Autor espiritual: Espíritos Diversos
Ano: 1963
Prefácio:
Estultícia de nossa parte -
e o afirmamos sem pruridos de modéstia - a pretensão de prefaciar e anotar uma
obra mediúnica das proporções desta, em que poetas das principais correntes
literárias, desde a romântica à modernista, de duas literaturas - a Brasileira
e a Portuguesa -, inclusive poetas folcloristas, deixaram estereotipados a
força viva e o carisma inconfundível de seus estilos.
Natural, porém, que todo
livro de constituição nova exija explicação, perfunctória que seja, de sua
origem e finalidade, e, à vista disso, aqui nos encontramos, fiel ao
compromisso assumido com os autores espirituais, no sentido de estudar todas as
composições poéticas desta Antologia, alinhando nótulas bibliográficas e
traçando leves observações sobre a técnica poética de determinados aedos, além
de ligeiros comentários de fundo espírita, visando a clarear afirmações e
situações para os leitores menos afeitos ao trato doutrinal.
Antes de tudo, é imperioso dizer que o título da obra - Antologia dos Imortais - foi sugerido aos médiuns por um amigo de Espiritualidade, conquanto não guarde qualquer relação com a imortalidade acadêmica, laureada na Terra, para simplesmente vincular-se àquela outra imortalidade de que nos fala Pascal em seu livro Pensées - a perenidade do Espírito que nunca morre -, através da presença de amigos desencarnados, que atravessaram as cinzas do túmulo e continuam vivos, senhores dos próprios destinos.
Tratando-se de obra
eminentemente mediúnica, Antologia dos Imortais destina-se, de modo particular,
aos que se afeiçoaram ao conteúdo poético da vida. Por isso mesmo, é justo que
o leitor se prepare para encontrar, de permeio com autênticas obras-primas,
poesias menos belas, quer quanto à forma, quer quanto ao fundo, de vez que não
há poeta que viva sempre em momentos sublimes. Todos eles no mundo
experimentaram dificuldades e angústias, inibições e frustrações de estaca-zero
e não seria lícito esperar que, desencarnados, comparecessem, entre nós,
invariavelmente no apogeu da cultura e da emoção, segundo os cânones e as
regras estabelecidas pela crítica humana. Forçoso igualmente considerar que o
médium não pode ser responsável pelos hiatos, lacunas, oclusões e omissões por
parte dos poetas desencarnados comunicantes, compreensivelmente muito mais
ocupados e interessados na eliminação dos conflitos íntimos, ante a grandeza da
vida, que se lhes descerra além do túmulo, que atentos à observação e à análise
da opinião pública terrestre. Em face disso, encontramos comunicantes maiores
ou menores, superiores ou inferiores, emitentes ou anônimos, conhecidos e menos
conhecidos na série dos que espiritualmente comparecem, através das faculdades
medianímicas, manifestando as opiniões e emoções de que se fazem mensageiros e
intérpretes.
Aos que porventura
discordarem da inclusão de poetas tidos por secundários ou obscuros, lembramos
o que escreveu Andrade Muricy: Pode um dragão possuir cauda de réptil e
entretanto ser dotado de possantes asas de marsupial... Um autor secundário
apresenta muita vez aspectos grandemente reveladores.
Um ponto, contudo, deve
ficar claro: é que todos os poetas, quase sem exceção, buscaram ater-se, neste
livro, à confirmação do continuísmo da vida após a morte do corpo físico e aos
consoladores ensinos da Doutrina Espírita, acentuando-se que vários deles
chegaram a se especializar em determinados assuntos doutrinários, quais sejam a
exposição da Lei de Causa e Efeito, as narrativas das regiões inferiores do Espaço,
a posição espiritual dos que atravessam as faixas da morte, a experiência do
processo liberatório, as consequências do suicídio, a importância do amparo ao
coração infantil, o quadro de responsabilidades dos pais terrestres, etc. Tal
preocupação, quer-nos parecer, não existia, num sentido total, no Parnaso de
Além-Túmulo.
