Perfume derramado sobre a cabeça de
Jesus
(Marcos,
14:1-9)
1.
Tendo acabado de proferir todos esses discursos, disse Jesus a seus discípulos:
2. Sabeis que daqui a dois dias se celebrará a Páscoa e o Filho do homem será
entregue para ser crucificado. 3. A esse tempo reuniram-se os príncipes dos
sacerdotes e os anciães do povo na sala do sumo pontífice chamado Caifás, 4, e
se consultaram para se apoderarem de Jesus à traição e lhe tirarem a vida. 5.
Mas, diziam: Durante a festa, não, para que não se suscite algum tumulto entre
o povo. 6. Ora, estando Jesus em Betânia, na casa de Simão o leproso, 7,
aproximou-se dele uma mulher trazendo um vaso de alabastro com precioso perfume
e lho derramou sobre a cabeça, quando estava à mesa. 8. Vendo isso, seus
discípulos se indignaram e disseram consigo: Para que este desperdício? 9. Esse
perfume podia ser vendido por bom dinheiro, que se daria aos pobres. 10.
Percebendo neles este pensamento, disse-lhes Jesus: Por que molestais a esta
mulher, que no que fez comigo praticou uma boa obra? 11. Pobres, tê-los-eis
sempre convosco, ao passo que nem sempre me tereis a mim. 12. Derramando sobre
o meu corpo este perfume, ela o ungiu para ser sepultado. 13. Em verdade vos
digo que, onde quer que, no mundo inteiro, for pregado este Evangelho, narrado
também será, em sua memória, o que esta mulher acaba de fazer.
De novo, neste passo, a seus
discípulos anunciou Jesus “sua morte”, segundo a maneira de ver dos homens, e
também a sua crucificação. Aquela mulher foi, por influência espírita, induzida
a fazer o que fez, porque o seu ato se prestava a pôr em relevo a presciência
do Mestre, quanto a essa “morte” e a essa crucificação, pois que, ao
verificar-se o acontecimento predito, todos se lembrariam daquele ato e das
palavras que Ele proferira com relação ao futuro.
Quebrando o vaso de
alabastro, cheio de precioso perfume, e derramando-o sobre a cabeça de Jesus,
rendia ela uma homenagem ao Senhor. Ainda cegos pela matéria os discípulos só
compreendiam os fatos materiais. O Mestre procurava sempre fazer que os
compreendessem sob o aspecto espiritual. A escolha de um perfume para essa
lição obedeceu à razão de que, pela natureza essencial dos perfumes, eles dão a
ver que os sacrifícios que se hajam de praticar, tendo-se em vista o Espírito,
não devem ser buscados unicamente nas coisas de ordem material, mas também nas
de ordem espiritual.
Fora um ato de amor e desinteresse, o daquela mulher, e, portanto, um sinal de ascendência do Espírito sobre a matéria.
Pobres,
tê-los-eis sempre convosco, ao passo que nem sempre me tereis a mim,
disse Jesus, aludindo, pelo que lhe tocava, ao seu aparecimento na Terra, aos
tempos e à duração desse aparecimento, para o desempenho da sua missão terrena.
Aludia também à duração da sua vida humana ao ver dos homens.
Falando dos pobres da Terra,
referia-se preferentemente aos que se encontram num estado de inferioridade
qualquer, aos que, sobretudo, o são moral e intelectualmente. Nos planetas
inferiores, como o nosso, sendo a pobreza, tanto material, como moral, uma
efetivação de provas, sempre haverá pobres de uma e outra categoria; enquanto
não se ache concluída a separação dos bons e dos maus. Cumpre, porém, notar que
da elevação de um planeta não decorre o nivelamento das faculdades.
Entre
nós, sempre haverá pobres, ainda quando hajam do nosso mundo
desaparecido a pobreza material e a pobreza moral. Qualquer que seja o grau de
depuração do planeta terreno, nele haverá sempre, entre os Espíritos depurados,
que o habitarão, muitos menos adiantados do que outros. Esses são os
intelectualmente pobres, aos quais os ricos em inteligência, em saber, darão
com abundância o que possuem. Não devemos esquecer que, como o dizem os
Evangelistas na obra a que nos reportamos para a elaboração desta, que, do
ponto de vista intelectual, há sempre, entre os Espíritos, hierarquia, no
tocante à ciência universal, mesmo quando todos tenham atingido a perfeição
moral.
Não devemos esperar que
deixe de existir na Terra a pobreza material, enquanto não desaparecerem,
dentre nós, todas as enfermidades morais, de que temos de curar-nos, renascendo
multiplicadas vezes. Despojemo-nos, portanto, dos nossos vícios, quer advenham
da carne, quer do Espírito, que deve dominar a matéria, pois, do contrário,
talvez os ricos de hoje venham a ser os pobres de amanhã.
O desaparecimento, a
cessação completa da pobreza material, de maneira que cada um viva folgadamente
do seu labor, será um sonho, enquanto a nossa depuração moral não nos houver
suavizado as futuras expiações. Por aí se vê quão ilusórias são as pretensões,
que muitos alimentam, de tornar partilhadas igualmente por todos as riquezas,
mediante revoluções, transformações políticas, ou mediante ainda a decretação
de legislações especiais, cujos efeitos serão contraproducentes, desde que,
longe de contribuírem para estabelecer a fraternidade humana, somente concorrem
para acirrar entre os homens os ódios, que os separam e inimizam.
