1) Quando me deito e começo
a sonhar eu sei que estou dormindo e sonhando. As vezes consigo manipular meus
sonhos, pois posso fazer o que quiser. Algumas vezes faço algo que tenho a
sensação de já ter feito, ou acontecem coisas que tenho a impressão de já ter
acontecido antes e quando dou por mim, me lembro que já tinha sonhado com
aquilo. Porque isto acontece? O que significa?
- O sono e os sonhos são
estudados com profundidade pelo Espiritismo. O Livro dos Espíritos - Allan Kardec -, 2ª. parte, Capítulo VIII é
a melhor discussão a respeito do significado dos sonhos. Há também o livro A Gênese - Allan Kardec - capítulo XIV,
que aborda muito bem o assunto.
Primeiramente, devemos saber
que o Espiritismo considera o ser humano como constituído de três partes: o corpo, revestimento material
temporário e perecível que possui automatismos biológicos comandáveis pela
mente; o Espírito, o foco de
inteligência, indestrutível, indivisível, incorpóreo, que sobrevive à morte do
corpo libertando-se e retornando à vida espiritual, para voltar à vida material
numa nova reencarnação; e, finalmente, o
perispírito, laço de união entre o Espírito e a matéria, corpo fluídico semimaterial
(energético) que “reveste” o Espírito e permite a ligação deste com o corpo.
Estudando as propriedades do
perispírito, notaremos que ele está em íntimo contato com o corpo físico,
molécula-a-molécula, de tal forma que o Espírito terá liberdade completa apenas
após a morte do envoltório material. Porém, quando o corpo entra num estado
neurofisiológico alterado (“estados alterados de consciência”), como o sono
físico, o sonambulismo, o êxtase, o coma, etc., o perispírito tem possibilidade
de expandir-se, e o Espírito liberta-se parcialmente do corpo em repouso, mas
ainda ligado a este por um “laço” fluídico. Isso acontece todas noites (ou
manhãs), quando dormimos. Nesse momento, o Espírito procura aquilo que é de seu
real interesse, com aquilo que mantém maior afinidade (mesmo não expressando
esses desejos na vigília), frequentando ambientes materiais ou espirituais
correspondentes. Esse fenômeno chama-se emancipação da alma.
Em algumas vezes, variando para cada pessoa, nós conseguimos lembrar tudo o que aconteceu com maior ou menor nitidez, dependendo da nossa necessidade. Outros até conseguem determinar o que fazer quando sair do corpo, mantendo uma relativa consciência. De qualquer forma, guardaremos sempre a lembrança subconsciente dos lugares onde frequentamos e das pessoas com quem conversamos, o que explica porque às vezes certas cenas na vigília nos são familiares, como se já as tivéssemos vivenciado. Este fenômeno é conhecido como déjàvu.
Todos esses fenômenos
psicológicos e espirituais, devem ser observados e analisados para servir como
instrumento de auto avaliação da nossa própria personalidade e identidade e
ajustar tendências atávicas de outras reencarnações e mesmo, quando essas
faculdades forem bem controladas, servir de instrumento até da caridade.
2) Já consegui me desdobrar
algumas vezes, durante o sonho. Que orientação vocês poderiam me dar em relação
a isto?
- O fenômeno de emancipação
da alma é explicado pela tríade que compõe o ser humano encarnado: corpo,
perispírito e Espírito. Pela quiescência cerebral (durante o sono, por
exemplo), as partículas do perispírito podem desprender-se parcialmente e este
se expande. O Espírito, agora parcialmente liberto (emancipado), mesmo ligado
por um “cordão” fluídico ao seu corpo, pode ir para onde quiser, visitar
lugares no mundo material e/ou no plano espiritual, dependendo de suas
(verdadeiras) inclinações. Quando o corpo sai de estado quiescente (regulado
pelo sistema nervoso e endócrino), o perispírito é “arrastado” de volta para o corpo,
e a pessoa acorda. Essa possibilidade é um benção que Deus nos oferece como
meio de mantermos o contato com a nossa verdadeira vida, nossa verdadeira
pátria.
