A Pneumatografia é a escrita
produzida diretamente pelo Espírito, sem qualquer intermediário. Difere da
Psicografia, pois esta é a transmissão do pensamento do Espírito por meio da
escrita manual do médium. Inserimos esses dois vocábulos no Vocabulário
Espírita, no início da nossa Instrução Prática, com a indicação da sua diferença
etimológica. Psicografia, do grego, psykhê
= borboleta, alma, e graphô = eu
escrevo; Pneumatografia, de pneuma =
ar, sopro, vento, Espírito.
Num médium escrevente a mão é um instrumento, mas a sua alma, o Espírito nele encarnado, é o intermediário, o agente ou intérprete do Espírito estranho que se comunica. Na Pneumatografia é o próprio Espírito estranho que escreve diretamente, sem intermediário.
O fenômeno da escrita direta é inegavelmente um dos mais extraordinários do Espiritismo. Por anormal que pareça à primeira vista, é hoje um fato verificado e incontestável. Se dele ainda não falamos, é que esperávamos poder explicá-lo depois de fazer pessoalmente todas as observações necessárias para tratar do assunto com conhecimento de causa. Se a teoria é necessária para entendermos a possibilidade dos fenômenos espíritas em geral, é talvez ainda mais necessária neste caso, sem dúvida um dos mais estranhos que já se apresentaram, mas que deixa de parecer sobrenatural quando lhe compreendemos o princípio.
A primeira revelação deste
fenômeno provocou o sentimento de dúvida, seguido pela ideia de embuste. Com
efeito, todos conhecem a ação das tintas chamadas simpáticas, cujos traços, a
princípio completamente invisíveis, aparecem depois de algum tempo. Poderia
então parecer que se tivesse abusado da credulidade, e não garantimos que isto
nunca tenha sido feito. Estamos mesmo convencidos de que certas pessoas, sem
propósito mercenário, mas unicamente por amor próprio e para fazer com que
acreditassem em seu poder, houvessem empregado tais subterfúgios.
J. J. Rousseau relata o
seguinte fato na terceira das cartas escritas de Montagne:
“Em 1743 vi em Veneza uma
nova maneira de ver a sorte, mais estranha que as de Préneste. Quem quisesse
consultar entrava numa câmara e, se quisesse, poderia ficar só. Ali, de um
livro cheio de folhas brancas, tirava uma, de sua escolha; depois, segurando
essa folha, pedia mentalmente, e não em voz alta, a resposta a algo que queria
saber. Em seguida dobrava a folha branca, colocava num envelope, lacrava-o e o
colocava, assim lacrado, dentro de um livro. Enfim, depois de ter recitado
certas fórmulas muito bizarras, sem perder o livro de vista, ia tirar o papel.
Examinava o lacre, abria o envelope e encontrava escrita a resposta.
“O mágico que fazia esses
sortilégios era o primeiro secretário da Embaixada da França e se chamava J. J.
Rousseau”. Duvidamos que Rousseau tivesse conhecido a escrita direta, pois do
contrário teria sabido outras coisas relativas às manifestações espíritas, e não
teria tratado do assunto assim levianamente. É possível, como ele mesmo
reconheceu, quando o interrogamos sobre este fato, que empregasse um processo
que aprendera de um charlatão italiano.
Mas pelo fato de podermos
imitar uma coisa, seria absurdo concluir que tal coisa não exista. Nestes
últimos tempos não se tem encontrado meios de imitar a lucidez sonambúlica a
ponto de termos a ilusão da realidade? E porque este processo de saltimbanco
percorreu todas as feiras, devemos concluir que não haja verdadeiros
sonâmbulos? Pelo fato de certos negociantes venderem vinho falsificado, há
razão para não se encontrar vinho puro? Dá-se o mesmo com a escrita direta. As
precauções para assegurar a realidade do fato eram, aliás, muito simples e
muito fáceis e, graças a elas, já hoje não pode haver qualquer dúvida.
Desde que a possibilidade de
escrever sem intermediário é um dos atributos do Espírito e que os Espíritos
existiram em todos os tempos, e também em todos os tempos produziram os
diversos fenômenos que conhecemos, igualmente produziram a escrita direta na
Antiguidade, do mesmo modo que nos nossos dias. É assim que podemos explicar o
aparecimento das três palavras na sala do festim de Baltazar. A Idade Média,
tão fecunda em prodígios ocultos, mas que foram abafados nas fogueiras, também
deve ter conhecido a escrita direta e provavelmente a encontraríamos na teoria
das modificações que os Espíritos podem operar na matéria, e que relatamos em
nosso artigo precedente, ─ o princípio da transmutação dos metais. É um ponto
que abordaremos qualquer dia.