As associações e
instituições de beneficência, já existentes em todos os países, são boas,
porque provam em muitos o desejo de fazer o bem, de socorrer os seus irmãos.
Mas, sem desprezarmos os socorros materiais, esforcemo-nos por socorrer o moral
dos homens, porque, expulsa do nosso planeta a miséria moral, terá nele cessado
a miséria material. Quando isso ocorrer, as criaturas humanas, prestando-se
mútuo e esclarecido auxílio, trabalharão todas em comum, na obra também comum.
Quão longe, porém, ainda está essa bendita era, em que havemos de entrar um
dia!
Preparemo-nos, nada
obstante, para ela, empregando com esse objetivo todos os nossos esforços,
organizando, sob o influxo de sentimentos de humildade e desinteresse, de
justiça, de amor e caridade, sociedades para o trabalho de ordem material, de
ordem moral e de ordem intelectual. Dêem os ricos abundantemente aos pobres,
levando cada um a tais associações o tributo das faculdades de que possam
dispor, a fim de que se espalhem e desenvolvam a educação e a instrução moral e
intelectual, que expliquem aos homens e lhes façam compreender: o amor a Deus
acima de tudo e ao próximo como a si mesmos, os modos e meios de praticar-se
esse duplo amor, de praticar-se, com observância da liberdade na ordem e da
ordem na liberdade, o máximo de mutualidade, de solidariedade, de fraternidade,
fonte e regra de todos os direitos e deveres, máximo que deverá consistir em um
por todos e todos por um, em todas as associações, de qualquer natureza que
sejam, em todas as esferas da atividade humana: individual, comum ou social.
(1)
(1) As narrativas, feitas
pelos quatro Evangelistas (MATEUS, 26, 6. MARCOS, 14, 3. LUCAS, 7, 36, JOÃO,
12, 3) do episódio em que figura uma mulher derramando perfume sobre a cabeça
de Jesus, apresentam diferenças que hão induzido a maioria dos intérpretes das
Sagradas Letras a admitir que o aludido episódio ocorreu em duas ocasiões
distintas e não uma única vez. Entre os intérpretes que assim pensam, está
Bittencourt Sampaio, como se pode ver das Notas que após ao Canto 12 da obra
Divina Epopeia, de sua lavra.
A esta observação aduzida em
nota às Elucidações Evangélicas pelo seu autor, cumpre acrescentemos, como seu
revisor, que também partilhamos da opinião dos que têm por dois, ocorridos em
circunstâncias diversas, o episódio de que se trata, conforme tivemos ensejo de
assinalar, em páginas anteriores deste volume, em nota aos comentários sobre os
versículos 36 a 50 do capítulo 7 do Evangelho de LUCAS, trecho que se encontra
subordinado à epígrafe Pecadora que banha de lágrimas os pés de Jesus e os
enxuga com seus cabelos.
Pacto de traição feito por Judas
Iscariotes com os príncipes dos sacerdotes. Lugar escolhido para a Páscoa
(Marcos,
14:10-16; Lucas, 22:1-13)
14.
Então um dos doze, chamado Judas Iscariotes, foi ter com os príncipes dos
sacerdotes, 15, e lhes disse: Que me quereis dar? Eu vo-lo entregarei.
Convencionaram dar-lhe trinta moedas de prata. 16. Desde então, Judas procurava
uma oportunidade para entregar Jesus. 17. Ora, no primeiro dia dos pães ázimos
vieram os discípulos a Jesus e lhe perguntaram: Onde queres que preparemos o
que é preciso para comermos a Páscoa? 18. Respondeu-lhes Jesus: Ide à cidade, a
casa de um tal homem e dizei-lhe: O Mestre te manda dizer: O meu tempo está
próximo; em tua casa celebrarei a Páscoa com os meus discípulos. 19. Os
discípulos fizeram como Jesus lhes ordenara e prepararam a Páscoa.
Aproximava-se o momento de
se cumprirem os fatos preditos, e Jesus, falando daquele modo aos discípulos,
confirmava as predições já feitas. Enviados por Ele, Pedro e João encontram o
homem que lhes fora indicado e tudo se passa como Ele anunciara. Esses fatos,
que se verificavam em Jesus, de presciência, de visão a distância, bem como a
influência oculta que concorria para que eles se produzissem, já ficaram
explicados, quando estudamos outros pontos já considerados.
Quanto à traição de Judas,
não resultou de uma predestinação. Aceitá-la como tal importaria em negar a
justiça de Deus.
Judas, que era um Espírito desejoso
de adiantar-se, mas orgulhoso e por demais confiante nas suas forças; pedira,
antes de encarnar, lhe fosse concedido participar da obra do Cristo, esperando
tirar dessa participação abundantes e preciosos frutos. Em vão seus guias lhe
fizeram ver os escolhos contra os quais iria chocar-se. A nada quis atender.
Jesus conhecia a Judas e lhe
aceitara o concurso. A lição terrível que o esperava fá-lo-ia sair afinal
purificado de todos os vícios que ainda o dominavam. Foi tendo em vista esse
futuro, patente a seus olhos, que o Mestre consentiu naquele ato de Judas, que,
além de orgulhoso, era invejoso e amante do luxo. Quantos e quantos Judas não
existem ainda neste mundo e quão tremenda é a expiação que os espera!
