DOS ESPÍRITOS
1. O
Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina
filosófica. Como ciência prática, consiste nas relações que se podem
estabelecer com os Espíritos; como filosofia, compreende todas as consequências
morais que decorrem dessas relações.
2.
Os Espíritos não são, como frequentemente se imagina, seres à parte na criação;
são as almas daqueles que viveram sobre a Terra ou em outros mundos. As almas
ou Espíritos são, pois, uma única e mesma coisa; de onde se segue que quem crê
na existência da alma crê, por isso mesmo, na dos Espíritos. Negar os Espíritos
seria negar a alma.
3. Geralmente, se faz uma ideia muito falsa do estado dos Espíritos; eles não são, como alguns o creem, seres vagos e indefinidos, nem chamas como os fogos fátuos, nem fantasmas como nos contos de assombração. São seres semelhantes a nós, tendo um corpo igual ao nosso, mas fluídico e invisível no estado normal.
4. Quando a alma está unida ao corpo, durante a vida, ela tem duplo envoltório: um pesado, grosseiro e destrutível, que é o corpo; outro fluídico, leve e indestrutível, chamado perispírito. O perispírito é o laço que une a alma e o corpo; é por seu intermédio que a alma faz o corpo agir e percebe as sensações experimentadas pelo corpo. A união da alma, do perispírito e do corpo material constitui o homem; a alma e o perispírito separados do corpo constituem o ser chamado Espírito.
5. A
morte é a destruição do envoltório corporal; a alma abandona esse envoltório
como troca a roupa usada, ou como a borboleta deixa sua crisálida; mas conserva
seu corpo fluídico ou perispírito. A morte do corpo livra o Espírito do
envoltório que o prendia à Terra e o fazia sofrer; uma vez livre desse fardo,
não tem senão seu corpo etéreo que lhe permite percorrer o espaço e vencer as distâncias
com a rapidez do pensamento.
6.
Os Espíritos povoam o espaço; eles constituem o mundo invisível que nos rodeia,
no meio do qual vivemos, e com o qual estamos, sem cessar, em contato.
7.
Os Espíritos têm todas as percepções que tinham na Terra, mas num mais alto
grau, porque suas faculdades não estão mais amortecidas pela matéria; têm
sensações que nos são desconhecidas; veem e ouvem coisas que nossos sentidos
limitados não nos permitem nem ver e nem ouvir. Para eles não há obscuridade, salvo
para aqueles cuja punição é estar temporariamente nas trevas. Todos os nossos
pensamentos repercutem neles, que os leem como em um livro aberto; de sorte que
aquilo que podemos ocultar a alguém vivo, não poderemos mais desde que seja um Espírito.
8.
Os Espíritos conservam as afeições sérias que tiveram na Terra; eles se
comprazem em voltar para junto daqueles que amaram, sobretudo, quando são
atraídos por pensamentos e sentimentos afetuosos que lhes dirigem, ao passo que
são indiferentes para com aqueles que não lhes têm senão a indiferença.
9.
Uma ideia quase geral entre as pessoas que não conhecem o Espiritismo é crer
que os Espíritos, somente porque estão livres da matéria, tudo devem saber e
possuírem a soberana sabedoria. Aí está um erro grave. Os Espíritos, não sendo
senão as almas dos homens, não adquirem a perfeição deixando seu envoltório
terrestre. O progresso do Espírito não se realiza senão com o tempo e não é
senão sucessivamente que ele se despoja de suas imperfeições, que adquire os conhecimentos
que lhe faltam. Seria tão ilógico admitir que o Espírito de um selvagem ou de
um criminoso se torne, de repente, sábio e virtuoso, quanto seria contrário à
justiça de Deus pensar que ele permanecesse perpetuamente na inferioridade.
Como
há homens de todos os graus de saber e de ignorância, de bondade e de maldade,
ocorre o mesmo com os Espíritos. Há os que são apenas levianos e traquinas,
outros são mentirosos, trapaceiros, hipócritas, maus, vingativos; outros, ao contrário,
possuem as mais sublimes virtudes e o saber num grau desconhecido na Terra.