Os aedos no intercâmbio de
ontem tinham como que a obrigação formal de evidenciar a própria personalidade,
atreitos às idiossincrasias que os singularizavam, para, ao que supomos, serem
reconhecidos pelos críticos literários.
Nesta obra, prosseguem na
construção espiritual em que se empenharam, mas oferecendo a ideia de que se
irmanaram no propósito de revelar os objetivos superiores do Espiritismo.
Quanto à fidelidade estilística, terá o leitor oportunidade de reconhecê-la por
notas de rodapé, mobilizando transcrições de pequeninos trechos dos autores,
quando entre os homens.
É assim que Da Costa e
Silva, o poeta da saudade, que ontem se embevecia e cantava:
Saudade! Olhar de minha mãe
rezando, e o pranto lento deslizando em fio... Saudade! Amor da minha terra...
O rio cantigas de águas claras soluçando.
volta, hoje, a enternecer-se
no soneto Ressurreição:
Ressurreição! A madrugada
flórea!... O céu brilhando, em mágica oferenda... Estranho à nova luz que se
desvenda, vejo as telas antigas da memória.
Fulge o carro da vida
renascente, mas volvo à sombra e choro a dor pungente da saudade sem fim de
minha terra!...
Nos demais sonetos, o poeta
continua preso à paisagem que o sensibilizava, recordando o coração materno que
lhe ofertou aconchego.
Augusto dos Anjos, o poeta
da Morte, dentro de peculiaridades inimitáveis, examina temas espíritas, por
exemplo, a Obsessão, que nomeia como sendo A hidra de sentimentos fesceninos, e
a desencarnação, assunto que explana brilhantemente no soneto Morte Húmida,
quando afirma: A alma ditosa nasce noutro nível. É o parto novo... E a vida
imperecível desabrocha qual lírio sobre o estrume.
No poema Divino Sol o poeta,
a nosso ver, espiritualiza As Cismas do Destino, quando, atravessando a ponte
Buarque de Macedo, caminha em direção à casa do Agra, no Recife.
B. Lopes, o poeta fluminense
dos Cromos, comparece com toda aquela verve em que se caracteriza, no mesmo
estilo que lhe perpetuou o nome. Principalmente, no sonetilho Lição, o símile é
perfeito: Nas grimpas do pé de amora o vento leve balança e toda a flor terna e
mansa que voa caminho afora.
João de Deus, o suave poeta
português, que de há muito vem colaborando na Seara Espírita, traz, novamente,
produções que lhe identificam o estro invulgar.
Lívio Barreto, o jovem poeta
cearense, que se revelou vigoroso senhor do verso, ressurge pleno de emoção em
sua lírica amatória, patenteando a divina afetividade do Mundo Superior.
Jésus Gonçalves e Virgílio
Quaglio agradecem a Deus a bênção da enfermidade que lhes envolveu os corpos na
última existência.
Auta de Souza, Inês Sabino,
Júlia Cortines, Narcisa Amália e Francisca Clotilde, admiradas poetisas e
escritoras brasileiras, deixam aqui a marca indelével da inspiração que lhes
flamejava no sentimento.
Irene S. Pinto, a distinta
poetisa paulista, expõe as pérolas de sua ternura e sensibilidade, enquanto
Casimiro Cunha e Adelaide Câmara (Aura Celeste) continuam sob o vigor da fé
viva que lhes vitalizava os ideais.
Não nos abalançaremos a
confrontos entre as produções terrestres e as medianímicas de todos os bardos
reunidos nestas páginas para não fugir ao espírito de síntese; entretanto,
pedimos vênia ao leitor para referir-nos, ainda mesmo de leve, a figuras
outras, das mais respeitáveis de nossa literatura.
Moacir de Almeida, que
Agrippino Grieco define como sendo o condoreiro de 1920, desencarnado aos 23
anos de idade, depois de legar-nos os seus admiráveis Gritos Bárbaros, traz-nos
o soneto Muito Além que, por si só, lhe revela a mestria.
