreviação da
mensagem dos evangelhos. Para Paulo, a crucificação de Jesus não foi um evento
isolado na história, mas um evento cósmico com importantes consequências
escatológicas, como em I Coríntios 2:8. Sob o ponto de vista paulino, Jesus,
obediente até a morte (Filipenses 2:8) morreu "na hora certa"
(Romanos 4:25) cumprindo plano de Deus. Para Paulo, o "poder da cruz"
não se separa da ressurreição de Jesus.
Porém, a crença na natureza
redentora da morte de Jesus é anterior às epístolas paulinas e remonta aos
primeiros dias do cristianismo e à igreja de Jerusalém. A afirmação do credo de
Niceia de que "ele foi crucificado pelo nosso bem" é um reflexo da
formalização desta crença fundamental no século IV.
Expiação
A morte e a ressurreição de
Jesus suportam uma variedade de interpretações teológicas sobre como a salvação
é concedida à humanidade. Estas interpretações variam muito principalmente em
quanta ênfase elas dão à morte de Jesus em comparação com suas palavras. De
acordo com visão da expiação substitucionária, a morte de Jesus é de
importância central e Jesus conscientemente se sacrificou como um ato de
perfeita obediência como um sacrifício de amor que agradou a Deus. Em
contraste, a teoria da expiação por influência moral foca muito mais no
conteúdo moral dos ensinamentos de Jesus e vê a sua morte como um martírio.
Desde a Idade Média há um conflito entre estes dois pontos de vista na Igreja
Ocidental. Os protestantes evangélicos tipicamente defendem uma visão
substitucionária e, em particular, defendem a teoria da substituição penal. Os
protestantes históricos (não evangélicos, reformados ou pentecostais)
tipicamente rejeitam a expiação substitucionária e defendem a teoria da
influência moral. Ambas as visões são populares na Igreja Católica, com a
doutrina da satisfação incorporada na ideia de penitência.
Na tradição católica, esta
visão da expiação é balanceada pela obrigação dos católicos romanos de
realizarem os atos de reparação a Jesus Cristo, que, na encíclica
Miserentissimus Redemptor do papa Pio XI, foram definidos como "alguma
forma de compensação a ser prestada pelo prejuízo", referindo-se aos
sofrimentos de Jesus. O papa João Paulo II se referiu a estes atos de reparação
como os "incessantes esforços para permanecer junto às infinitas cruzes
nas quais o Filho de Deus continua a ser crucificado".
Entre os cristãos ortodoxos,
outro ponto de vista comum é o do Christus Victor, que defende que Jesus foi
enviado por Deus para derrotar a morte e Satã. Por conta de sua perfeição,
Jesus derrotou ambos e emergiu vitorioso. Portanto, a humanidade não está mais
presa ao pecado e está agora livre para se reunir com Deus na fé em Jesus.
Aspectos médicos da crucificação
Diversas teorias já tentaram
explicar as circunstâncias da morte de Jesus na cruz através do conhecimento
médico dos séculos XIX e XX, propostas por todo tipo de profissionais: médicos,
historiadores e até mesmo místicos.
A maior parte das teorias
propostas por médicos formados (com especialidades variando da medicina forense
até a oftalmologia) concluíram que Jesus suportou um sofrimento enorme e muita
dor na cruz antes de sua morte. Em 2006, o clínico geral John Scotson revisou
quarenta publicações sobre a causa da morte de Jesus e as teorias variavam de
ruptura cardíaca a embolismo pulmonar.
Já em 1847, baseando-se em João
19:34, o médico William Stroud propôs a "teoria da ruptura cardíaca"
como causa mortis de Jesus e ela influenciou diversas pessoas depois. A
"teoria da asfixia" tem sido objeto de diversos experimentos que
simulam a crucificação em voluntários saudáveis e muitos médicos concordam que
ela causa uma profunda disrupção na capacidade respiratória da vítima. Um
efeito colateral da asfixia por exaustão é que a vítima da crucificação sente
gradualmente mais e mais dificuldade para conseguir fôlego suficiente para
falar, o que foi apresentado como uma possível explicação para os relatos de
que as últimas palavras de Jesus seriam nada mais do que curtas exclamações.