Essa diversidade na qualidade dos Espíritos é um dos pontos mais importantes a
se considerar, porque explica a natureza boa ou má das comunicações que se
recebem; é em distingui-las que é preciso, sobretudo, se aplicar. (O Livros dos Espíritos, nº 100, Escala Espírita. - O Livro dos Médiuns, cap. XXIV.)
MANIFESTAÇÃO DOS ESPÍRITOS
10.
Os Espíritos podem se manifestar de maneiras bem diferentes: pela visão, pela
audição pelo toque, pelos ruídos, pelos movimentos dos corpos, pela escrita,
pelo desenho, pela música, etc. Eles se manifestam por intermédio de pessoas
dotadas de uma aptidão especial para cada gênero de manifestação e que se
distinguem sob o nome de médiuns. É
assim que se distinguem os médiuns videntes, falantes, audientes, sensitivos,
de efeitos físicos, desenhistas, tiptólogos, escreventes, etc. Entre os médiuns
escreventes, há numerosas variedades, segundo a natureza das comunicações que
estão aptos a receber.
11.
O fluido que compõe o perispírito penetra todos os corpos e os atravessa como a
luz atravessa os corpos transparentes; nenhuma matéria lhe opõe obstáculo. É
por isso que os Espíritos penetram por toda a parte, nos lugares o mais
hermeticamente fechados; é uma ideia ridícula crer-se que eles se introduzem
por uma pequena abertura, como o buraco de uma fechadura ou o tubo de uma
chaminé.
12.
O perispírito, embora invisível para nós no estado normal, não deixa de ser
matéria etérea. O Espírito pode, em certos casos, fazê-lo sofrer uma espécie de
modificação molecular que o torna visível e mesmo tangível; assim é que se
produzem as aparições. Esse fenômeno não é mais extraordinário do que o do
vapor que é invisível quando está mais rarefeito, e que se torna visível quando
está condensado. Os Espíritos que se tornam visíveis se apresentam, quase sempre,
sob a aparência que tinham quando vivos e que podem fazê-los reconhecer.
13.
É com a ajuda do seu perispírito, que o Espírito atua sobre seu corpo vivo; é
ainda com esse mesmo fluido que ele se manifesta atuando sobre a matéria
inerte, que produz os ruídos, os movimentos de mesas e outros objetos, que
ergue, tomba ou transporta. Esse fenômeno nada tem de surpreendente se se
considera que, entre nós, os mais poderosos motores se acham nos fluidos os
mais rarefeitos e mesmo imponderáveis, como o ar, o vapor e a eletricidade.
É
igualmente com a ajuda do seu perispírito que o Espírito faz os médiuns
escreverem, falarem, ou desenharem; não tendo mais corpo tangível para atuar
ostensivamente quando quer se manifestar, ele se serve do corpo do médium, de
quem empresta os órgãos que faz atuarem como se fosse seu próprio corpo, e isso
pela emanação fluídica que derrama sobre ele.
14.
No fenômeno designado sob o nome de mesas
girantes ou falantes, é pelo mesmo meio que o Espírito atua sobre a
mesa, seja para fazê-la mover sem significação determinada, seja para fazê-la
dar golpes inteligentes indicando as letras do alfabeto, para formar palavras e
frases, fenômeno designado sob o nome de tiptologia.
A mesa não é aqui senão um instrumento do qual ele se serve, como o faz
com o lápis para escrever; lhe dá uma vitalidade momentânea pelo fluido com o
qual a penetra, mas ele não se identifica com ela. As pessoas que, em sua
emoção, vendo se manifestar um ser que lhes é caro, abraçam a mesa, praticam um
ato ridículo, porque é absolutamente como se elas abraçassem o bastão do qual
um amigo se serve para dar pancadas.
Ocorre
o mesmo com aqueles que dirigem a palavra à mesa, como se o Espírito estivesse
encerrado na madeira e como se a madeira tivesse se tornado espírito.
