ESTÊVÃO, O
PRIMEIRO MÁRTIR DO CRISTIANISMO
Estêvão foi o nome adotado
por Jeziel quando se converteu ao Cristianismo.
Judeu helenista de Corinto,
era filho de Jochedeb e irmão de Abigail, futura noiva de Saulo de Tarso.
Emmanuel: Paulo e Estêvão. Primeira parte. Cap. 2.
No ano de 34, os judeus que viviam em Corinto — cidade incorporada ao Império Romano — sofreram atormentada perseguição conduzida pelo Precônsul Licínio Minúcio, preposto de César, na província de Acaia, que culminou com o assassinato de Jochebed, prisão e encaminhamento de Jeziel a trabalho forçado nas galeras (galés) romanas. Abigail fugiu para Jerusalém, mantida sob a proteção do casal Zacarias e Ruth, que a adotou como filha. Emmanuel: Paulo e Estêvão. Primeira parte. Cap. 2.
·
Libertado do serviço forçado pelo generoso
romano Sérgio Paulo, Jeziel chega extremamente enfermo a Jerusalém onde é
acolhido por Simão Pedro na “Casa do Caminho”, instituição de auxílio aos
necessitados, fundada pelo apóstolo. Emmanuel: Paulo e Estêvão. Primeira parte.
Cap. 3.
·
Estêvão foi um dos mais destacados cristãos
nos primeiros tempos da edificação da igreja cristã. Um “Espírito cheio de
graça e de poder que operava prodígios e grandes sinais entre o povo” (Atos dos
Apóstolos, 6:8).
1. Dados biográficos de Estêvão
Estêvão era um judeu
helenista, nascido na cidade de Corinto, província de Acaia, dominada pelos
romanos.
A cidade, reedificada por
Júlio César, era a mais bela joia da velha Acaia, servindo de capital à formosa
província. Não se podia encontrar, na sua intimidade, o espírito helênico em
sua pureza antiga, mesmo porque, depois de um século de lamentável abandono , restaurando-a, o grande imperador
transformara Corinto em colônia importante de romanos, para onde ocorrera
grande número de libertos ansiosos de trabalho remunerador, ou proprietários de
promissoras fortunas. A estes, associara-se vasta corrente de israelitas e
considerável percentagem de filhos de outras raças que ali se aglomeravam,
transformando a cidade em núcleo de convergência de todos os aventureiros do
Oriente e do Ocidente.
Descendente da tribo de
Issacar, Estêvão se revelou, desde jovem, destacado estudioso das escrituras,
apreciando, em especial, os ensinamentos de Isaías que anunciavam a promessa da
vinda do Messias. A sua vida foi marcada por grandes sacrifícios e renúncias,
sobretudo quando se converteu ao Cristianismo. A partir deste momento, Jeziel
rompe definitivamente com as tradições do Judaísmo, adotando o pseudônimo de
Estêvão, o primeiro mártir do movimento cristão.
Possuidor de personalidade
envolvente, Estêvão “cheio de graça e de força, operava grandes prodígios e
sinais entre o povo” (Atos dos Apóstolos, 6:8).
No ano de 34 d. C., os
habitantes de Corinto sofreram dolorosa perseguição do Procônsul romano,
Licínio Minúcio, que, cercado de grande número de agentes políticos
e militares e estabelecendo o terror entre todas as classes, com seus processos
infamantes.
Numerosas famílias de origem
judaica foram escolhidas como vítimas preferenciais da nefanda extorsão.
A família de Estêvão se
resumia ao pai Jochedeb e a irmã Abigail — que futuramente seria noiva de Paulo
de Tarso —, uma vez que a sua mãe era falecida. Essa família foi diretamente
atingida pela perseguição do preposto de César, quando o idoso Jochedeb foi
covardemente assassinado, Estêvão foi feito prisioneiro e atirado ao trabalho
forçado nas galeras (galés) romanas. Abigail fugiu para Jerusalém sob a
proteção de uma família judia, Zacarias e Ruth, também vítima de perseguição,
que teve os filhos mortos. Esse casal adotou a jovem irmã de Jeziel como uma
filha querida.
Estêvão, ou Jeziel,
enfrentou com coragem e grande fortaleza moral as provações que a vida lhe
reservara. Nas galés romanas o valoroso seguidor do Cristo foi submetido às mais
ásperas privações, mas, estoicamente, tudo suportou, jamais perdendo a fé em
Deus.
Voltando de Cefalônia, a
galera recebeu um passageiro ilustre. Era o jovem romano Sérgio Paulo, que se
dirigia para a cidade de Citium, em comissão de natureza política. Dada à
importância do seu nome e o caráter oficial da missão a ele cometida, o
comandante Sérvio Carbo lhe reservou as melhores acomodações.