Os bons Espíritos nos dizem:
Queridos irmãos, desconfiai todos, todos sem exceção, de vós mesmos, pois que
estais sempre prontos a dar entrada a “Satanás”, ao “demônio” do orgulho e da
inveja, e muito prontamente sucumbis às suas sugestões. Guarde-vos o Senhor, porquanto
a queda é fácil, mas o reerguimento é terrível!“
Os discípulos, dizem os
Evangelhos, fizeram o que o Mestre lhes determinara, tudo se passou como lhes
fora dito e prepararam tudo para que Ele celebrasse a Páscoa com os doze,
portanto com Judas Iscariotes, também, o qual, sabia-o Ele, o havia de trair.
E, com efeito, celebrou com seus discípulos aquela festa, não numa sinagoga ou
num templo construído pelos homens, mas num amplo cenáculo todo mobilado. Como cumpria acontecesse, tal festa, a
ceia pascal, serviu, sob o império e o véu da letra, de base a um culto
exterior. Em espírito e verdade,
porém, foi um ato puramente espiritual, emblemático, cujo sentido, alcance e
aplicações em seguida veremos.
A vida de Judas demonstra
até que extremo funesto pode o orgulho obstinado levar a criatura que se
exalta, julgando-se capaz de tudo, pelo seu saber e pelo seu poder. Faz,
entretanto, manifesta, ao mesmo tempo, a justiça e a misericórdia de um Deus,
cuja mão paternal está sempre pronta a estender-se para o filho indócil, a fim
de o levantar da queda, que lhe deve servir de lição.
Com efeito, Judas, tendo
falido no desempenho da missão que pedira, por ser esta superior às suas
forças, achou, pela infinita bondade de Deus, meio de se erguer e regenerar no
crisol do arrependimento, do remorso, da expiação, da reparação, do tempo, do
progresso, de forma a reaver o seu lugar entre os servidores fiéis e devotados
de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Quando recebia os
ensinamentos que acabamos de resumir, o médium, que servia de instrumento à
transmissão deste conjunto de revelações que nos iluminam o carreiro por onde
chegaremos aos pés do Nosso Senhor e Mestre, escreveu inopinadamente as duas
comunicações que se seguem e que constituem grandiosas lições, fontes de
esperança e de coragem para todos, a todos ensinando que, por maior que seja o
crime, ou a falta da criatura, jamais é tão grande quanto à bondade de Deus.
São estas as comunicações:
“Oh! como é grande esse Deus que permite que o filho culpado encontre, na sua
própria indignidade, o “ponto de apoio que o ajudará a subir para a perfeição!
Oh! quanto é bom aquele que está sempre pronto a perdoar ao que sinceramente se
arrepende, que pensa com suas mãos benfazejas as chagas dos nossos corações
culpados, que nelas derrama o bálsamo da esperança e as cicatriza com o auxílio
da expiação!
“Bendito sejas tu, meu Deus!
JUDAS ISCARIOTES. O amor do Senhor se estende por sobre todas as suas
criaturas. Vinde, pois, a Ele, cheios de confiança. Não são os inocentes os que
precisam de perdão. Não são os fortes os que precisam de amparo. Vinde, filhos
que chorais as vossas faltas, o Senhor vos enxugará as lágrimas. Vinde, filhos
fracos e enfermos, o Senhor vos dará parte maior e mais ativa do seu amor.
Vinde confiantes. Como vós, também nós falimos. Como vós, também fomos
culpados, amargamos as nossas faltas e expiamos os crimes que cometêramos e as
fraquezas que nos fizeram sucumbir, por meio de longo e penoso labor numa série
extensa de existências humanas, que prepararam e realizaram a nossa purificação,
graças à qual o Senhor nos admitiu a gozar da sua alegria”.
“Imitai-nos, portanto,
irmãos bem-amados. Todos tendes, mais ou menos, o que expiar, tendes que pedir
perdão. Vinde com confiança aos pés do vosso pai, confessai vossas faltas
perante o seu tribunal. O juiz é reto, o juiz é justo, mas também é pai. Sua
indulgência há de sempre prevalecer sobre a sua justiça; suas sentenças Ele as
profere sempre dentro dos limites das vossas forças. É Credor paciente e
brando; esperará que possais pagar a vossa dívida”.
“Oh! vinde! Possa a mão que
vos estendemos sustentar-vos, fazendo-vos compreender que em nós achareis
grandes tesouros de amor. Judas, é hoje um espírito regenerado no crisol do
arrependimento, do remorso, da expiação, da reencarnação e do progresso.
Tornou-se um dos auxiliares humildes, ativos e devotados do Cristo. Este
exemplo vos mostra que não deveis nunca repelir QUALQUER de vossos irmãos e
ainda menos excluí-lo da paz do Senhor”.
JOSÉ
DE ARIMATÉIA. SIMÃO DE CIRENE. Assistidos pelos Apóstolos MATEUS, MARCOS,
LUCAS, JOÃO
Ceia pascal. Jesus prediz a traição de
Judas
(Marcos,
14:17-26; Lucas, 22:14-23)
20.
Chegada que foi a tarde, Jesus se sentou à mesa com seus doze discípulos. 21.
