Três irmãos no caminho da redenção

Há 23 anos, o casal Alberto e Angélica Fortunato, atualmente residente em Ibitinga, SP, passou por uma provação das mais difíceis: num instante, perderam três filhos menores afogados numa piscina.

Na época, residiam em São Paulo e foram convidados para passarem o fim de semana na fazenda Bela Vista, que o amigo José, japonês, arrendava em Mogi das Cruzes.

Quando se deu o acidente, naquela fazenda, no dia 4 de dezembro de 1961, não havia nenhum adulto próximo da piscina; lá estavam somente três filhos do casal Fortunato: Jair, com 13 anos de idade, Osmar, com 15, José, com 16, e um menininho, filho do anfitrião. Sabe-se que Jair, aniversariante do dia, foi o primeiro a entrar na piscina. Logo se afogou, e os seus dois irmãos mergulharam para salvá-lo; debateram-se e morreram juntos, apesar da tentativa de salvamento do japonesinho, com uma vara de bambu.

O choque emocional para as duas famílias foi muito grande, pois um fim de semana feliz e festivo transformou-se em poucos minutos, numa dolorosa tragédia.

Vinte e um anos se passaram...

E aos 19 de fevereiro de 1982 o casal Fortunato compareceu à reunião pública do Grupo Espírita da Prece (GEP), em Uberaba, Minas, onde manteve um diálogo rápido com Chico Xavier, quando, para surpresa e alegria de ambos, o médium visualizou, ao lado deles, as entidades espirituais: Maria Justina, avó do sr. Alberto; Angélica, avó da sra. Angelina; e "um senhor japonês", velho amigo do casal.

Horas mais tarde, no desenrolar da reunião, Chico psicografou esta elucidativa carta de José — um dos queridos filhos do casal Fortunato, já domiciliado no Mais Além —, reveladora das razões profundas do acidente coletivo que colocou os três irmãos no caminho da redenção:

Querida mãezinha Angélica e querido papai Alberto, peço-lhes nos abençoem. Sou eu quem toma o lápis para as notícias. Creio que as nossas lágrimas recíprocas já lavaram a nossa dor; entretanto, comovo-me ao recordar a despedida tríplice. Quando caímos nas águas da grande piscina, o Osmar, o Jair e eu estávamos sendo conduzidos pelos desígnios do Senhor a resgatar o passado que nos incomodava.

Nada posso detalhar quanto ao fim do corpo de que nos desvencilhamos, como quem se vê na contingência de trocar a veste estragada e de reajuste impossível. O sono compulsivo que nos empolgou os três foi algo inexplicável de que voltamos à forma da consciência, dias após o estranho desenlace. Estávamos os três alarmados e infelizes no hospital a que fomos transportados, quando duas senhoras se destacaram dos serviços de enfermagem para nos endereçarem a palavra...

No fundo, queríamos apenas regressar a casa e retornar ao cotidiano, porque aquele debate com as águas fora para nós, naquele despertar, uma espécie de brincadeira de mau gosto, na qual supúnhamos haver desmaiado...

Aquele instituto devia ser uma casa de pronto socorro como tantas... Entretanto, as duas senhoras se declararam nossas avós Maria Justina e Angélica, e nos informaram, com naturalidade e sem qualquer inflexão de voz agressiva, que havíamos voltado ao Lar, ao Grande Lar de nossa família na Vida Espiritual. Os irmãos e eu choramos, como não podia deixar de acontecer... Fomos conduzidos à nossa casa e vimos os pais amargurados... Soubemos que o amigo José japonês havia recebido um choque tão grande com a nossa desencarnação que fora também desligado do corpo; soubemos que outros parentes haviam sofrido muito...

Nosso pranto se misturou ao da mamãe Angélica e do papai, do Antônio e do Carlos Alberto, e muitos dias e meses correram nessa situação de incompreensão e de dor...

Dois anos passados, fomos visitados por um amigo de nossa família que se deu a conhecer por Miguel Pereira Landim, respeitado e admirado por nossos familiares da Espiritualidade. Nossa avó Maria Justina nos permitiu endereçar-lhe perguntas e todos os três indagamos dele a causa do sucedido em nossa ida a Mogi. Ele sorriu e marcou o dia em que nos facultaria o conhecimento do acontecido em suas causas primordiais.

Voltando a nós, na ocasião prevista, conduziu-nos os três à Matriz do Senhor Bom Jesus, em Ibitinga. Entramos curiosos e inquietos. A igreja estava repleta de militares desencarnados. Muitos traziam as medalhas conquistadas, outros ostentavam bandeiras. Em meu coração passou a surgir a recordação que eu não estava conseguindo esconder. De repente, vi-me na farda de que não me lembrava, junto dos irmãos igualmente transformados em homens de guerra e o nosso olhar se voltou inexplicavelmente para as cenas que se nos desenrolavam diante dos olhos.

Envergonho-me de confessar, mas a consciência não me permite recuos. Vi-me com os dois irmãos numa batalha naval, que peço permissão para não mencionar pelo nome, quando nós, na condição de brasileiros, lutávamos com os irmãos de república vizinha...

Afundávamos criaturas sem nenhuma ligação com as ordens belicistas nas águas do grande rio, criaturas que, em vão, nos pediam misericórdia e vida... Replicávamos que em guerra tudo resulta em guerra... Foi então que o chefe Landim apontou para uma antiga imagem de Jesus, do Senhor Bom Jesus, e falou em voz alta que aquela figura do Cristo viera do forte Itapura com destino à nossa cidade e que, perante Jesus, havíamos os três resgatado uma dívida que nos atormentava, desde muito tempo.

Aqueles companheiros presentes passaram a nos felicitar, explicando-nos que se haviam transformado em servidores das legiões de Jesus Cristo. O que choramos, num misto de alegria e sofrimento, não sabemos contar. Fique, porém, esta informação para os queridos pais e para os irmãos queridos, a fim de que todos saibamos que a injustiça não é de Deus e que os nossos sofrimentos e provas se efetuam a pedido de nós mesmos, para que a nossa vida espiritual, a única verdadeira, se torne mais aceitável e mais ajustada às Leis Divinas que a todos nos regem. Queridos pais, aqui estamos com a nossa avó Maria Justina, que nos abençoa, e, agradecendo-lhes por todas as consolações com que nos fortalecem até hoje, com o carinho dos meus irmãos presentes, rogo-lhes receber a vida e o amor, as saudades e as melhores esperanças, do filho que lhes pertencerá sempre diante de Deus, José Fortunato.

 

Fonte: Retornaram contando. Francisco Cândido Xavier. Editora IDE.


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