Acontece que, durante o
período de quiescência, o cérebro continua tendo atividade irregular em
diversas áreas, formando imagens e sensações associadas que podem ou não ser
lembradas, segundo mecanismos também regulados pelo cérebro. A lembrança mais
ou menos nítida dessas imagens são os sonhos. Estes podem ser completamente sem
significado, mas quase sempre relacionados às preocupações íntimas o indivíduo
na vigília.
Em especial, pode ocorrer
que o Espírito emancipado também registre as imagens que realmente presencia e
isso pode ser até lembrado, segundo a necessidade do encarnado. Mas, nesse caso,
é necessário que o indivíduo tenha uma predisposição orgânica para que sua
memória seja influenciada por essas imagens. Em geral, outros Espíritos
desencarnados, superiores, ajudam nesse processo, para que as cenas
presenciadas pelo encarnado emancipado repercutam na sua vida de vigília.
Quando isso é muito frequente, e o encarnado guarda uma lembrança nítida desses
fatos, diz-se que ele é um “médium de desdobramento” ou, segundo A. Kardec,
“médium sonâmbulo”, por que percebe a presença dos Espíritos, que induzem seu
desprendimento e controlam a lembrança.
Assim, aquilo que lembramos
como sonho, é, para a maioria das pessoas, e na maioria das vezes, fruto de uma
atividade cerebral espontânea. Isso não significa que a pessoa não se
desdobrou, apenas não se lembra. Aliás, sempre haverá uma impressão, uma
sensação agradável ou penosa daquilo com o que o emancipado relacionou-se
durante o sono. Entretanto, se há uma impressão nítida das cenas em
desdobramento, é recomendável que a pessoa procure um Centro Espírita de
confiança, e que possua recursos para trabalhar educando essa faculdade natural
do ser humano, canalizando esse potencial para a prática da caridade, para com
os desencarnados em sofrimento, por exemplo, ou com quem quer que seja.
3) Letargia e catalepsia?
- A letargia e a catalepsia
são fenômenos fisio/patológicos - que ocorrem com o corpo - mas que possibilita
o desprendimento parcial do Espírito através da expansão de seu perispírito. É,
pois, um dos vários mecanismos que culminam no fenômeno espírita chamado
“emancipação da alma”.
Devemos entender o contexto
histórico das Ciências, principalmente do magnetismo, na época de Kardec (ele
estudou o magnetismo durante 35 anos).
Jean Martin Charcot foi o
pai da Neurologia e da Neuropatologia moderna e professor de Charles Richet e
Sigmond Freud. Em sua clínica de Salpetrière, aplicava o magnetismo
(posteriormente chamado de Hipnotismo) para diagnosticar e tratar doenças
neuropsiquiátricas, como a epilepsia e a histeria. Ele mesmo desenvolveu novas
técnicas de hipnose (magnética), classificou e estagiou as fases do estado
hipnótico em que entravam seus paciente:
1. Num
primeiro momento, eles entravam num estado cataléptico, isto é, perdiam toda a
sensibilidade periférica (térmica, dolorosa, etc.) e adquiriam um estado de
paralisia plástica, ou seja, ficavam sem movimentos porém com rigidez que
poderia ser movimentada pelo hipnotizador; esse termo, “catalepsia”, foi atribuído,
por analogia, também ao estado quiescente em que alguns animais entram para
disfarçarem-se de mortos aos predadores;
2. Após
novas técnicas hipnóticas, o hipnotizador habilidoso conduzia o paciente para
um estado de letargia, isto é, a insensibilidade total se mantinha, porém,
agora a paralisia era flácida, ou seja, o paciente ficava completamente
atônico, sem força e deveria ser segurado para não cair;
3. Sob
novas induções, o paciente poderia entrar num estado sonambúlico, quando ele
poderia movimentar-se - mesmo dormindo - e falar o que estava vendo.
É claro que, em cada uma
dessas fases, o hipnotizador usava um recurso terapêutico adequado para a
doença do paciente. O importante, para o Espiritismo, é saber que no sono
natural, no sonambulismo natural ou provocado (magnética, descrito acima), na
catalepsia, na letargia, e em outros fenômenos fisiológicos ou não podem
favorecer a Emancipação da Alma.