Quando
as comunicações ocorrem por esse meio, é preciso imaginar o Espírito não na
mesa, mas ao lado, tal como estaria se
estivesse vivo, e tal como se o veria se, nesse momento, pudesse se tornar
visível. A mesma coisa ocorre nas comunicações pela escrita; ver-se-ia o
Espírito ao lado do médium, dirigindo sua mão, ou lhe transmitindo o seu
pensamento por uma corrente fluídica.
15. Quando a mesa se destaca do solo e flutua no
espaço sem ponto de apoio, o Espírito não a ergue com força do braço, mas a envolve
e a penetra com uma espécie de atmosfera fluídica que neutraliza o efeito da
gravitação, como o ar o faz para os balões e os papagaios de papel. O fluido do
qual está penetrada lhe dá, momentaneamente, uma leveza específica maior.
Quando ela está pregada no solo, está num caso análogo ao da campana pneumática
sob a qual se faz o vácuo. Estas não são senão comparações para mostrar a
analogia dos efeitos e não a similitude absoluta das causas.
Compreende-se, depois disso, que não é mais difícil
ao Espírito erguer uma pessoa do que erguer uma mesa, de transportar um objeto
de um lugar para outro ou de lançá-lo em qualquer parte; esse fenômenos se
produzem pela mesma lei.
Quando a mesa persegue alguém, não é o Espírito que
passeia, porque ele pode permanecer tranquilamente no mesmo lugar, mas é quem
lhe dá impulso por uma corrente fluídica com a ajuda da qual a faz mover-se à
sua vontade.
Quando os golpes se fazem ouvir na mesa ou fora
dela, o Espírito não bate com a sua mão, nem com um objeto qualquer; dirige
sobre o ponto de onde parte o ruído, um jato de fluido que produz o efeito de
um choque elétrico. Ele modifica o ruído, como se podem modificar os sons
produzidos pelo ar.
16.
A obscuridade necessária à produção de certos efeitos físicos, sem dúvida, se presta à suspeição e à fraude, mas nada prova
contra a possibilidade do fato.
Sabe-se
que, na química, há combinações que não se podem operar sob a luz; que
composições e decomposições ocorrem sob a ação do fluido luminoso; ora, sendo
todos os fenômenos espíritas o resultado da combinação dos fluidos próprios do
Espírito e do médium, e esses fluidos sendo da matéria, nada há de espantoso de
que, em certos casos, o fluido luminoso seja contrário a essa combinação.
17.
Os Espíritos superiores não se ocupam das comunicações inteligentes senão tendo
em vista a nossa instrução; as manifestações físicas ou puramente materiais,
estão mais especialmente nas atribuições dos Espíritos inferiores, vulgarmente
designados sob o nome de Espíritos
batedores, como, entre nós, as habilidades dizem respeito aos
saltimbancos e não aos sábios.
18.
Os Espíritos são livres; se manifestam quando querem, a quem lhes convêm e
também quando podem, porque não têm sempre a possibilidade. Eles não estão às ordens e ao capricho de quem
quer que seja e não é dado a ninguém fazer com que venham contra sua vontade,
nem fazê-los dizer o que querem calar; de sorte que ninguém pode afirmar
que um Espírito qualquer virá ao seu chamado em um momento determinado, ou
responderá a tal ou tal pergunta. Dizer o contrário, é provar ignorância
absoluta dos princípios mais elementares do Espiritismo; só o charlatanismo tem fontes infalíveis.
19.
Há pessoas que obtêm regularmente e, de alguma forma, à vontade, a produção de
certos fenômenos; mas, há que se anotar que esses são sempre efeitos puramente
físicos, mais curiosos do que instrutivos, e que se produzem constantemente em
condições análogas. As circunstâncias nas quais são obtidos são de natureza a
inspirarem dúvidas, tanto mais legítimas sobre sua realidade quando são
geralmente objetos de uma exploração, e, frequentemente, quando é difícil
distinguir a mediunidade real da prestidigitação.
Os
fenômenos desse gênero, entretanto, podem ser o produto de uma mediunidade
verdadeira, porque pode ocorrer que Espíritos de baixo estágio, que talvez
tinham tido esse ofício, se comprazam nessas espécies de exibições; mas seria
absurdo pensar que os Espíritos, por pouca que seja sua elevação, se alegrem em
se exibirem.