Sérgio Paulo, entretanto adoeceu
com febre alta, abrindo-se-lhe o corpo em chagas purulentas. O médico de bordo não
conseguiu explicar a enfermidade e os amigos do enfermo começaram a retrair-se
com indisfarçável escrúpulo. Ao fim de três dias, o jovem romano achava-se
quase abandonado. O comandante, preocupado por sua vez, com a própria situação
e receoso por si mesmo, chamou Lisipo [feitor da galera], pedindo-lhe que
indicasse um escravo dos mais educados e maneirosos, capaz de incumbir-se de
toda assistência ao parceiro ilustre. O feitor designou Jeziel, incontinenti,
e, na mesma tarde, o moço hebreu penetrou o camarote do enfermo, com o mesmo
espírito de serenidade que costumava testemunhar nas situações díspares e
arriscadas.
Estêvão cuidou do romano com
extremada dedicação, conquistando-lhe a simpatia. Entre ambos estabeleceu-se
laços de amizade sincera, de sorte que usando do prestígio político que possuía,
Sérgio Paulo obteve a libertação do seu dedicado enfermeiro, fazendo-o aportar
em Jerusalém.
Estêvão chegou em Jerusalém
extremamente enfermo, pois contraíra a estranha doença que atingira o seu
libertador. Um desconhecido, denominado Irineu de Crotona, encaminhou a Efraim,
um cristão, conhecido como seguidor do “Caminho” (designação primitiva do
Cristianismo) que, por sua vez, o conduziu à “Casa do Caminho”, moradia do
apóstolo Pedro, transformada em local de atendimento a todos os necessitados.
Na Casa do Caminho, Estêvão
recebeu o amparo que necessitava, encontrando no apóstolo Pedro um verdadeiro
amigo, que lhe prestou esclarecimentos a respeito de Jesus e da sua iluminada
mensagem de amor.
O valoroso Simão Pedro, após
tomar conhecimento do drama vivido por Jeziel, desde a perseguição ocorrida em
Corinto até a liberdade alcançada por intercessão de Sérgio Paulo,
recomenda-lhe manter-se em anonimato, afirmando:
Jerusalém regurgita de romanos e não seria justo comprometer o generoso amigo que te restituiu à liberdade.
— Serás meu filho, doravante — exclamou Simão num transporte de júbilo.
— Para que não te esqueças da Acaia, onde o Senhor se dignou de
buscar-te para o seu ministério divino, eu te batizarei no credo novo com o
nome grego de Estêvão.
A partir desse momento,
Estêvão absorveu-se no estudo dos ensinos do Cristo, participando da difusão
da mensagem da Boa Nova na modesta moradia da Casa do Caminho, cujos serviços
de alimentação, enfermagem e de semeadura da palavra divina cresciam
celeremente.
Com a ampliação dos serviços
prestados à comunidade, surgiu, então, a necessidade de dividir as tarefas,
evitando que um servidor ficasse mais sobrecarregado que outro.
Na primeira reunião da
Igreja humilde, Simão Pedro pediu, então, nomeassem sete auxiliares para o
serviço de enfermarias e dos refeitórios, resolução que foi aprovada com geral
aprazimento. Entre os sete irmãos escolhidos, Estêvão foi designado com a
simpatia de todos.
Começou para o jovem de
Corinto uma vida nova. Aquelas mesmas virtudes espirituais que iluminavam a sua
personalidade e que tanto haviam contribuído para a cura do patrício, que o
restituíra à liberdade, difundiam entre os doentes e indigentes de Jerusalém os
mais santos consolos.
Simão Pedro não cabia em si
de contente, em face das vitórias do filho espiritual. Os necessitados tinham a
impressão de haver recebido um novo arauto de Deus para o alívio de suas dores.
Em pouco tempo, Estêvão
tornou-se famoso em Jerusalém, pelos seus feitos quase miraculosos. Considerado
o escolhido do Cristo, sua ação resoluta e sincera arregimentara, em poucos
meses, as mais vastas conquistas para o Evangelho do amor e do perdão.
2. Estêvão, o primeiro mártir do Cristianismo
Após a crucificação de Jesus
numerosos judeus se converteram ao Cristianismo. Os sacerdotes e membros do
Sinédrio, entretanto, temiam que a propagação dos preceitos cristãos provocasse
desestabilização no Judaísmo.
Sendo assim, iniciou-se um
movimento de perseguição aos cristãos, a princípio realizado portas adentro das
sinagogas, posteriormente em público, nas ruas e no interior das residências,
durante as festividades corriqueiramente, ou nas atividades diárias.
Vieram então alguns da
sinagoga chamada dos Libertos, dos Cirineus e Alexandrinos, dos da Cilícia e da
Ásia, e puseram-se a discutir com Estêvão. Mas não podiam resistir à sabedoria
e ao Espírito que o levavam a falar. Pelo que subornaram homens que atestassem:
“Ouvimo-lo pronunciar palavras blasfematórias contra Moisés e contra Deus”.