E, enquanto estes comiam, disse: Em verdade vos digo que um de vós me trairá.
22. Os discípulos, profundamente contristados, começaram um a um a
perguntar-lhe: Serei eu, Senhor? 23. Respondeu ele: O que comigo põe a mão no
prato, esse é o que me entregará. 24. O Filho do homem, na verdade, vai,
conforme ao que está escrito a seu respeito, mas ai daquele por quem o Filho do
homem será entregue! melhor lhe fora não haver nascido. 25. Então Judas, o que
o traiu, lhe perguntou: Mestre, sou eu? Respondeu-lhe Jesus: Tu o disseste. 26.
Estando todos a comer, Jesus pegou do pão, o abençoou, partiu e deu aos
discípulos, dizendo-lhes: Tomai e comei: isto é o meu corpo. 27. E, tomando do
cálice, rendeu graças e o passou aos doze, dizendo: Dele bebei todos. 28. Este
é o meu sangue, o sangue da nova aliança, que por muitos será derramado para
remissão dos pecados. 29. Digo-vos que desta hora em diante não mais tornarei a
beber deste fruto da vide, até ao dia em que o beberei de novo convosco no
reino de meu pai. 30. E, entoando o cântico de ação de graças, saíram para o
monte das Oliveiras.
Jesus baixou ao convívio de
seus discípulos, para lhes dar ensinamentos verbais, capazes de os
impressionar, tendo sempre o cuidado de ligar esses ensinos aos fatos e às
tradições do Antigo Testamento. Não voltará a nós, senão quando a semente que
plantou e que vem germinando há longos séculos se tenha tornado árvore
carregada de frutos. Quer isto dizer que não voltará, visível aos homens, senão
quando houvermos atingido tal grau de desenvolvimento, que lhe seja possível
manifestar-se na plenitude da sua natureza espiritual.
A Páscoa é um símbolo; nada
mais que um símbolo. É o selo aposto pelo Mestre aos ensinamentos que
ministrava pela palavra. É a confirmação da lei de amor e da união que deve
reinar entre os homens. Ë o derradeiro e solene apelo por Ele feito à prática
dessa lei e dessa união, portanto, à fraternidade universal. Ë a comunhão a que
convidou e convida os homens, servindo-se dos emblemas do pão e do vinho, aos
quais comparou o seu corpo e o seu sangue.
Assentados todos à mesa do
festim, todos temos que nos servir igualmente do mesmo alimento e que beber
pelo mesmo cálice, O pão tem que ser o mesmo para todos, pois que o sacrifício
do Salvador se verificou para servir de exemplo a todos; o vinho a todos os
sequiosos tem que dessedentar, visto que seu “sangue” o Salvador o derramou por
todos.
Devemos fazer com os nossos
irmãos transviados o que Jesus fez com o duodécimo discípulo, a ovelha
desgarrada, que mais tarde o bom-pastor carregaria aos ombros e reconduziria ao
aprisco. Embora soubesse que ele o havia de trair, que era um discípulo
prevaricador, o Mestre permite que Judas se sente à mesa com os onze discípulos
fiéis, que partilhe com estes do mesmo alimento e beba pelo mesmo cálice, para
que escute, receba aquele último apelo. E, ao aproximar-se o momento de deixar
a Terra, não teve para o infiel, como para os que o insultavam e flagelavam,
senão uma palavra de perdão: Perdoa-lhes,
meu Pai; eles não sabem o que fazem.
O pão e o vinho nada mais
são que símbolos. Nunca Jesus pensou em dar-lhes uma aplicação material. Porém,
o que ocorreu tinha que ocorrer, pois que, para a matéria, só a matéria. Daí,
entretanto, não se segue permaneça o erro, que até agora foi mantido pela
rotina, pela cegueira, pela obstinação. Bom é consagrem os homens um dia a
recordar a ceia do Mestre com seus discípulos, à rememoração do devotamento
daquele modelo excelso que baixou até nós, para fazer que até Ele nos elevemos.
Os primeiros discípulos,
cumprindo a recomendação expressa nas suas derradeiras palavras, se reuniam
para, em comum, fazerem um repasto comemorativo do último em que com Ele haviam
tomado parte. Mais tarde, nas reuniões dos que lhes sucederam, cenas
escandalosas se deram. Em vez da fraternidade que devia reinar entre todos,
passou a imperar o orgulho. Os cristãos tiveram que pôr termo a tais abusos e
instituíram a “comunhão”, tendo por símbolos o pão e o vinho. Posteriormente,
as dificuldades e perigos, que havia, de se reunirem em grande número, os
levaram a instituir a comunhão dada pelo sacerdote aos discípulos que se
apresentavam para recebê-la. Essas transformações se foram operando
sucessivamente no curso das perseguições de que os cristãos eram vítimas em
Roma. Tiveram, como se vê, a sua razão de ser.
Se, depois, as palavras do
Mestre Fazei isto em minha memória tomadas à letra, deram lugar ao dogma da
“presença real”, da “transubstanciação”, causa de intermináveis controvérsias,
foi porque o homem se apega sempre à crosta superficial, sem cogitar da seiva
que a vivifica.