Isso
não infirma em nada o princípio da liberdade dos Espíritos; aqueles que vêm, o
fazem porque isso lhes agrada, mas
não porque sejam constrangidos, e do momento que não lhes convenha mais vir, se
o indivíduo for verdadeiro médium, nenhum efeito se produzirá. Os mais
poderosos médiuns, de efeitos físicos ou outros, têm tempos de interrupção,
independentemente de sua vontade; os charlatães não os têm jamais.
De
resto, esses fenômenos, supondo-os reais, são apenas uma aplicação muito parcial da lei que rege as
relações do mundo corporal com o mundo espiritual, mas não constituem o Espiritismo; de sorte que sua negação não
infirmaria em nada os princípios gerais da Doutrina.
20.
Certas manifestações espíritas se prestam, bem facilmente, a uma imitação mais
ou menos grosseira; mas do fato de que puderam ser explorados, como tantos
outros fenômenos, pela charlatanice e pela prestidigitação, seria absurdo disso
concluir que elas não existam. Para aquele que estudou e conhece as condições normais
nas quais elas podem se produzir, é fácil distinguir a imitação da realidade; a
imitação, de resto, não poderia jamais ser completa e não pode enganar senão o
ignorante incapaz de apreender as nuanças características do fenômeno verdadeiro.
21.
As manifestações mais fáceis de serem imitadas, são certos efeitos físicos e os
efeitos inteligentes vulgares, tais como os movimentos, as pancadas, os
transportes, a escrita direta, as respostas banais, etc.; não ocorre o mesmo
com as comunicações inteligentes de uma alta importância, ou na revelação de
coisas notoriamente desconhecidas do médium; para imitar os primeiros não é
preciso senão a destreza; para simular os outros é preciso, quase sempre, uma
instrução pouco comum, uma superioridade intelectual fora de série e uma
faculdade de improvisação, por assim dizer, universal, ou o dom da adivinhação.
22.
As produções de espectros nos teatros foram apresentadas, injustamente, como
tendo relações com a aparição de Espíritos, das quais são apenas uma grosseira
e imperfeita imitação. É preciso ignorar os primeiros elementos do Espiritismo
para ver nisso a menor analogia e crer que é disso que se ocupa nas reuniões espíritas.
Os Espíritos não se tornam visíveis ao comando de ninguém, mas por sua própria
vontade, nas condições especiais que não estão no poder de quem quer que seja
provocar.
23.
As evocações espíritas não consistem, como alguns imaginam, em fazer voltar os
mortos com um aspecto lúgubre da tumba. Não é senão nos romances, nos contos
fantásticos de fantasmas e no teatro que se veem os mortos descarnados saírem de
seus sepulcros vestidos de lençóis e fazendo estalar seus ossos.
O
Espiritismo, que jamais fez milagres, tanto esse como outros, jamais fez
reviver um corpo morto; quando o corpo está na cova, aí está definitivamente;
mas o ser espiritual, fluídico, inteligente, aí não está metido com seu
envoltório grosseiro; dele se separou no momento da morte e, uma vez operada a
separação, não tem mais nada de comum com ele.
24.
A crítica malevolente procura representar as comunicações espíritas como
cercadas de práticas ridículas e supersticiosas da magia e da necromancia.
Diremos simplesmente que não há, para se comunicar com os Espíritos, nem dias,
nem horas, nem lugares mais propícios uns do que os outros; que não é preciso para
evocá-los, nem fórmulas, nem palavras sacramentais ou cabalísticas; e não há
necessidade de nenhuma preparação, de nenhuma iniciação; que o emprego de
qualquer sinal ou objeto material, seja para atraí-los, seja para afastá-los,
não tem efeito e o pensamento basta; enfim, que os médiuns recebem suas
comunicações tão simplesmente e tão naturalmente como se fossem ditadas por uma
pessoa viva, sem sair do estado normal. Só o charlatanismo poderia tomar
maneiras excêntricas e adicionar acessórios ridículos.
A
evocação dos Espíritos se faz em nome de Deus, com respeito e recolhimento; é a
única coisa recomendada às pessoas sérias que querem ter relações com Espíritos
sérios.