A "teoria do colapso
cardiovascular" é a explicação moderna prevalente e sugere que Jesus
morreu por causa de um choque profundo. De acordo com esta teoria, a
flagelação, as surras e finalmente sua fixação na cruz com pregos deixaram
Jesus desidratado, fraco e criticamente enfermo, um cenário ideal para a
instalação de um conjunto complexo e inter-relacionado de outros efeitos
funestos: além da desidratação, intenso trauma físico e dano aos tecidos
(especialmente por causa da flagelação), respiração inadequada e um esforço
físico extenuante. Estes efeitos levaram finalmente ao colapso cardiovascular.
Escrevendo no Journal of the
American Medical Association ("Jornal da Associação Médica
Americana"), o médico William Edwards e seus colegas defenderam uma
combinação das teorias do colapso cardiovascular (via choque hipovolêmico) e da
asfixia por exaustão, assumindo que o fluxo de "água" que verteu do
ferimento no flanco de Jesus descrito em João 19:34 seria o fluido pericárdio.
Alguns apologistas cristãos parecem favorecer esta teoria e defendem que esta
anomalia médica seria um fato que o evangelista seria tentado a deixar de fora
em seu relato caso seu interesse não fosse um registro fidedigno.
Em seu livro "A
Crucificação de Jesus", o médico e patologista Frederick Zugibe apresenta
um conjunto de teorias que tentam explicar a colocação dos pregos, as dores e a
morte de Jesus em grande nível de detalhe. Zugibe realizou diversos
experimentos ao longo de vários anos para testar suas teorias quando ele era
médico. Entre eles, experimentos nos quais os voluntários com pesos específicos
eram pendurados em ângulos determinados e o peso suportado em cada mão era
medido, variando-se a existência de um suporte para os pés. A conclusão foi de
que tanto o peso quanto a dor correspondente seria significativa.
O oftalmologista e pastor C.
Truman Davis também publicou um visão médica da crucificação, concordando com
Barbet, mas sua análise é bem menos detalhada que a de Zugibe.
O cirurgião ortopédico Keith
Maxwell não apenas analisou os aspectos médicos da crucificação como também
analisou a forma como Jesus carregou a cruz por toda a Via Dolorosa.
Arte, simbolismo e devoções
Desde a crucificação de Jesus,
a cruz se tornou um elemento chave no simbolismo cristão assim como cena da
crucificação, na arte cristã, dando origem a diversos temas artísticos
específicos como o Ecce Homo, o Erguimento da Cruz, a Deposição da Cruz e o
Sepultamento de Jesus.
A obra "Crucificação vista
a partir da cruz", de James Tissot, apresentou uma nova abordagem no final
do século XIX, na qual a cena da crucificação foi retratada a partir da
perspectiva de Jesus.
O simbolismo da cruz, que hoje
é um dos símbolos cristãos mais reconhecidos, foi utilizado desde o
cristianismo primitivo. Justino Mártir, que viveu em 165, a descreve de uma
forma que deixa implícito o uso já naquela época como símbolo, embora o
crucifixo só tenha aparecido mais tarde. Mestres como Caravaggio, Rubens e
Ticiano pintaram a cena da crucificação em suas obras.
Devoções baseadas no processo
da crucificação e nos sofrimentos de Jesus são observadas por diversos
cristãos. As "Estações da Cruz" seguem um número de estágios baseados
nos passos seguidos por Jesus até a sua crucificação, enquanto que o Rosário
das Santas Chagas é utilizado para meditar sobre as chagas de Jesus como parte
da crucificação.
Origem: Wikipédia, a
enciclopédia livre.
Acesso: 31/07/2017
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