Devemos, sem dúvida,
comemorar a Ceia Pascal, em memória do Mestre, mas pela prece do coração,
apoiada em atos de uma vida íntegra, pura, humilde, ativa e consagrada ao bem
de todos os membros da grande família humana. Aquele que se julgue no dever de
aproximar-se do Senhor pelo ato ritualístico da comunhão, faça-o, porém, só
emprestando valor ao ato espiritual. Que se prostre, para isso, curvada a
fronte, aos pés do sacerdote, mas sem atentar no homem, nem se preocupar com a
matéria e sim elevando sua alma a Deus, lembrando-se das virtudes praticadas
pelo seu Enviado e escutando aquelas palavras suas Fazei isto em minha memória.
Cristãos, quem quer que
sejais romanos, gregos ou protestantes praticai o ato material comemorativo, se
as exigências do vosso coração, ou mesmo os hábitos da vossa infância a isso
vos impelem. Nunca, porém, o pratiqueis preocupados com a opinião dos homens.
Suportai, se for preciso, a censura injusta; mas, sejam puras as vossas ações,
ditem-nas a verdade e o amor.
Comemoremos a Ceia Pascal, vendo,
naquele que a ela presidiu, o Manso Cordeiro a ser imolado para salvação da
Humanidade inteira.
Comemoremo-la, com o mesmo
sentimento com que celebramos as nossas festas intimas; para expandir as
satisfações da nossa alma, para estreitar os laços do amor, da amizade que nos
ligam aos que nos são caros. Reunamo-nos com os nossos irmãos em torno de uma
mesa, simbolizando essa reunião a unidade em que devemos estar com Jesus,
idêntica à em que Ele se acha com o Pai que está nos céus, o seu Deus e nosso Deus
(JOÃO, capítulo 17, versículos 21 e seguintes); simbolizando a fraternidade que
nos deve prender uns aos outros, como filhos que somos do mesmo Pai.
Façamo-lo em perfeita
comunhão de crença e com o propósito de pautarmos os nossos pensamentos, palavras
e obras pela doutrina ensinada e exemplificada pelo Mestre divino, doutrina que
Ele simbolizou no pão que distribuiu a seus apóstolos; com o de tonificarmos os
nossos corações com o licor que Ele os fez beber, semelhante ao sangue que
verteu no Calvário, símbolo do seu amor sem limites, o qual, seiva vivificante
daquela doutrina, não se deteve ante o supremo sacrifício de imolar-se para nos
mostrar o caminho da redenção.
Se fizermos assim, em
espírito e verdade, a nossa comemoração, demonstraremos haver bem compreendido
as sagradas letras.
Predições de Jesus. Predição da negação
de Pedro
(Marcos,
14:27-31; Lucas, 22:31-38)
31.
Disse-lhes então Jesus: Para todos vós serei esta noite uma ocasião de
escândalo, pois está escrito: Ferirei o pastor e as ovelhas do rebanho se
dispersarão. 32. Mas, depois que eu haja ressuscitado, vos precederei na
Galiléia. 33. Disse-lhe Pedro: Ainda quando sejas para todos uma ocasião de
escândalo, nunca o serás para mim. 34. Replicou-lhe Jesus: Em verdade te digo
que, esta noite, antes que o galo cante, me negarás três vezes. 35.
Retrucou-lhe Pedro: Ainda que me seja preciso morrer contigo, não te negarei. O
mesmo disseram os outros discípulos.
Jesus dá a ver, de antemão,
a seus discípulos quão frágil é a vontade humana e quão pouco deve o homem
contar com as suas próprias forças. Dizendo a Pedro: Roguei por ti, mostra que
só na prece pode o homem encontrar amparo. Naquela ocasião, nenhum assim o
compreendeu, tanto que nenhum recorreu a esse cordial da alma, pelo que todos
faliram no momento do perigo. Foi uma lição que muito devemos aproveitar.
Nisto que também disse a
Pedro: Simão, Simão, satanás vos reclamou
a todos para vos joeirar, como se faz ao trigo, aludia à influência que,
sobre aquele apóstolo, exerceria o temor dos acontecimentos que poderiam
dar-se, aos maus pensamentos que lhe germinavam no coração e que, por vezes, o
faziam deplorar ter enveredado por tão perigoso caminho, pensamentos esses que,
embora fugazes, não escapavam à percepção do Mestre. Pedro compreendia que um
grande perigo os ameaçava, a eles e a Jesus, e a fraqueza humana lhe fazia
nascer no íntimo, de quando em quando, um vago sentimento de pesar, por se
haver exposto de tal modo.
Jesus no horto de Getsêmani. Palavras e
ensinamentos dirigidos aos discípulos. Ele ensina os homens a morrer, depois de
lhes haver ensinado a viver, objetivando o progresso do Espírito
(Marcos,
14:32-42; Lucas, 22:39-46)
36.
Em seguida foi Jesus com eles a um horto chamado Getsêmani e disse a seus
discípulos: Sentai-vos aqui, enquanto vou ali orar. 37. E, levando consigo
Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a se entristecer e angustiar. 38.