Francisca Júlia, intérprete
das mais entusiastas da Escola Parnasiana, no Brasil, diz-nos, em Adeus, da
esperança que alimenta de renascer na Terra, mais tarde.
Nestor Vítor, o poeta e
crítico literário que mais se preocupou com o Simbolismo, em plagas
brasileiras, precata-nos, através de Eutanásia, contra o perigo de se abreviar
a vida de alguém, porque a alma jungida à carne nos rogará, por certo:
"Aguardo a mão da Lei,
sempre doce e bem-vinda! Dá-me silêncio e paz! Não me expulses ainda!..."
Castro Alves, o gênio da
América, nascido no Brasil, pintando a França de 1857, derrama o seu verbo
glorioso:
O caos invadira a França, -
Olimpo do pensamento. O ódio - lobo famulento, range as presas com furor. Nas
ruas - Paris descansa; em casa - chora em segredo; gigante, arrosta, com medo,
as iras do Imperador.
Tobias Barreto, o condor
sergipano, mostra, em Deus e a Humanidade, soneto em versos alexandrinos do
mais fino lavor, que o espírito é o artífice da própria vida, resumindo a
tragédia do homem nestes dois versos:
Como quem foge à voz do
socorro divino, avança para a dor do seu próprio destino...
Bruno Seabra, o poeta
romântico, entrega-nos precioso poema - Primaveras da Amplidão -, em que nos
convida a escutar-lhe a exaltação do Plano Espiritual: Brilham paramos de sonho
além, no espaço risonho, vestidos de paz e luz!
Luís Guimarães Júnior, em
Pastoral, reafirma a beleza de Paisagem, Idade Média e tantos outros sonetos da
altura de Volta à Casa Paterna. São tantos os poetas, que se nos torna difícil
- e porque não dizer - impossível, citá-los todos.
Estamos convencido de que o
leitor fará alegremente o cotejo que o respeito ao tempo dele mesmo não nos
permite.
Qual acontece com qualquer
antologista, embora não nos impressionemos com o pensamento pessimista de
Dudley Fitts, fizemos, no que diz respeito ao tema, escolha rigorosa das
poesias que nos foram confiadas pelos medianeiros desta obra. Ademais, diga-se
de passagem, os próprios Instrutores Espirituais, em diversas reuniões íntimas
de que participamos pessoalmente, na Comunhão Espírita Cristã, de Uberaba,
esclareceram-nos que muito antes das comunicações dos
poetas, realizaram, eles
mesmos, importante serviço de seleção, aconselhando-lhes enviassem ao mundo
somente mensagens consoladoras e construtivas. Isso porque alguns deles se
aproximaram dos médiuns com o propósito de ventilar as paixões deprimentes em
que de desregraram na vida terrestre, procurando fixar pensamentos contrários
aos preceitos da vida superior. A medida não se filia simplesmente a questões
de moral diante da arte; é que volvendo ao descontrole emotivo, de que muitos
poetas não se afastaram quando encarnados, prolongariam os próprios tormentos
por tempo indeterminado, em persistindo
nos temas passados, ao passo que, grafando impressões e conceitos edificantes,
receberão, a cada momento, vibrações de conforto e esperança, endereçados pelos
leitores e amigos que lhes absorvam as idéias luminosas. Convém ainda
considerar que,
mesmo depois de joeirado o
material, os benfeitores desencarnados encontraram poesias que julgaram
impróprias para este livro, de vez que poderiam suscitar estados mentais
angustiantes em determinadas criaturas. Como é fácil de perceber, os Mentores
Espirituais alimentam a preocupação de iluminar e consolar sempre. Aliás, em
análise aberta, é imperioso reconhecer que essa é a tarefa essencial da
Doutrina Espírita.