25.
As comunicações inteligentes, que se recebem dos Espíritos, podem ser boas ou
más, justas ou falsas, profundas ou levianas, segundo a natureza dos Espíritos
que se manifestam. Os que provam a sabedoria e o saber são Espíritos avançados
que progrediram; os que provam a ignorância e as más qualidades são Espíritos
ainda atrasados, mas que progredirão com o tempo.
Os
Espíritos não podem responder senão sobre o que sabem, segundo seu
adiantamento, e, ademais, sobre o que lhes é permitido dizerem, porque há
coisas que não devem revelar, uma vez que ainda não é dado ao homem tudo
conhecer.
26.
Da diversidade nas qualidades e nas aptidões dos Espíritos, resulta que não
basta se dirigir a um Espírito qualquer para obter uma resposta justa a toda
pergunta, porque, sobre muitas coisas, não podem dar senão a sua opinião pessoal, que pode ser
justa ou falsa. Se ele for sábio, confessará a sua ignorância sobre o que não
sabe; se for leviano ou mentiroso, responderá sobre tudo sem se importar com a
verdade; se for orgulhoso, dará a sua ideia como verdade absoluta. Haveria,
pois, imprudência e leviandade em aceitar, sem controle, tudo o que vem dos
Espíritos.
Por
isso, é essencial estar esclarecido quanto à natureza daqueles com os quais se
ocupe. (O Livro dos Médiuns, nº
257.)
27.
Reconhece-se a qualidade dos Espíritos por sua linguagem; a dos Espíritos
verdadeiramente bons e superiores é sempre digna, nobre, lógica, isenta de
contradições; anuncia a sabedoria, a benevolência, a modéstia e a mais pura
moral; é concisa e sem palavras inúteis. Entre os Espíritos inferiores,
ignorantes ou orgulhosos, o vazio das ideias, quase sempre, é compensado pela abundância
das palavras. Todo pensamento evidentemente falso, toda a máxima contrária à sã
moral, todo conselho ridículo, toda expressão grosseira, trivial ou simplesmente
frívola, enfim, toda marca de malevolência, de presunção ou de arrogância, são
sinais incontestáveis de inferioridade em um Espírito.
28.
O objetivo providencial das manifestações é convencer os incrédulos de que tudo
não termina, para o homem, com a vida terrestre e de dar aos crentes ideias
mais justas sobre o futuro. Os bons Espíritos vêm nos instruir tendo em vista o
nosso melhoramento e o nosso adiantamento e não para nos revelar o que não devemos
ainda saber, ou o que não devemos aprender senão pelo nosso trabalho. Se
bastasse interrogar os Espíritos, para se obter a solução de todas as
dificuldades científicas, ou para fazer descobertas e invenções lucrativas,
todo ignorante poderia tornar-se sábio facilmente e todo preguiçoso poderia se
enriquecer sem esforço; é o que Deus não quer. Os Espíritos ajudam o homem de gênio
pela inspiração oculta, mas não o isentam nem do trabalho das pesquisas, a fim
de deixar-lhe o mérito.
29.
Seria fazer uma ideia bem falsa dos Espíritos, vendo neles apenas os auxiliares
dos ledores de sorte; os Espíritos sérios recusam- se ocupar de coisas fúteis;
os Espíritos levianos e zombeteiros se ocupam de tudo, respondem a tudo, predizem tudo o que se quer, sem se
inquietarem com a verdade, e sentem um prazer maligno ao mistificarem as
pessoas muito crédulas; é por isso que é essencial estar perfeitamente fixado
sobre a natureza das perguntas que se podem dirigir aos Espíritos. (O Livro dos Médiuns, nº 286:
Perguntas que se podem dirigir aos Espíritos)
30.
