Jerônimo Mendonça Ribeiro

Jerônimo nasceu em Ituiutaba (MG) no dia 1º de novembro de 1939. Filho de Altíno Mendonça e Antonia Olímpia de Jesus, sendo nono filho de uma irmandade de dez filhos, teve uma infância pobre cheia de privação e seus pais eram muito pobres, analfabetos, lutavam arduamente pela sobrevivência: a mãe lavando roupa para fora e o pai fazendo “bicos” pelas fazendas. Com treze anos foi levado a conhecer a Igreja Presbiteriana, que professou até os 15 anos.

 Após a desencarnação de sua avó, começou a se debater mentalmente no problema cruciante da morte e do destino da alma. Dotado de um espírito indagador, não se sujeitou aos horizontes estreitos da igreja no que tange à crença em Deus, ao conceito de uma vida única e de uma salvação limitada.

 A amizade com um espírita fê-lo converter-se à doutrina espírita. O amigo esclareceu-lhe suas dúvidas sobre a vida além-túmulo e conseguiu acalmá-lo. Já na puberdade, Jerônimo começou a sentir dores nas articulações, especialmente nos joelhos e tornozelos. Esses pontos de seu corpo passaram a “inchar” e já aos dezoito anos andava com dificuldade. Teve vários empregos, porém as dores se agravaram, não lhe deram trégua e o impediram de permanecer por muito tempo num mesmo trabalho, em que foi balconista, entregador de jornal, redator-chefe de uma revista e professor. Seu passatempo preferido era ir ao cinema. 

Era fascinado pelo Tarzan, sendo este o seu apelido. Enquanto sua saúde lhe permitiu, participou ativamente das excursões com os jovens de uma Mocidade Espírita; contavaentão dezesseis anos. Conhecer o Espiritismo ainda na juventude foi de grande auxílio para ele, pois aos 18 anos de idade defrontou-se com uma das primeiras grandes provações que tinha de vencer: a artrite reumatóide, que causava enormes dores e dificuldade de locomoção, quadro esse que se foi agravando até que aos 20 anos de idade ficou definitivamente de cama. Certo dia foi ao cinema assistir “...E o Vento Levou”, mas não havia nenhuma poltrona vazia. Jerônimo ficou então quatro horas em pé no fundo da sala.

 Ao terminar o filme , ele estava como que petrificado, com grande vibração de dor nos membros inferiores. Foi aí que começou a jornada dolorosa e difícil da paralisia. Passou três meses deitado, plenamente impossibilitado de se locomover. Depois usou muletas por algum tempo enquanto ia lecionar. Porém, acabou mesmo tendo que ficar numa cama ortopédica, porque a artrite reumatóide progredira. Seu quadro tão desolador que, mesmo sob efeito medicamentos, seus amigos tiveram que fabricar uma cama especial e colocar sobre seu peito um saco de areia de 30 quilos para que pudesse suportar a dor. Recebeu de um amigo a doação de uma Kombi para poder ser levado às palestras.

Uma tribuna ambulante – Jerônimo tornou-se, então, um orador espírita, transformando seu leito numa tribuna ambulante que viajou pelo Brasil todo, realizando um grande e valioso trabalho. Quem o conheceu afirma que ele estava sempre rindo, gostava de um bom papo e de cantar também. Certa vez, o Dr. Fritz disse-lhe que ele tinha a doença de três CCC – cama, carma e calma. Os amigos sempre levavam Jerônimo ao cinema e também a outros lugares para se distrair. Estando, certa ocasião, justamente num cinema, uma moça tropeçou em sua cama e “explodiu”: “Mas não é possível! Aonde eu vou, está o aleijado! Vou a uma festa, o aleijado lá!

 Esse aleijado me persegue! Aonde eu vou, ele está!” Jerônimo pensou consigo: “E agora?! A moça está revoltada, nervosa mesmo. Tenho que lhe dar uma resposta, mas não quero irritá-la mais ainda. O que dizer?” E saiu com essa: “Mas também, minha filha, você não pára em casa, hein!” Ela olhou-o atônita e começou a rir. Riram juntos. Ficaram amigos. Permaneceu assim cerca de trinta e dois anos preso ao leito, paralítico e com a agravante da perda da visão. Como tinha dificuldade de dormir, aproveitou para estudar bastante o Espiritismo. Quando ficou cego, os amigos liam para ele. Certa vez, um repórter lhe perguntou o que é a felicidade. Ele respondeu assim: “A felicidade, para mim, deitado há tanto tempo nesta cama sem poder me mexer, seria poder virar de lado”.