Quantos aos apontamentos
particulares, no texto, fomos quase que excessivamente lacônico, visando ao
aproveitamento de espaço, e, mesmo, fugindo a repetições desnecessárias, razão
porque não nos referimos a todas as figuras, imagens e fulgurações poéticas dos
versos estudados. As datas de nascimento e desencarnação retiramo-las de fontes
que reputamos idôneas, e, não raro, consultamos os familiares ou os
descendentes de vários dos poetas.
A bibliografia relaciona, na
maioria dos casos, apenas as obras poéticas. Otimismos aquelas em que os
autores vazaram pensamentos e diretrizes inteiramente contrários aos seus
pontos de vista atuais. Dos poetas Casimiro Cunha, Maria Celeste e João de Deus
incluímos a bibliografia mediúnica, além daquela que lhes assinala a obra
terrena.
O asterisco, à frente do
nome de cada comunicante, guarda a finalidade de orientar o leitor para a nota
de rodapé. Resolvemos colocar a notícia bibliográfica, em observação
infrapaginal, a fim de que os amigos desta Antologia, em estudando
primeiramente a vida do poeta, não venham a
quebrar o ritmo da leitura
do poema que, realmente, no fundo, se lhe erigirá em objeto de fundamental
atenção. Atendendo à mesma finalidade, resolvemos, ainda, colocar a numeração
das notas à margem esquerda, correspondentes aos números dos versos. Isso
facilitará o conhecimento integral da poesia, facultando ao leitor, com vagar,
o ensejo de ler os pequenos informes esclarecedores, quer no tocante à técnica
poética, que atinentes a algumas questões de linguagem ou a referências
espíritas.
Visando aos leitores não
afeitos às questões poéticas, explicamos em notas de rodapé as figuras de
estilo menos conhecidas, quase sempre nos valendo de transcrições de obras
especializadas.
Dividimos o livro em três
partes: a Parte I, com as poesias psicografadas pelo médium Francisco Cândido
Xavier; a Parte II, com as psicografadas pelo médium Waldo Vieira; a Parte III,
as que foram recebidas por ambos os médiuns, salientando-se que, nessa Parte
III, as poesias de números ímpares são devidas à mediunidade de Francisco
Cândido Xavier e as de números pares à mediunidade de Waldo Vieira. Com essa
providência aspiramos a mostrar a identidade de estilos do mesmo poeta, através
de dois medianeiros diferentes.
Além das três partes a que
nos referimos, traçamos breve POSFÁCIO, apresentando ligeiro escorço
biobibliográfico dos médiuns desta obra, ao lados dos respectivos retratos.
Quanto aos índices, preferimos colocá-los no início da obra, excetuando-se o
índice onomástico e bibliográfico, que se configura na parte final e que
relaciona a maioria das obras consultadas, guardando o objetivo de documentar-nos
as anotações.
Apresentamos os poetas por
ordem cronológica de desencarnação, nas partes em que se divide a obra.
Carvalho Júnior, desencarnado em 1879, vem em primeiro lugar, na Parte I;
Castro Alves, desencarnado em 1871, vem em primeiro lugar na Parte II; Cruz e
Souza, desencarnado em 1898, vem em primeiro lugar, na Parte III.
Propúnhamo-nos, a princípio, classificá-los pelas escolas literárias a que
pertenceram a três estéticas. Como enquadrá-los? Quer-nos parecer que a grande
maioria é de poetas simbolistas, a começar Cruz e Souza, e de neossimbolistas
ou penumbristas.
Fato curioso é que há
correspondentes, qual verificamos inicialmente, de todas as escolas que
vicejaram no Brasil e em Portugal, a partir do Romantismo. Encontramos aqui
respeitáveis corifeus e epígonos de diversas escolas, figuras quais Martins
Júnior, o principal poeta do realismo brasileiro, que antecedeu o nosso
Parnasianismo, Raimundo Correia, Francisca Júlia e Júlia Cortines - esta última
definida como sendo, entre os demais epígonos da criação parnasiana em nosso
País, uma das expressões mais altas -, além de continuadores menores de Leconte
de Lisle. Representando a poesia modernista, temos um Rodrigues de Abreu e um
Caetano Pero Neto, do grupo dos novíssimos, inclusive Arsênio Palácios e outros
nomes de elevado gabarito.