As manifestações não estão, pois, destinadas a servirem aos interesses
materiais, cujo cuidado está entregue à inteligência, ao discernimento e à
atividade do homem. Seria em vão que tentar-se-ia empregá-las para conhecer o
futuro, descobrir tesouros ocultos, recuperar heranças, ou encontrar meios de
se enriquecer. Sua utilidade está nas consequências morais que dela decorrem; mas
se não tivessem por resultado senão fazer conhecer uma nova lei da Natureza, de
demonstrar, materialmente, a existência da alma e sua imortalidade, isso já
seria muito, porque seria um novo e largo caminho aberto à filosofia.
31.
Pode-se ver, por essas poucas palavras, que as manifestações espíritas, de
qualquer natureza que sejam, nada têm de sobrenatural nem de maravilhoso. São
fenômenos que se produzem em virtude da lei que rege as relações do mundo
corporal e do mundo espiritual, lei também tão natural como a da eletricidade, da
gravidade, etc. O Espiritismo é a ciência que nos faz conhecer essa lei, como a
mecânica nos faz conhecer a lei do movimento, a ótica a da luz. As
manifestações espíritas, estando na Natureza, produziram-se em todas as épocas;
a lei que as rege, sendo conhecida, nos explica uma série de problemas
considerados insolúveis; é a chave de uma multidão de fenômenos explorados e
aumentados pela superstição.
32.
Estando o maravilhoso completamente descartado, esses fenômenos nada mais têm
que repugne à razão, porque vêm tomar lugar ao lado dos outros fenômenos
naturais. Nos tempos da ignorância, todos os efeitos dos quais não se conhecia
a causa eram reputados sobrenaturais; as descobertas da ciência restringiram sucessivamente
o círculo do maravilhoso; o conhecimento dessa nova lei veio reduzi-lo a nada.
Aqueles, pois, que acusam o Espiritismo de ressuscitar o maravilhoso, provam,
por isso mesmo, que falam de uma coisa que não conhecem.
DOS MÉDIUNS
33.
O médium não possui senão a faculdade de se comunicar; a comunicação efetiva
depende da vontade dos Espíritos. Se os Espíritos não querem se manifestar, o
médium nada obtém; é como um instrumento sem músico.
34.
A facilidade das comunicações depende do grau de afinidade que existe entre os fluidos do médium e do Espírito.
Cada médium está, assim, mais ou menos apto para receber a impressão ou impulso do pensamento de tal ou tal Espírito; ele pode ser um bom
instrumento para um e mau para um outro. Disso resulta que, dois médiuns
igualmente bem dotados, estando um ao lado do outro, um Espírito poderá se
manifestar por um e não pelo outro. É, pois, um erro crer que basta ser médium
para receber com igual facilidade as comunicações de todo Espírito. Não existem
médiuns universais. Os Espíritos procuram, de preferência, os instrumentos que
vibrem em uníssono com eles.
Sem
a harmonia, que só a assimilação fluídica pode proporcionar, as comunicações
são impossíveis, incompletas ou falsas. Podem ser falsas porque, à falta do
Espírito desejado, não faltam outros, prontos para aproveitarem a ocasião de se
manifestarem e que pouco se importam em dizer a verdade.
35.
Um dos maiores escolhos da mediunidade é a obsessão, quer dizer, o império que certos Espíritos podem
exercer sobre os médiuns, impondo-se a eles sob nomes apócrifos e impedindo-os de
se comunicarem com outros Espíritos.
36.
O que constitui o médium, propriamente dito, é a faculdade; sob esse aspecto,
ele pode estar mais ou menos formado, mais ou menos desenvolvido. O que
constitui o médium seguro, o
que se pode verdadeiramente qualificar de bom médium, é a aplicação da faculdade, a aptidão de servir de
intérprete dos bons Espíritos. (O
Livro dos Médiuns, cap. XXIII.)
37.
A mediunidade é uma faculdade essencialmente móvel e fugidia, pela razão de
estar subordinada à vontade dos Espíritos; por isso é que está sujeita a
intermitências. Esse motivo, e o princípio mesmo segundo o qual se estabelece a
comunicação, são os obstáculos a que se torne uma profissão lucrativa, uma vez
que não poderia ser nem permanente, nem aplicável a todos os Espíritos e porque
poderia faltar no momento em que dela se tivesse necessidade. Aliás, não é
racional admitir que os Espíritos sérios
se coloquem à disposição da primeira pessoa que os queira explorar.