Disse-lhes então: Minha alma está numa tristeza mortal; ficai aqui e velai
comigo. 39. E, afastando-Se um pouco, se prostrou com o rosto em terra e entrou
a orar, dizendo: Meu Pai, se é possível, passa de mim este cálice; todavia, não
seja como eu quero, mas como o queiras tu. 40. Veio depois ter com seus
discípulos e, encontrando-os a dormir, disse a Pedro: Pois quê! não pudestes velar
comigo uma hora! 41. Vigiai e orai, a fim de não cairdes em tentação; o
espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca. 42. De novo se afastou
deles e segunda vez orou, dizendo: Meu Pai, se este cálice não pode passar sem
que eu o beba, faça-se a tua vontade. 43. Voltando outra vez a ter com eles,
novamente os achou dormindo, pois que tinham pesados de sono os olhos. 44.
Deixando-os, foi orar pela terceira vez, repetindo as mesmas palavras. 45. Em
seguida, veio ter ainda com os discípulos e lhes disse: Dormi agora e repousai;
eis que chegou a hora em que o Filho do homem será entregue às mãos dos
pecadores. 46. Levantai-vos, vamos; aproxima-se aquele que me há de entregar.
Jesus desceu até nós, para
nos ensinar a viver e a morrer, pelo que necessário lhe foi tomar um corpo de
aparência humana, a fim de que os homens o tivessem por um homem igual aos
outros. Tudo, pois, tinha que ser e foi, nos fatos, como nas palavras,
apropriado a essa crença.
A Getsêmani, lugar situado
numa das vertentes do monte das Oliveiras, levou Ele consigo os mesmos três
discípulos que o acompanharam ao Tabor, para assistirem à sua transfiguração e
à aparição de Elias e Moisés. Esses discípulos foram Pedro, Tiago e João, que
eram mais apropriados à manifestação espírita que se ia produzir, com
especialidade à aparição do anjo. (Vejam-se as elucidações do capítulo 17,
versículos 1 ao 9, de MATEUS.)
Dizendo-se possuído de
mortal tristeza, quis o Mestre significar aos discípulos e aos homens que,
pressentindo o que ia suceder, seu coração se enchia de amargura extrema pelas
tribulações a que se votavam aqueles a quem viera salvar. Recomendou-lhes que
ficassem ali, para testemunharem o que se ia passar, e que velassem com Ele,
para poderem narrar às gerações futuras o que presenciassem.
Prostrando-se e orando,
fê-lo para ensinar a submissão, a fé, a resignação e a vigilância sobre si
mesmo, com que o homem deve receber as tribulações e as provas, a fim de não
falir nestas, e mostrava o socorro que advém da prece, poderoso cordial da
alma.
Indo ter com eles três vezes
e três vezes repetindo-lhes a mesma coisa, quis gravar-lhes fortemente nos
corações e na memória aquelas palavras, que tinham de ser por eles citadas e
registradas pelos Evangelistas, a fim de atravessarem os séculos e chegarem a
todas as gerações humanas.
Se fosse Deus e quisesse que
os homens assim o considerassem, precisaria Jesus de pedir amparo? Não traria
em si mesmo toda a força de que pudesse necessitar?
Se as manifestações
espíritas são uma mentira e se Jesus era um homem igual aos outros, com uma
veste carnal igual a dos demais, como se há de admitir que um anjo se lhe haja
mostrado e aos três apóstolos? Nem se diga ter sido Ele quem da manifestação
deu notícia aos discípulos. Em tal caso, teria sido um impostor. Como, porém,
nada prova que o Mestre lhes haja falado de semelhante coisa, a manifestação
não houvera passado de uma invencionice dos discípulos. Mas, com que fim a
teriam eles forjado, uma vez que procuravam estabelecer uma divindade em que não
podiam deixar de crer, como o reconhecerá quem se coloque no ponto de vista dos
contraditores a quem nos referimos? A se lhes admitirem as objeções, forçoso
será se reconheça que tudo aquilo foi uma farsa e que todo o Evangelho é uma
fábula.
Vejam, porém, diante desse
dilema, não os que exploram a cegueira humana, nem os que monopolizam a
Ciência, ou vivem a compor facécias para divertir com futilidades os homens,
mas os que se interessam seriamente pelas coisas santas, os que creem e aspiram
à verdadeira bem-aventurança, vejam, dizíamos, a importância da ciência
espírita, a grandeza e sublimidade dessa revelação nova, que vem cumprir e não
destruir, que vem explicar e não rejeitar, que, pondo o Espírito no lugar da
letra, vem mostrar aos homens a origem e a natureza de Jesus, de que modo e em
que condições se deu o seu aparecimento na Terra.
Sendo puro Espírito, apenas
revestido de um corpo perispirítico, para ser visível aos terrícolas, Jesus
estava acima de todos os desfalecimentos e terrores humanos. Assim, com o que
disse e fez no Horto de Getsêmani, apenas deu aos homens um exemplo da
submissão, da perseverança e da fé que lhes cumpre demonstrar nas maiores
angústias. E que o exemplo foi grandemente eficaz e proveitoso, podemos
verificá-lo no espetáculo dos mártires, avançando para o suplício, sem
experimentarem, sequer, aquela agonia mortal de que falam os discípulos, com
referência ao Mestre, dando, com o que disseram, uma demonstração de quão
fortemente os abalou e impressionou a lição que receberam.
Versículos 45 e 46. Basta, disse o Mestre. A lição estava
dada aos apóstolos e aos que se dispusessem a lhes seguir os passos. O
ensinamento e o exemplo estavam dados a todos os homens. Só restava que estes
tirassem deles proveito.
A
hora chegou; levantai-vos, vamos. É preciso que os
acontecimentos de ordem material se cumpram.