Interessante destacar a
presença dos chamados príncipes dos poetas, a saber: Durval de Morais, dos
baianos; Zeferino Brazil, dos gaúchos, e Jorge de Lima, dos alagoanos. Com
alusão ao Princípie dos Poetas Gaúchos, aliás, cabe uma referência toda
especial. É que Zeferino Brazil foi um dos raros cronistas que tiveram a
coragem de afirmar categoricamente a identidade dos estilos dos poetas que
compareceram ao Parnaso de Além-Túmulo. Quando escreveu magnífica crônica sobre
o assunto, em 15 de Novembro de 1941, mal sabia que ele iria partilhar uma
antologia mediúnica, lançada algumas décadas depois do primoroso Parnaso.
Os poetas não se
identificaram, por óbvias razões, colocamo-los entre os demais autores, respectivamente
nas Partes I, II e III.
Aparecem fatos notáveis, na
presente obra. Surgem poetas que defenderam a memória de seus companheiros,
como, por exemplo, Moacir Piza, após a desencarnação de Emílio de Menezes; os
que falaram à beira do túmulo de seus amigos, à feição de Ciro Costa, na
sepultura de Francisca Júlia; companheiros e discípulos valorizando-lhes as
obras, qual acontece entre Nestor Vítor, Cruz e Souza, Dario Veloso e tantos
outros simbolistas famosos.
As poesias foram recebidas
pelos médiuns, em reuniões públicas e íntimas da Comunhão Espírita Cristã, em
Uberaba, nestes últimos dois anos, algumas em circunstâncias dignas de reparo.
Em muitas reuniões, um mesmo poeta se comunicava por ambos os medianeiros. O
Espírito de Cornélio Pires valeu-se algumas vezes desse recurso. De outras
vezes, dois poetas se comunicavam, um após outro, pelo mesmo médium, revelando
segurança perfeita e notável independência.
Fato digno de nota, nesta
Antologia, é a predileção dos comunicantes pelo soneto. Isso é muito importante
para nós, os brasileiros que não chegamos a satisfazer-nos plenamente com a
poética modernista, existindo mesmo, entre nós, acentuada tendência para a
volta ao classicismo, qual observou Adonias Filho, com muita propriedade, em O
Clássico Drummond. Falando de Claro Enigma, como sendo um livro clássico,
afirma: Após tantos anos de avanço regular, de experiência através de algumas
gerações, o modernismo fecha o seu ciclo como se fecharam outros ciclos.
Fecha-se sob uma atmosfera clássica, e, para ilustrar essa fisionomia clássica
do modernismo brasileiro, nenhum outro poeta melhor que Drummond e livro algum
mais oportuno que Claro Enigma. E conclui:
Se o problema é o de
determinar um novo tempo lírico, não sei. O que sei, e essa nova leitura de Claro
Enigma ainda mais me convence, é que o modernismo brasileiro atingiu o ciclo
final em seu círculo poético. Vive, neste momento, a sua fase clássica.
Semelhantes considerações
impelem-nos a recordar a palavra do crítico espanhol Ricardo Gullón sobre a poética
de Jorge Guillén, conforme citação de Eduardo Portella: Guillén se mantém
sempre vinculado ao real, mas também ao consciente. É um poeta de estirpe
clássica. Aqui, igualmente, os poetas desencarnados se mostram extremamente
adstritos à realidade, mas também à consciência, entesourando valores e lavores
clássicos da mais alta linhagem.