Kardec, no mesmo item, está
particularmente interessado também nas mortes aparentes, estado semelhante ao
da letargia, em que o corpo pode não oferecer quase nenhum sinal vital, apesar
de as estruturas vitais (tronco encefálico) ainda não estarem corrompidas. Há
alguns relatos na literatura - como em O
Céu e o Inferno, 2ª parte, de Allan Kardec - sobre pessoas que foram
enterradas vivas por uma confusão desse estado com a morte verdadeira (hoje em
dia, em centros modernos, isso é mais raro). Nas mortes aparentes, como em
outros casos, ocorre o desprendimento parcial do Espírito, que, obviamente,
pode se tornar total, pela morte completa do corpo. Porém, quando o tronco
encefálico ainda está preservado, e as condições orgânicas possibilitarem, um
magnetizador, semelhante ao que é feito na indução de Charcot, pode retirar o
paciente desse estado letárgico e devolver-lhe a vida. Aparentemente, quando
não se conhecia muito bem esses detalhes, o público leigo atribuía ao
magnetizador poderes sobrenaturais de “ressurreição” de mortos, etc. Lázaro,
segundo o Evangelho, estaria nesse estado, quando Jesus lhe infundiu
adequadamente fluido vital magnético para reativar-lhe o corpo de trazê-lo de
volta à vida.
Há também um outro termo que
pode surgir em discussões sobre este interessante assunto e que se confunde com
catalepsia: é a cateplexia. Esse é
um estado patológico, reflexo de uma crise de um distúrbio do sono chamado de narcolepsia, caracterizado por perda
súbita e momentânea de todas as forças vitais. A pessoa pode estar andando na
rua e de repente sente um sono absolutamente irresistível e subitamente
adormece. Nos períodos entre as crises, continua sentindo um sono muito forte,
que não consegue controlar. Sente-se quase que permanentemente “expandido”,
como “um balão”, refletindo a expansão permanente do seu perispírito. Essa uma
doença que também induz a Emancipação da alma.
Podemos então concluir que a
letargia e a catalepsia são fenômenos fisiológicos que podem ser induzidos pelo
magnetizador e se assemelham ao das mortes aparentes. Todos eles levam à
emancipação da alma.
4) No sonambulismo, por que
algumas pessoas lembram de suas ações e outras não?
- O sonambulismo é um dos
fenômenos de “emancipação da alma” e seu mecanismo é análogo ao do sono, da
letargia, da catalepsia, das mortes aparentes, do êxtase e, até, da vista
dupla. Em todos eles, o Espírito desprende-se da matéria através da expansão de
seu perispírito, fenômeno também chamado de desdobramento. Neste estado, o
perispírito, apesar de ainda não totalmente desligado do corpo físico (o que
seria o desencarne completo), possui uma flexibilidade e uma liberdade
(emancipação) relativas.
Porém, esse estado acontece
por mecanismos fisiopatológicos que ocorrem com o corpo orgânico, em
particular, com o sistema nervoso central (SNC). Este, possui uma rede
neuronal, chamada Sistema Ascendente Reticular de Ativação (SARA) que se
localiza no tronco encefálico, mas que se comunica com várias estruturas importantes
no SNC, como o córtex cerebral, que é a estrutura através do qual o Espírito
pode se expressar e receber as sensações físicas no estado de vigília.
O SARA, dentre outras
funções, comanda o ciclo de sono-vigília do corpo. Segundo um biorritmo natural,
ou sob uma indução interna (espiritual) ou externa (fatores ambientais), o SARA
ativa-se inibindo os impulsos nervosos no córtex cerebral, fazendo com que o
indivíduo gradativamente perca a percepção e a força, possibilitando que o
perispírito se expanda. Contudo, sob a influência poderosa do SARA, outras
estruturas cerebrais, responsáveis pela memória (o hipocampo), também se
“desligam” e, normalmente, nenhum registro pode ser feito no cérebro material.