 Em outra ocasião, ele disse: “Caseime com a Doutrina Espírita no civil e com a dor no religioso”. Eis alguns casos da vida desse vulto do Espiritismo:

 Por ocasião de um “enterro”, quando o cortejo seguia para o cemitério, sua Kombi estava logo atrás. Retirado o caixão, quando as pessoas se dirigiam para o local, um alcoolizado que passava, vendo os amigos lhe carregando a cama, exclamou: “Nossa! Dois defuntos! Esqueceram o caixão deste!” Ele aprendeu a não se revoltar com comentários infelizes. Gostava de citar uma frase de Cairbar Schutel: “Melindres é orgulho ferido”.

 Numa palestra de Divaldo Pereira, a cama de Jerônimo estava em evidência, na frente, para não atrapalhar os que quisessem passar. Em certo momento, aproximou-se um homem alcoolizado que lhe disse: “Paralítico, levanta-te e anda!” E Jerônimo respondeu: “Depois, meu amigo, depois”. Temia Jerônimo que a cena fosse notada e atrapalhasse a palestra. “Paralítico, levanta-te e anda!”, insistiu o bêbado. “Bem que eu queria, mas não consigo”, falou baixo o Jerônimo, tentando chamar o homem à razão. O bêbado saiu desconsolado: “Oh, homem de pouca fé!”.

Conselho a um homem desesperado – Um certo dia uma pessoa foi orientada pela irmã de Jerônimo para que esse fosse fazer uma visita a seu irmão, e ele assim o fez.

 Quando chegou à casa, foi convidado a entrar e, ouvindo o barulho do pessoal nos fundos da casa, para lá se dirigiu. As gargalhadas do Jerônimo sobressaíam à distância. O homem estava tão desesperado que ao ouvir os risos virou-se para D.Terezinha e disse, revoltado: “É esse homem que irá me confortar?” Fez-se silêncio; o homem foi chamado e apresentado. “Jerônimo, aqui está um senhor que veio de São Paulo só para conversar com você.

 Por certo, desejará fazê-lo sozinho”. Os jovens se retiraram, e o senhor tomou a palavra: “Olha moço, eu era uma pessoa muito rica até uma semana atrás. Eu tinha uma fazenda com eletricidade, com todo o conforto da vida moderna, até campo de aviação. Tinha tudo. Fui tão incauto que, ao fazer a venda da fazenda, passei a escritura e recebi uma nota fria”. O Jerônimo estranhou o que era uma nota fria.

 “Uma duplicata sem valor. Eu não tive nem condições de reclamar. O advogado falou que era perda de tempo. A minha família antes se tolerava, porque nós conversávamos por bilhetes, eu nos meus weekends, a minha esposa nos seus chás, e os filhos iam onde queriam.

 Agora todos vêm em cima de mim, me cobrando o conforto, me cobrando a fazenda; eu não resisto a essa situação. Estava na farmácia justamente comprando um remédio para dar fim à minha vida quando apareceu um amigo, que perguntou:” Para que você quer isso?” Como ele sabia do negócio que eu fiz e do meu desespero, disse-me: “Eu não admito que você compre esse remédio!” Eu respondi: “Como? Você não manda na minha vida!” Aí ele explicou: “Eu vou deixar, sim, você cuidar de sua vida, se você me prometer que vai conversar com o Jerônimo Mendonça, em Ituiutaba. Eu lhe dou a passagem” . Ele me deu a passagem, aqui estou eu, mas acho que perdi tempo, porque você é uma pessoa feliz, que não sabe o que é o sofrimento alheio”. O Jerônimo lhe respondeu: “Meu amigo, você é uma pessoa que realmente está sofrendo. Você perdeu uma fazenda maravilhosa, mas vamos supor que essa criatura que lhe comprou a fazenda voltasse agora e lhe perguntasse : “Você quer trocar a fazenda por um olho seu?” “Ah! Jerônimo, que bobagem é essa, isso é conversa que se fale!” “Não, o olho não, o olho é muito precioso, então vamos supor... Um braço”.

 “Ah! Mas que bobagem! Que conversa! Onde já se viu isso?” “Oh meu amigo! E cheguei à conclusão que você não é pobre, você não é miserável. Você é arquimilionário das bênçãos de Deus. O homem ao sair dali mudou seu modo de pensar, sempre que podia voltava para trocar idéias com Jerônimo, e acabou se tornando um trabalhador da seara espírita”.

Revista o imortal, número 648, por Marinei Ferreira Rezende.

Nenhum comentário:

Postar um comentário