Dizia-nos ultimamente um dos
nossos assinantes que um dos seus tios, cônego, que durante muitos anos tinha
sido missionário no Paraguai, obtinha, por volta de 1800, a escrita direta,
juntamente com seu amigo, o célebre Abade Faria. Seu método, que o assinante
não chegou a conhecer bem, tendo-o apenas observado superficialmente, consistia
numa série de anéis pendurados, aos quais eram adaptados verticalmente alguns
lápis, cujas pontas pousavam sobre folhas de papel.
Esse sistema representa a
infância da arte. Daí para cá fizemos progresso. Sejam quais forem os
resultados obtidos em diversas épocas, não foi senão depois da vulgarização das
manifestações espíritas que a escrita direta foi levada a sério. Parece que
quem primeiro a deu a conhecer em Paris, nestes últimos tempos, foi o Barão de
Guldenstubbe, que sobre o assunto publicou uma obra muito interessante,
contendo grande número de fac-símile das escritas por ele obtidas. O fenômeno
era há algum tempo conhecido na América. A posição social do Barão de
Guldenstubbe; sua independência; a consideração que gozava na alta sociedade,
incontestavelmente afastam toda suspeita de fraude voluntária, pois que não
podia ser movido por motivos interesseiros. Quando muito poderia admitir-se que
fosse vítima de uma ilusão, mas a isto responde peremptoriamente um fato: o de
serem os fenômenos obtidos por outras pessoas que tomaram todas as precauções
para evitar qualquer possibilidade de fraude ou de erro.
Obtém-se a escrita direta,
como em geral a maior parte das manifestações espíritas não espontâneas, pelo
recolhimento, pela prece e pela evocação.
Muitas vezes foram obtidas
nas igrejas, junto aos túmulos, ao pé de estátuas ou das imagens de pessoas que
eram chamadas. É, porém, evidente que o lugar não tem outra influência senão a
de provocar melhor recolhimento e melhor concentração do pensamento, pois está
provado que elas são também obtidas sem esses acessórios e nos lugares mais
comuns, como sobre um simples móvel doméstico, desde que nos encontremos nas
condições morais requeridas e que gozemos da faculdade mediúnica necessária.
No princípio supunha-se que
era preciso colocar um lápis com um papel. Até certo ponto o fato podia ser
então explicado. Sabe-se que os Espíritos movem e deslocam os objetos, que os
apanham e por vezes os atiram no espaço. Assim também poderiam eles tomar o
lápis, servindo-se dele para traçar os caracteres; e porque lhes dão o impulso
por meio da mão do médium, de uma prancheta, etc., também poderiam fazê-lo de
maneira direta. Mas não tardou a reconhecer-se que a presença do lápis não era
necessária e que bastava um simples pedaço de papel, dobrado ou não, sobre o
qual, depois de alguns minutos, encontravam-se traçados os caracteres. Aqui o
fenômeno muda completamente de aspecto e nos lança numa ordem de coisas
inteiramente nova. Os caracteres são traçados com uma substância qualquer.
Desde que esta não foi fornecida ao Espírito, então ele a fez, criou-a ele
mesmo. De onde a tirou? Eis o problema.
O general russo Conde de
B... mostrou-nos uma estrofe de dez versos alemães obtida dessa maneira por
intermédio da irmã do Barão de Guldenstubbe, pondo apenas uma folha de papel,
arrancada de sua própria caderneta, debaixo do pedestal do relógio da chaminé.
Tendo-a retirado ao cabo de alguns minutos, nela encontrou esses versos em
caracteres tipográficos alemães muito finos e de uma pureza absoluta. Por meio
de um médium escrevente o Espírito lhe disse que queimasse aquele papel; como,
porém, hesitasse, lamentando sacrificar um espécime tão precioso, o Espírito
acrescentou: “Não receies. Eu te darei um outro”. Com essa certeza, lançou o
papel ao fogo, depois colocou uma segunda folha, também tirada de sua carteira,
sobre a qual os versos foram reproduzidos, exatamente da mesma maneira. Foi
essa segunda edição que vimos e examinamos com o maior cuidado, e ─ coisa
estranha ─ os caracteres apresentavam sinais de pressão como se tivessem
acabado de sair prelo.
Portanto, não é mais apenas
com lápis que os Espíritos podem operar, mas também com tinta e caracteres de
imprensa.
Um dos nossos honrados
colegas da Sociedade, o senhor Didier, obteve há poucos dias os resultados
seguintes, que tivemos oportunidade de constatar, e cuja perfeita autenticidade
podemos garantir. Tendo ido à igreja de Nossa Senhora das Vitórias, com a
Senhora Huet, que há pouco conseguiu resultados desse gênero, tomou uma folha
de papel de carta com o timbre da sua casa comercial, dobrou-a em quatro e a
pôs sobre os degraus de um altar, pedindo em nome de Deus que um bom Espírito
viesse escrever alguma coisa. Ao cabo de dez minutos de recolhimento,
encontrou, na parte interior da folha, numa das dobras a palavra Fé e noutra
dobra a palavra Deus. A seguir, tendo pedido ao Espírito o obséquio de dizer
quem havia escrito aquilo, colocou novamente o papel e depois de dez minutos
encontrou estas palavras: Por Fénelon.