38.
A propensão dos incrédulos, geralmente, é suspeitar da boa fé dos médiuns e
supor o emprego de meios fraudulentos.
Além
de que, no entendimento de certas pessoas, essa suposição é injuriosa; é
preciso, antes de tudo, perguntar qual interesse poderiam eles ter para
enganarem e divertirem ou representarem a comédia. A melhor garantia de
sinceridade está no desinteresse absoluto, porque aí onde nada tem a ganhar, o
charlatanismo não tem razão de ser.
Quanto
à realidade dos fenômenos, cada um pode constatá-la, se se coloca nas condições
favoráveis e se aplica a paciência na observação dos fatos, a perseverança e a
imparcialidade necessária.
DAS REUNIÕES ESPÍRITAS
39.
Os Espíritos são atraídos pela simpatia, a semelhança dos gostos e de
caracteres, a intenção que faz desejar a sua presença. Os Espíritos superiores
não vão às reuniões fúteis, do mesmo modo que um sábio da Terra não iria numa
assembleia de jovens estouvados. O simples bom senso diz que não pode ser de
outra forma; ou, se aí vão algumas vezes, é para dar um conselho salutar, combater
os vícios, procurar conduzir para o bom caminho; se não são escutados,
retiram-se. Seria ter uma ideia completamente falsa, crer que os Espíritos
sérios possam se comprazer em responder a futilidades, a perguntas ociosas que
não provam nem afeição, nem respeito por eles, nem desejo real, nem instrução,
e ainda menos que possam vir dar espetáculo para divertimento dos curiosos. O que
não faziam quando vivos, não podem fazê-lo depois da sua morte.
40.
A frivolidade das reuniões tem por resultado atrair os Espíritos levianos que
não procuram senão ocasiões de enganarem e de mistificarem. Pela mesma razão
que os homens graves e sérios não vão às assembleias levianas, os Espíritos
sérios vão apenas às reuniões sérias, cujo objetivo é a instrução e não a
curiosidade; é nas reuniões desse gênero que os Espíritos superiores gostam de dar
seus ensinamentos.
41.
Do que precede resulta que, toda reunião espírita, para ser proveitosa, deve,
como primeira condição, ser séria e recolhida; que tudo deve se passar nela
respeitosamente, religiosamente e com dignidade, se se quer obter o concurso
habitual dos bons Espíritos. É preciso não esquecer que, se esses mesmos
Espíritos aí se fizessem presentes quando vivos, ter-se-ia por eles
considerações às quais têm ainda mais direito depois da sua morte.
42.
Em vão se alega a utilidade de certas experiências curiosas, frívolas e
divertidas, para convencer os incrédulos; é a um resultado muito oposto que se
chega. O incrédulo, já levado a zombar das mais sagradas crenças, não pode ver
uma coisa séria naquilo do qual se faz um divertimento; não pode ser levado a respeitar
o que não lhe é apresentado de maneira respeitável; também das reuniões fúteis
e levianas, nas quais não há nem ordem, nem gravidade, nem recolhimento, ele
leva sempre má impressão. O que pode, sobretudo, convencê-lo, é a prova da presença
de seres cuja memória lhe é cara; diante de suas palavras graves e solenes,
diante das revelações íntimas, é que se o vê emocionar-se e fraquejar. Mas,
pelo fato de que há mais respeito, veneração, afeição pela pessoa cuja alma se
lhe apresenta, ele fica chocado, escandalizado, de vê-la chegar a uma assembleia
sem respeito, no meio de mesas que dançam e da pantomima dos Espíritos
levianos; por incrédulo que seja, sua consciência repele essa mistura do sério
e do frívolo, do religioso e do profano, por isso taxa tudo isso de
charlatanice e, frequentemente, sai menos convencido do que quando entrou.
As reuniões dessa natureza fazem sempre mais mal do que bem, porque afastam da Doutrina mais pessoas do que a ela conduzem, sem contar que se prestam a motivar a crítica dos detratores, que nela encontram motivos fundados de zombaria.
Fonte:
Kardecpedia
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