Amotinaram assim o povo, os anciãos e os escribas e, chegando de improviso,
arrebataram-no e levaram-no à presença do Sinédrio. Lá apresentaram falsas
testemunhas que depuseram: “Esse homem não cessa de falar contra o Lugar Santo
e contra a Lei. Ouvimo-lo dizer que Jesus Nazareno destruiria este lugar e
modificaria as tradições que Moisés nos legou”. Ora, todos os membros do
Sinédrio estavam com os olhos fixos nele, e viram-lhe o rosto semelhante ao de
um anjo.
Essa farsa montada contra
Estêvão, foi apoiada por Saulo de Tarso. O apóstolo dos gentios aparece no
cenário da história cristã como o principal elemento do julgamento, condenação
e morte, por apedrejamento, de Estêvão, considerado o primeiro mártir do
Cristianismo.
Esses fatos aconteceram no
ano 35 de nossa Era.
O jovem Saulo apresentava
toda a vivacidade de um homem solteiro, bordejando os seus trinta anos. Na fisionomia
cheia de virilidade e máscula beleza, os traços israelitas fixavam-se
particularmente nos olhos profundos e percucientes, próprios dos temperamentos
apaixonados e indomáveis, ricos de agudeza e resolução. Trajando a túnica do
patriciato, falava de preferência o grego, a que se afeiçoara na cidade natal,
ao convívio dos mestres bem-amados, trabalhados pelas escolas de Atenas e
Alexandria.
Chegando a Jerusalém, vindo
de Damasco, Saulo se encontra com o amigo Sadoque que lhe fornece informações a
respeito de Estêvão e o efeito que este provocava nas pessoas. Cheio de zelo
religioso, interpreta equivocadamente as preleções de Estêvão, considerando-o
blasfemador. Influenciando o espírito de Saulo, acrescenta:
— Não me conformo em ver os
nossos princípios aviltados e proponho-me a cooperar contigo, para
estabelecermos a imprescindível repressão a tais atividades. Com as tuas
prerrogativas de futuro rabino, em destaque no Templo, poderás encabeçar uma
ação decisiva contra esses mistificadores e falsos taumaturgos.
Tempos depois, num sábado,
Saulo e Sadoque se dirigem até a humilde igreja de Jerusalém para ouvirem a
pregação de Estêvão. Os apóstolos “Tiago [Maior], Pedro e João surpreenderam-se
com a presença do jovem doutor da Lei, que se popularizara na cidade pela sua
oratória veemente e pelo acurado conhecimento das Escrituras”.
A despeito de ter ficado
impressionado com a pregação de Estêvão, Saulo interpela o expositor, por meio
de ríspida conversa, na tentativa de desacreditá-lo perante a assembleia.
Estêvão, porém, manteve-se sereno, respondendo com gentileza e firmeza os
apartes do doutor da Lei.
Desse momento em diante
destacam-se, nas sinagogas, os de- bates religiosos entre Saulo, o orgulhoso
fariseu, e Estêvão, o humilde e iluminado cristão.
Gamaliel, o generoso e
brilhante rabino, orientador de Saulo, sempre presente aos debates, contribuía
com palavras ponderadas, buscando acalmar os ânimos.
Inconformado com as serenas
proposições de Estêvão, Saulo perturbou-se, e, deixando levar-se pelo orgulho,
denunciou Estêvão ao Sinédrio, onde montou um ardiloso esquema de condenação
com apoio de amigos.
Durante o julgamento, a
defesa de Estêvão no Sinédrio foi brilhante, revelando a grandeza do seu
Espírito. Teve oportunidade também de demonstrar o domínio que possuía das
Escrituras, discursando com serenidade e segurança (Atos dos Apóstolos,
7:11-54).
Foi, entretanto, implacavelmente
julgado e condenado à morte por apedrejamento, homicídio aprovado por Saulo
(Atos dos Após- tolos, 7:55-60). Mesmo sendo acusado de blasfemador, caluniador
e feiticeiro Estêvão manteve-se firme até o final, quando entregou sua alma a
Deus.
Nessa hora suprema,
recordava os mínimos laços de fé que o prendiam a uma vida mais alta. Lembrou-se
de todas as orações prediletas da infância. Fazia o possível por fixar na
retina o quadro da morte do pai supliciado e incompreendido. Intimamente,
repetia o Salmo 23 de Davi, qual fazia junto da irmã, nas situações que
pareciam in- superáveis. “O Senhor é meu pastor. Nada me faltará...” As
expressões dos Escritos Sagrados, como as promessas do Cristo no Evangelho,
estavam-lhe no âmago do coração. O corpo quebrantava-se no tormento, mas o
Espírito estava tranquilo e esperançoso.
Antes de emitir o último
suspiro, Estêvão perdoa Saulo e os de- mais perseguidores, adentrando vitorioso
no mundo espiritual. Para o futuro Apóstolo dos Gentios, entretanto,
iniciava-se a sua via crucis, marcada por uma dor extrema: acabara de
perseguir, condenar e aprovar a matança do irmão de Abigail, o seu amor
adorado. Compreendeu, assim, que os seus sonhos conjugais e familiares estavam
definitivamente comprometidos.
Fonte: Estudo aprofundado da doutrina espírita. FEB, 2013.
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