Oito dias mais tarde, a 12
de julho, quis repetir a experiência, para o que foi ao Louvre, à sala
Coyzevox, situada sob o pavilhão do relógio. Colocou uma folha de papel de
carta, dobrada como a primeira, sobre a base do busto de Bossuet, mas nada
obteve. Um menino de cinco anos o acompanhava e ele havia posto o boné do
garoto no pedestal da estátua de Luiz XIV, que se encontra a poucos passos da
primeira. Julgando falha a experiência, ia se retirar quando, ao pegar o boné,
verificou em baixo dele, escritas aparentemente a lápis sobre o mármore, as
palavras Amai a Deus, seguidas da letra B. O primeiro pensamento dos
assistentes foi de que tais palavras poderiam ter sido escritas anteriormente
por mãos estranhas, passando despercebidas. Não obstante, quiseram tentar nova
prova e puseram a folha dobrada em cima dessas palavras, cobrindo-as com o
boné. Ao cabo de alguns minutos verificaram que a folha continha três letras.
Repuseram o papel, pedindo que a frase fosse completada e obtiveram: Amai a
Deus, isto é, aquilo que fora escrito no mármore, menos o B. Era assim evidente
que as primeiras palavras tinham sido feitas pela escrita direta. Ressaltava,
ainda, o fato curioso de terem as letras sido traçadas sucessivamente e não de
uma vez, visto que por ocasião da primeira inspeção não houvera tempo de
concluir a frase. Saindo do Louvre, o senhor D... foi a Saint-Germain
l’Auxerrois onde, pelo mesmo processo, obteve as palavras Sede humildes.
Fénelon, escritas de maneira muito clara e muito legível. Essas palavras ainda
podem ser vistas no mármore da estátua a que nos referimos.
A substância de que são
feitos os caracteres tem toda a aparência do grafite do lápis e é facilmente
apagada com a borracha. Examinamo-la ao microscópio, verificando que não é
incorporada ao papel, mas simplesmente deposta em sua superfície, de maneira
irregular sobre as asperezas, formando arborescências muito semelhantes às de
certas cristalizações. A parte apagada pela borracha deixa ver camadas de
matéria escura introduzida nas pequenas cavidades da rugosidade do papel.
Destacadas e retiradas com cuidado, essas camadas são a própria matéria que se
produz durante a operação. Lamentamos que a pequena quantidade de material
recolhido não nos tivesse permitido fazer sua análise química. Não perdemos a
esperança, entretanto, de consegui-lo um dia.
Se o leitor se reportar ao
nosso artigo precedente, encontrará a explicação completa do fenômeno.
Nessa escrita, o Espírito
não se serve nem das nossas substâncias, nem dos nossos instrumentos. Ele mesmo
cria as substâncias e os instrumentos necessários, tirando seus materiais do
elemento primitivo universal que, por ação de sua vontade, sofre as modificações
necessárias ao efeito que quer produzir. Ele pode portanto produzir tanto a
tinta de impressão e a tinta comum como o grafite do lápis, e mesmo caracteres
tipográficos bastante resistentes para dar relevo à impressão.
É esse o resultado a que nos
conduziu o fenômeno da tabaqueira relatado em nosso artigo anterior, e sobre o
qual nos estendemos bastante porque nele vimos uma oportunidade para sondar uma
das mais sérias leis do Espiritismo, cujo conhecimento pode esclarecer diversos
enigmas até mesmo do mundo visível. É assim que de um fato aparentemente vulgar
pode brotar a luz. De tudo, o mais importante é observar com cuidado, o que
todos podem fazer, tanto como nós, que não nos limitamos a ver os efeitos sem
procurar as causas. Se nossa fé se firmou de dia para dia, foi porque
compreendemos. Fazei então compreender, se quiserdes fazer prosélitos sérios. O
conhecimento das causas tem outro resultado: traçar uma linha de demarcação
entre a verdade e a superstição.
Se encarássemos a escrita
quanto às vantagens que ela pode oferecer, diríamos que até o momento sua
principal utilidade foi levar-nos à constatação material de um fato importante:
a intervenção de um poder oculto, que nela encontra um novo meio de se
manifestar. Mas as comunicações obtidas por esse processo raramente são
extensas. Em geral são espontâneas, limitadas a algumas palavras, a sentenças,
às vezes a sinais ininteligíveis. Têm sido obtidas em várias línguas, como
grego, latim, siríaco, etc., ou em caracteres hieroglíficos, mas ainda não se
prestaram a conversações contínuas e rápidas, como permite a psicografia ou
escrita manual dos médiuns.
Revista espírita — Jornal de
estudos psicológicos, agosto 1859.
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