Também para nós chegou a
hora. Despertemos do sono que há muito nos ganhou; levantemo-nos e vamos,
seguindo as pegadas do Mestre Divino, que é esse o caminho único da nossa redenção.
Beijo de Judas. Um dos que acompanhavam
a Jesus corta a orelha a um dos do séquito do sumo sacerdote e Jesus a cura.
Fuga dos discípulos
(Marcos
14:43-52; Lucas, 22:47-53; João, 18:1-12)
47.
Ainda ele não acabara de dizer isso, eis que chega Judas, um dos doze, e com
ele grande turba armada de espadas e varapaus, enviada pelos príncipes dos
sacerdotes e pelos anciães do povo. 48. Ora, o que o traia lhes havia dado um
sinal, dizendo: Aquele. em quem eu der um ósculo, esse é que é: prendei-o. 49.
E, aproximando-se de Jesus, disse: Salve, Mestre! e o beijou. 50. Jesus lhe
perguntou: Amigo, a que vieste? Logo avançaram outros, que se lançaram sobre
Jesus e o prenderam. 51. Um então dos que estavam com Jesus, levando a mão à
espada, a desembainhou e, brandindo-a contra um servo do sumo sacerdote, lhe
cortou uma orelha. 52. Jesus, porém, lhe disse: Embainha a tua espada, pois que
todos os que empunharem a espada à espada perecerão. 53. Acaso julgas que não
posso rogar a meu pai e que ele não me mandará imediatamente mais de doze
legiões de anjos? 54. Como, porém, se cumprirão as escrituras que declaram
dever ser assim? 55. E, no mesmo instante, dirigindo-se à turba, disse: Aqui
viestes armados de espadas e varapaus para me prender, como se eu fora um
ladrão. Entretanto, todos os dias, assentado entre vós, estava eu ensinando no
tempo e não me prendestes. 56. É que tudo isto acontece para que se cumpram as
escrituras dos profetas. Então todos os discípulos o abandonaram e fugiram.
Estes trechos apenas referem
fatos históricos que não reclamam comentários.
Juntamos aqui, às dos três
outros Evangelhos, com os quais unicamente nos temos ocupado, a parte
correspondente do de João, para darmos a narrativa integral dos fatos de que
tratamos, visto que as narrações evangélicas se completam e explicam umas pelas
outras.
Tudo o que se deu com
relação à prisão de Jesus, que de tudo quanto aconteceu sabia de antemão, assim
como com relação ao ato de Pedro contra Malco e à cura deste, constituiu um
exemplo de caridade, de paciência e de poder.
Pelo que concerne à queda
dos primeiros que avançaram para se apoderarem do Mestre, resultou de uma ação
fluídica exercida pelos Espíritos que o cercavam. Foi um fato semelhante aos
que hoje se podem observar nas sessões espíritas. A cura da orelha de Malco,
Jesus a operou, tocando-a. Cumpre notar que ela fora cortada, porem, não
decepada.
Quanto às palavras dirigidas
a Pedro: Embainha a tua espada, etc.,
encerram um ensinamento, que o Mestre nos ofereceu, mostrando que jamais
devemos defender-nos com violência, com armas materiais; que somente devemos
usar das armas morais: a paciência, a doçura, o amor e a caridade; que serão
punidos, segundo a lei de talião os que, usando de armas materiais, derem prova
de que lhe desprezam os ensinos, os exemplos, os mandamentos. Continham
igualmente uma advertência aos que, de futuro, se ririam e constituiriam
diretores da sua Igreja, dando-lhes a ver que nunca deveriam fazer deste mundo
um reino para si, empunhando armas materiais, como instrumentos de justiça
humana, ou de defesa contra os ataques exteriores.
O mancebo que seguiu a
Jesus, conforme dizem os Evangelistas, envolto num lençol, simbolizava a lei
antiga, que trazia consigo o emblema da morte. Detida no seu curso, ela se
despoja de suas insígnias e se mostra tal qual o Senhor a fez. Também nós nos
devemos despojar das insígnias da morte.
Estamos envoltos em fraudes,
maldades e vícios. Esse o lençol que nos cobre. Abandonemos esse invólucro
fúnebre, como o fez o mancebo de que falam os Evangelistas, nas mãos dos que
tentem embaraçar-nos os passos na senda do progresso moral e apresentemo-nos ao
Senhor nus, isto é, com um coração puro, tal como Ele no-lo deu. Acompanhemos o
Cristo no seu trajeto para o Pretório, deixando pelo caminho os nossos vícios e
paixões, causa da sua ida até lá. Sigamo-lo, trilhando as sendas que Ele traçou
e assim abrandaremos os sofrimentos que lhe causamos à sua passagem pela Terra.
Jesus levado à presença do sumo
sacerdote. Jesus ultrajado e tido por merecedor de condenação à morte
(Marcos,
14:53-65; Lucas, 22:54,55;63-71)
57.
Os que prenderam a Jesus o levaram a casa de Caifás, sumo sacerdote, onde se
achavam reunidos os escribas e os anciães. 58. Pedro o acompanhou de longe até
ao pátio da casa do sumo sacerdote e, tendo ai entrado, sentou-se entre os
servos, para ver o fim de tudo aquilo. 59. Enquanto isso, os príncipes dos
sacerdotes procuravam um testemunho falso contra Jesus, para lhe darem a morte.