Quando o Espírito volta para a matéria (no despertar), seu cérebro não
registrou experiência alguma. Isso é o que acontece no sono natural, no
sonambulismo natural, magnético, etc. A pessoa só terá uma confusa e
inespecífica sensação agradável ou desagradável daquilo que ocorreu. Ou seja,
se não houver outra interferência, todos os estados de emancipação da alma
ficam sem nenhum registro no cérebro físico. Como ficou registrado no
perispírito, a pessoa poderá recuperar esses arquivos ao emancipar-se de novo
e/ou ao desencarnar.
Por outro lado, em duas situações,
pode ocorrer o registro mesmo no cérebro físico, de maneira que possamos
lembrar com maior ou menor nitidez daquilo que nós vivenciamos no
desdobramento. Primeiramente, se a pessoa tem uma predisposição física,
neuro-fisio-mediúnica, para que o SARA permita o registro das experiências na
emancipação através dos impulsos do perispírito, que continua ligado ao corpo.
Em segundo lugar, em casos especiais, todos nós poderemos lembrar essas
vivências quando um Espírito superior, que domine esses mecanismos
neurohipnológicos, atue no nosso cérebro “selecionando” aquilo que será de
alguma forma útil na vigília. É claro que essas lembranças raramente serão 100%
confiáveis. De um modo geral, elas se misturam às nossas fantasias,
preconceitos e interpretações pessoais, interfirindo na fidelidade da
recordação.
Há numerosos exemplos na
literatura espírita sobre recordações do desdobramento. Esse fenômeno é usado
terapeuticamente no tratamento de obsidiados encarnados, em que este,
desdobrado, perdoa e/ou é perdoado por seu obsessor, e, na terapia de
libertação, os Espíritos benevolentes, que intermediaram o caso, atuam no
cérebro do ex-obsidiado para ele se lembrar dos fatos mais importantes.
Exemplos típicos podem ser estudados nos livros de Manuel P. de Miranda (Loucura e Obsessão, Tormentos da Obsessão,
Sexo e Obsessão, etc.).
Existem também “médiuns de
desdobramento”, que Kardec denominava “médiuns sonâmbulos”, que podem usar essa
capacidade conscientemente para a caridade. Não podemos deixar de lembrar a famosa
médium Yvonne Pereira, que tinha essa capacidade neuromediúnica de emancipar-se
e lembrar boa parte dos acontecimentos. Além disso, ela era sempre assistida
por Espíritos amigos, que induziam sua emancipação e selecionavam o que deveria
ser lembrado. Esses casos podem ser lidos nos livros “Devassando o Invisível”,
“Recordações da Mediunidade” e “Um caso de reencarnação”.
5) No caso do hipnotismo, em
que o paciente responde uma série de perguntas, o mecanismo é o mesmo do
sonambulismo?
- O magnetismo e o
hipnotismo são variantes dos fenômenos de emancipação da alma, isto é, com
mecanismo muito semelhante ao sonambulismo natural. Na verdade, um dos
capítulos mais estudados pelo magnetismo do século XIX era o “sonambulismo
provocado ou magnético”, ou seja, um estado semelhante ao sonambulismo natural,
porém induzido por passes magnéticos do operador sobre seu paciente.
O “Sistema Ascendente
Reticular de Ativação” (SARA) é a estrutura neural que induz esse estado no
indivíduo. Muitos fatores podem regular a atividade do SARA, como estímulos
fisiológicos (uma refeição), drogas (psicoestimulantes e psicodepressoras),
etc. Uma preocupação excessiva do encarnado numa determinada atividade
(geralmente de vigília), pode fazer com que ele mesmo, inconscientemente, atue
no SARA, alterando-lhe a atividade para permitir que seu Espírito consiga,
mesmo com o corpo dormindo, movimentá-lo. O magnetizador nada mais faz do que
injetar fluidos vitais (magnéticos) sobre o perispírito e o sistema nervoso do
paciente, que, assim, será induzido a entrar num estado semelhante ao
sonambulismo.
O hipnotismo é uma variação
do magnetismo do séc. XIX, preocupando-se muito mais com essa indução do sono
para obter efeitos terapêuticos a partir do diálogo e sugestões com o Espírito
desprendido parcialmente. Possui também o mesmo mecanismo e produz os mesmo
efeitos.
Fonte: IRC – Espiritismo.
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