Os fenômenos ao nível
quântico apresentam características completamente diferentes das que observamos
no nosso cotidiano. No entanto, é prematuro crer que eles sejam causados por
agentes de ordem divinos ou espirituais.
No texto anterior,
apresentamos um alerta a respeito de algumas afirmativas envolvendo ideias da
Física Quântica e ideias espíritas ou espiritualistas.
Um dos fenômenos de natureza quântica que desperta exclamação nas pessoas leigas em geral é o chamado Salto Quântico, onde uma partícula “desaparece” da posição (ou estado) em que está e “aparece” em outra posição (ou estado) sem viajar através das posições (ou estados) intermediários entre o ponto (estado) inicial e final. Esse fenômeno sugere o pensamento de que a partícula se desmaterializa na posição inicial e se materializa, em seguida, na posição final. Assim, surge a ideia de se comparar esse fenômeno com o que a Doutrina Espírita descreve como sendo o efeito físico de materialização de objetos. O erro ocorre, primeiramente, porque partículas isoladas não são comparáveis a objetos macroscópicos. Pensar que “a partícula é desmaterializada aqui e materializada ali” é uma forma “clássica” de se pensar, isto é, é uma forma de pensar de acordo com o nosso costume de analisar os movimentos dos objetos macroscópicos. Não existe suficiente informação para concluir se o fenômeno de materialização ou desmaterialização de objetos macroscópicos ocorre da mesma forma como descrito com um salto quântico. Vale lembrar que os mecanismos do salto quântico são ainda uma incógnita para a Ciência.
Outra característica interessante é a chamada dualidade onda-partícula onde um objeto quântico, apresenta características ora de partícula, ora de onda, dependendo de como “olhamos” para ela, isto é, de como o experimento é feito para detectá-la. O aspecto que chama a atenção é o caráter subjetivo do resultado do experimento: ele depende da nossa escolha. Voltaremos a esse ponto adiante.
Existe um postulado da Mecânica
Quântica chamado colapso da função de onda. Por função de onda, entende-se uma
função matemática associada às propriedades físicas de uma dada partícula ou
sistema formado por um conjunto delas. Segundo a Mecânica Quântica, o estado de
uma partícula, antes de se fazer uma medida, é representado por uma
superposição de todas as situações possíveis. Apenas após a medição é que algum
dentre os possíveis valores de uma dada grandeza física se manifesta. É dito,
então, que a função de onda colapsou para o estado representado pelo valor da
grandeza medida. A partir daí, dependendo da propriedade física, se não houver
interferências externas, a partícula se caracterizará por possuir o mesmo valor
que foi medido para a tal propriedade. Aqui, como no caso da dualidade
onda-partícula, o observador tem um papel decisivo na caracterização das
propriedades das partículas.
Outro fenômeno que foi
constatado experimentalmente é o chamado fenômeno de não localidade. Num
arranjo experimental conhecido como “experiência de Einstein-Podolsky-Rosen”
verificou-se ser possível o envio de uma informação de modo instantâneo de um
ponto a outro do espaço. O salto quântico e o colapso da função de onda seriam,
também, exemplos de fenômenos não locais.
Não é preciso citar outros
exemplos para percebermos que esses fenômenos que acontecem com as partículas
da matéria são completamente diferentes daquilo que vemos ao nível
macroscópico. Esse caráter estranho e misterioso que tais fenômenos apresentam
têm levado alguns irmãos nossos do movimento espírita a formularem
extrapolações de ordem espiritualista para explicá-los. Apesar da intenção
nobre de verificar o acordo entre o Espiritismo e os avanços da Ciência, tais
estudos precisam ser feitos com um rigor ainda maior do que aquele que
caracteriza um trabalho usual de pesquisa científica, pois a responsabilidade
de divulgar uma ideia espírita ligada à Ciência é muito grande. Imagine o
leitor o que pensará um cientista ao ler alguma interpretação errada de algum
conceito científico. Poderemos afastar o seu interesse no Espiritismo por causa
de uma ideia ou colocação errada.
Segundo Goswami uma solução seria postular-se a existência de uma
consciência maior ou consciência cósmica que seria onipresente (para resolver o
problema da não localidade) e estaria ligada a cada ser humano (para resolver o
problema do colapso da função de onda).
Esta proposta é interessante
do ponto de vista espiritualista e, a nosso ver, se constitui na primeira
proposta espiritualista mais séria envolvendo questões de ordem científica.
Note que utilizamos a palavra espiritualista e não espírita. A razão para isso
é que, em nossa análise, apesar da proposta do Prof. Goswami introduzir a
existência de uma consciência que poderia ser considerada, em princípio, como o
Criador, ela não resolve o problema do Espírito. Segundo a sua proposta, a
nossa consciência individual não existiria de forma independente do corpo
físico. Isso está em franco desacordo com a Doutrina Espírita que afirma que
somos a “individualização do princípio inteligente” (questão 79 de "O Livro
dos Espíritos"), e que o princípio inteligente independe da matéria.
Como o Prof. Goswami foi um convidado especial no MEDINESP 2003, é preciso reafirmar o alerta que fizemos no texto anterior de modo a orientar o leitor a receber as suas ideias e opiniões com precaução. Faço minhas as palavras do espírito de Erasto (Revista Espírita): é preferível “rejeitar dez verdades a aceitar uma só mentira".
Ainda sobre os paradoxos da
Mecânica Quântica, vale lembrar que para a comunidade científica eles ainda não
foram completamente pesquisados e esclarecidos. A atitude mais prudente é
esperar pelo desenvolvimento dessas pesquisas de modo a termos mais certezas e
seguranças sobre o assunto.
Apesar de não conhecermos ainda os seus mecanismos mais profundos, os
fenômenos descobertos pela Física Moderna não estão em desacordo com os
princípios básicos da Doutrina Espírita. E o que considero, particularmente,
importantíssimo: eles (os fenômenos da Física Moderna) não sugerem que ela (a
Doutrina Espírita) precise ser atualizada.
Referências
A. Goswami, O Universo Autoconsciente,
Editora Rosa dos Tempos, 4a. Ed. (2001).
Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, FEB,
76a. Edição.
Allan. Kardec, Revista Espírita 1861.
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