60. Nenhum acharam que bastasse, não obstante se terem apresentado muitas
testemunhas falsas. Por fim, apareceram duas, 61, que declararam: Este disse:
Posso destruir o templo de Deus e reedificá-lo em três dias. 62. Então,
levantando-se, disse o sumo sacerdote: Nada respondes ao que contra ti depõem
estas testemunhas? 63. Mas, Jesus se conservou calado. O sumo sacerdote lhe
disse: Eu te conjuro, pelo Deus vivo, que nos digas se és o Cristo, o filho de
Deus. 64. Jesus respondeu: Tu o disseste: eu o sou; entretanto, declaro-vos que
mais tarde vereis o Filho do homem assentado à direita da majestade de Deus e
vindo sobre as nuvens do céu. 65. Então, o sumo sacerdote rasgou as vestes,
dizendo: Ele blasfemou; que mais necessidade temos de testemunhas? Acabastes de
ouvir a blasfêmia. 66. Que vos parece? Responderam: É réu de morte. 67. Então,
uns lhe cuspiram no rosto e lhe deram murros; outros o esbofetearam, dizendo:
68, Cristo, profetiza-nos, dize quem foi que te bateu. Do
ponto de vista histórico, nenhuma explicação se faz necessária. Os fatos são
patentes. Do ponto de vista espírita, já sabemos, pelas explicações que nos
foram dadas sobre outros textos, que sentido cumpre atribuamos às palavras Filho
de Deus, quando pronunciadas ou aceitas por Jesus.
Eu o
sou,
respondeu Ele ao sumo sacerdote, e vereis
o Filho do homem assentado à direita da majestade de Deus, vindo sobre as
nuvens do céu. Essas palavras encerravam mais uma alusão velada à
reencarnação, pois se referiam àqueles, dentre os que as escutavam, cujos
Espíritos, regenerados pela reencarnação, viverão de novo na Terra, quando esta
se achar depurada. Esses os que o verão, quando Ele, em todo o seu fulgor
espírita, como soberano visível, descer ao seio da Humanidade purificada.
Desde
agora, o Filho do homem estará sentado à direita do poder de Deus,
que quer dizer: desde agora conhecidos serão os atos do Filho do homem, seu
poder, sua posição. Na realidade, esse conhecimento se espalhou, por efeito das
interpretações humanas e do progresso gradual das inteligências, e a nova
revelação, fazendo-nos conhecer quem é o filho, iluminando, com a sua luz suave
e pura, a cândida e grandiosa figura de Jesus, justifica plenamente estas
palavras proféticas, que cada vez mais justificadas serão: Mas, desde agora, o
Filho do homem estará assentado à direita da majestade de Deus.
Negação de Pedro
(Marcos,
14:66-72; Lucas, 22:56-62)
69.
Pedro entretanto estava sentado fora, no átrio. Uma criada se aproximou dele e
disse: Tu também estavas com Jesus da Galiléia. 70. Ele, porém, o negou diante
de todos, declarando: Não sei o que dizes. 71. Saindo ele dali para o
vestíbulo, uma outra criada, que o viu, disse aos que lá se achavam: Este
também estava com Jesus de Nazaré. 72. Pedro o negou segunda vez, jurando: Não
Conheço esse homem. 73. Pouco depois, alguns que por ali estavam se dirigiram a
Pedro e lhe disseram: Certamente tu também és um daqueles, pois até a tua fala
o indica. 74. Ele então se pôs a proferir imprecações e a jurar que não
conhecia aquele homem. Imediatamente cantou o galo. 75. Pedro se lembrou de que
Jesus lhe havia dito: Antes que o galo cante, tu me negarás três vezes. Saiu e
chorou amargamente.
Pedro confiara demais nas
suas próprias forças e não procurara o único ponto de apoio que o pudera
sustentar: a prece. Deixara-se levar pela confiança em si mesmo e, mau grado ao
aviso de Jesus, não se pusera em guarda.
Grande foi o seu remorso,
pois que nele houve apenas fraqueza e não culpa. Houve apenas falta de
previdência, de desconfiança de si mesmo, e não traição premeditada, fruto da
covardia e do egoísmo.
Ao deixar a casa do sumo
sacerdote, ele reconheceu o seu erro e se dispôs a repará-lo. Essa a distinção
que se deve fazer entre a fraqueza e a culpabilidade.
Dificilmente pode o culpado
reparar, no curso de uma existência, a falta durante ela cometida; ao passo que
o fraco pode adquirir a força de que careça. Eis por que são quase sempre
temerários os nossos juízos. Eis como é por que às vezes condenamos o que o
Senhor desculpa e desculpamos o que Ele reprova.
Quando o galo cantou, Jesus
não estava perto de Pedro. Mas, naquele instante, o apóstolo experimentou uma
impressão fluídica que, por um efeito de mediunidade, lhe recordou as palavras
do Mestre, fazendo-o ao mesmo tempo ver o semblante doce e calmo deste, que se
limitava a dirigir-lhe um olhar triste, quando com a ingratidão era pago da
afeição que lhe testemunhara.
Houve, da parte de Jesus,
ação magnética a distância e, da de Pedro, vidência.
Elucidações evangélicas. FEB
(e-book).
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