Todo espírita sabe que não é
perfeito e que o maior segredo para se manter fiel às leis divinas e atingir
mais rapidamente a felicidade é "orar e vigiar".
Na maioria das vezes, porém,
esta máxima ensinada por Jesus só é lembrada em momentos extremos – num grande
perigo, oramos; numa cruel perseguição, vigiamos. Ainda custamos compreender
que oração não quer dizer pedido e que vigília não significa olhar o outro.
Muito mais que isso, orar e vigiar significam estar em comunhão com o Criador e, com a aproximação do carnaval, ainda ficamos divididos com relação ao nosso posicionamento sobre essa tradicional festa popular. De um lado, ficamos temerosos com as obsessões; de outro, sentimo-nos não só curiosos, mas realmente atraídos e mergulhados no assunto, pelos noticiários, pelo colorido, pelas músicas, pelas imagens na TV, nos jornais ou revistas.
Diante de tantas mensagens
de permissividade e sensualidade, como se tudo parasse porque é carnaval,
acabamos nos sentindo inseguros em participar de alguma forma deste período de
folia, onde muitas vezes a libertinagem rompe regras, agredindo concepções
sociais estabelecidas, transformando-o em espetáculo bastante característico,
verdadeiro tesouro comercial para o mundo das comunicações.
As origens pagãs
Como festa popular e
expressão da nossa cultura, o carnaval é aceito pela Igreja, estando suas
origens nas mais antigas celebrações da humanidade, associadas a fenômenos
astronômicos e a ciclos naturais, caracterizando um período de festas e
manifestações folclóricas. Pesquisas mostram, por exemplo, que já bem antes da
era cristã, homens, mulheres e crianças se reuniam no verão com os rostos
mascarados e os corpos pintados para espantar os demônios da má colheita.
Inicialmente realizada pelos povos pagãos em homenagem a seus deuses e à
natureza, a festa acabou sendo adaptada aos hábitos cristãos. Antes de começar
o tempo da quaresma – período de 40 dias (fora os domingos) que tem início na quarta-feira
de cinzas e término na quinta-feira santa, na celebração da última ceia de
Jesus com os doze apóstolos – eles faziam festa e churrascos porque da
quarta-feira de cinzas até a Páscoa ficavam sem comer carne e celebravam a
penitência. Assim, o termo carnaval (expressão do latim carnem levare,
modificada depois para" carne, vale= é válida a carne")
estaria ligado à liturgia cristã da igreja católica, tendo sido mais tarde
instituído como feriado religioso.
A visão espírita
E, para nós, espíritas, o
que muda nesta época? Afinal, como devemos encarar o carnaval? A resposta é
simples: devemos encará-lo da mesma forma com que convivemos com tantos outros
acontecimentos terrenos. Somos espíritas do mundo e no mundo e, uma vez que
evoluímos em sociedade e estamos inseridos, portanto, na cultura e história da
nossa própria civilização, nosso dever sempre será buscar o progresso,
esforçando-nos para vencer obstáculos, vícios e imperfeições, seja lá qual for
o ambiente.
A resposta é única e deve
servir também para sanar qualquer outra dúvida que nos surja. A lei divina, na
qual está inserida a necessidade do progresso, será sempre a mesma em todas as
épocas e em todos os lugares, devendo os princípios cristãos ser vivenciados e
exemplificados na sua integridade. Para que possamos ser verdadeiros homens de
bem, a condição é que nos esforcemos para combater vícios de qualquer natureza,
que acabam por nos escravizar, impedindo-nos de exercer a alegria de sermos
livres. A doutrina espírita nada proíbe, mas mostra ao homem a importância da
sua responsabilidade, através da fé raciocinada. Somos livres, sim, para
realizar qualquer desejo, desde que assumamos as consequências de nossos atos.
Responsabilidade não sai de férias nos dias de folia. Colheremos sempre aquilo
que plantarmos.
A sintonia mental
Se para o espírito tudo é
uma questão de sintonia mental para a formação de seu ambiente fluídico,
importará sempre e muito mais a qualidade de seu pensamento para viver o
carnaval, pois a atração dos fluidos espirituais se dará pela Lei da Similitude
(semelhante atrai semelhante). E aqui, como simples exemplo, cabe uma reflexão
sem preconceitos. Quem estará fazendo uma melhor sintonia no carnaval: o mestre
da bateria de uma escola de samba, que com muito amor, disciplina e trabalho,
tem o coração grato a Deus por poder proporcionar momentos de alegria e emoção
num sambódromo; ou aquele que se entristece, isolando-se nos bares das esquinas
para ficar longe da folia e da multidão?
Por favorecer esse
entendimento da vida em sua dimensão maior, o espiritismo amplia as
possibilidades de felicidade. Sua missão consoladora acaba por proporcionar a
formação não de adeptos tristonhos e taciturnos, mas de pessoas alegres e
otimistas, esperançosas de um futuro melhor. A verdade é que essa mesma
compreensão doutrinária nos permite também a análise de nossos acertos e
desacertos, sobre o que entendemos por felicidade na Terra, uma morada ainda de
provas e expiações. Assim, é fácil perceber que trazemos represadas em nosso
íntimo ansiedades e fantasias, desejos incontidos, fáceis de serem
exteriorizados em momentos de maior permissividade. O carnaval acaba por se
prestar à exteriorização desses anseios mais íntimos. E aí todo cuidado é
pouco. É preciso, pois, estarmos muito atentos à vigília do nosso campo mental,
pois onde quer que coloquemos nossas aspirações, aí encontraremos intercâmbio.
O trabalho dos benfeitores
O uso e abuso de bebidas
alcoólicas, como agentes encorajadores da folia, a atividade sexual
irresponsável e o uso de drogas, dentre outros preparativos carnavalescos,
acabam por transformar esse período em tempos difíceis de estatísticas
tristonhas de acidentes, assassinatos, doenças e confusões, o que exige muito
trabalho do plano espiritual.
Sabemos, entretanto, que
tudo sempre dependerá da nossa escolha na questão da associação espiritual.
Afinal, qual seria o mérito daquele que só conseguisse manter seu padrão
vibratório positivo dentro dos centros espíritas? O valor do aprendizado também
está no desafio desse autoconhecimento, na segurança da fé conquistada, na
superação dos obstáculos.
O carnaval não pode ser
simplesmente rejeitado, mas vivenciado com a segurança do entendimento espírita
de responsabilidade e bom senso, como uma festa popular que ainda tem lugar na
escala evolutiva da Terra. Nada há de errado em se buscar a alegria, as
manifestações de felicidade, desde que se questione os caminhos que levam a
ela, para não cairmos nos enganos da felicidade aparente. O caminho a ser seguido
precisa ficar bem claro, se não quisermos complicações futuras: aquilo que não
é bom nos outros momentos da vida não pode ser positivo apenas porque é
carnaval. E que no nosso estandarte permaneça como parâmetro a clássica e mais
importante mensagem: colocar-se no lugar do outro. Sempre.
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