Aliás, antes de Adonias
Filho, outro crítico referindo-se ao vislumbre de novos rumos na Poesia
Brasileira, em artigo publicado no Suplemento Literário do Diário de Minas,
após demonstrar que a orientação seguida pelos renovadores de 1922 é hoje
anacrônica e superada, explica, com justeza de conceituação, que cuidam pouco
entre nós do problema conteúdo e forma, embora não seja esta uma questão nova e
apesar de ter sido reatualizada no Brasil por força mesmo da situação atual da
poesia brasileira. Vivemos exatamente um período de esgotamento de um clima
literário determinado - marcado pelo formalismo - em que todos sentem a
necessidade da procura de um novo rumo.
Entre os admiráveis sonetos,
não faltaram aqueles mestres da redondilha maior, alguns troveiros de valor
que, encarnados, por certo pertenceriam à Academia Brasileira de Trova.
Outro fato digno de menção.
Quase todos os poetas nos trouxeram produções de caráter superior às que
deixaram no plano físico. Ao que parece, foi Djalma Andrade quem primeiro
observou isso, falando sobre alguns poetas que ele reconhecera e que figuram no
Parnaso. Apesar disso, não se apoquentam mais por se afastarem, vez por outra,
dos ditames rígidos da forma fixa, qual observará o próprio leitor em algumas
nótulas de rodapé. É que, desencarnados, compreendem os poetas quão inútil o
apego excessivo à forma, com prejuízo da essência. Por isso mesmo, voltam,
agora, com um parnasianismo
construtivo, sublimado, bem diferente daquele de Gautier:
L'oeuvre sort plus belle
d'une forme au travail rebelle, vers, marbre, onyx, émail ou daquele de Bilac:
Invejo o ouvires quando escrevo: Imito o amor com que ele, em ouro, o
alto-relevo faz de uma flor.
Nem tão-pouco chegam ao
exagero de repetir a cantiga do sapotaneiro de Manuel Bandeira: Vede como primo
em comer os hiatos! Que arte! E nunca rimo os termos cognatos.
Enriquecidos pelo
conhecimento superior da Doutrina Espírita, não se prendem à beleza formal
tão-somente, atendo-se mais à excelência do fundo, como que a evidenciar que o
conceito de arte pela arte persiste, mas sob novas diretrizes temáticas, graças
ao influxo, sem dúvida, de novas
vivências.
Evitando a prolixidade,
limitamo-nos a fazer pequenas transcrições de poesias da obra terrena dos
poetas, deixando que o leitor consulte os poemas integrais nas fontes de
origem.
E há de maravilhar-se,
naturalmente.
Em alguns casos - e são
muitos deles assim - verá que os poetas comprometidos com a Lei de Causa e
Efeito, por escritos pouco edificantes que deixaram na Terra, voltaram com
poemas que são respostas autênticas a todas as dúvidas que lhes acicatavam as
almas de desesperançados,
atualmente em luta
respeitável para dissipar as nuvens de sombra forjadas por eles mesmos.
Só por isso, aliás, teria
esta Antologia um valor inestimável. A tentativa de anular os males que
estendemos pela palavra escrita em novas existências consagradas à palavra
escrita, às vezes com reduzido resultado, conseguem os poetas desencarnados
começá-la desde agora, antes de novo renascimento na Terra, atraindo as
vibrações de encorajamento e simpatia de que todos somos necessitados para a
ascensão do espírito.
Antes que terminemos nossas
modestas considerações, queremos agradecer a quantos colaboraram para a
consecução da presente obra, principalmente os que se desempenharam na busca às
fotografias dos vates que figuram aqui, e os que nos facilitaram a obtenção de
alguns dados bibliográficos.
Não temos a ousadia de
afirmar que esta obra se ache escoimada de senões. Tudo fizemos, porém, para
que se reduzissem ao mínimo, a fim de que o leitor, em lhe recolhendo os
magníficos versos, chegue, mais uma vez - e isso sem qualquer ideia de
proselitismo da nossa parte -, à conclusão de que precisamos estudar Allan
Kardec, qual o fizeram os poetas redivivos nestas páginas que nos levantam o
raciocínio e reconfortam o coração.
Elias Barbosa
(Uberaba, 3 de Outubro de 1962)
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