O sermão profético

O Sermão Profético, também chamado Discurso Escatológico, foi pronunciado por Jesus no monte das Oliveiras, o qual, em razão de sua amplitude, merece estudo mais aprofundado. O texto de Mateus (24:1-31), em seguida reproduzido, anuncia uma Era de Transição (versículos 6 a 26) e outra de Regeneração (versículos 27 a 31), segundo interpretação espírita.1

Introdução – 1. Jesus saiu do Templo, e como se afastava, os discípulos o alcançaram para fazê-lo notar as construções do Templo. 2. Mas ele respondeu- -lhes: “Vedes tudo isto? Em verdade vos digo: não ficará aqui pedra sobre pedra: tudo será destruído”. 3. Estando ele sentado no monte das Oliveiras, os discípulos foram pedir-lhe, em particular: “Dize-nos quando vai ser isso, qual o sinal da tua vinda e do fim desta época”.

O princípio das dores – 4. Jesus respondeu: “Atenção para que ninguém vos engane. 5. Pois muitos virão em meu nome, dizendo: ‘O Cristo sou eu’, e enganarão a muitos. 6. Haveis de ouvir falar sobre guerras e rumores de guerras. Cuidado para não vos alarmardes. É preciso que essas coisas aconteçam, mas ainda não é o fim. 7. Pois se levantará nação contra nação e reino contra reino. E haverá fome e terremotos em todos os lugares. 8. Tudo isso será o princípio das dores”. 9. Nesse tempo, vos entregarão à tribulação e vos matarão, e sereis odiados de todos os povos por causa do meu nome. 10. E então muitos sucumbirão, haverá traições e guerras intestinas. 11. E surgirão falsos profetas em grande número e enganarão a muitos. 12. E pelo crescimento da iniquidade, o amor de muitos esfriará. 13. Aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será salvo. 14. E este Evangelho do Reino será proclamado no mundo inteiro, como testamento para todas as nações. E então virá o fim.

A grande tribulação de Jerusalém – 15. Quando, portanto, virdes a abominação da desolação, de que fala o profeta Daniel, instalada no lugar santo – que o leitor entenda! – 16. então, os que estiverem na Judeia fujam para as montanhas, 17. aquele que estiver no terraço, não desça para apanhar as coisas da sua casa, 18. e aquele que estiver no campo não volte atrás para apanhar a sua veste! 19. Ai daquelas que estiverem grávidas e estiverem amamentando naqueles dias! 20. Pedi que a vossa fuga não aconteça no inverno ou num sábado. 21. Pois naquele tempo haverá grande tribulação, tal como não houve desde o princípio do mundo até agora, nem tornará a haver jamais. 22. E se aqueles dias não fossem abreviados, nenhuma vida se salvaria. Mas, por causa dos eleitos, aqueles dias serão abreviados. 23. Então, se alguém vos disser: “Olha o Cristo aqui!” ou “ali!”, não creiais. 24. Pois hão de surgir falsos Cristos e falsos profetas, que apresentarão grandes sinais e prodígios, de modo a enganar, se possível, até mesmo os eleitos. 25. Eis que vos preveni.

A vinda do Filho do Homem será manifesta – 26. Se, portanto, vos disserem: “Ei-lo no deserto”, não vades até lá; “Ei-lo em lugares retirados”, não creiais. 27. Pois assim como o relâmpago parte do oriente e brilha até o poente, assim será a vinda do Filho do Homem. 28. Onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão os abutres. A amplitude cósmica desse acontecimento – 29. Logo após a tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão do céu e os poderes dos céus serão abalados. 30. Então aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem e todas as tribos da terra baterão no peito e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e grande glória. 31. Ele enviará os seus anjos que, ao som da grande trombeta, reunirão os seus eleitos dos quatro ventos, de uma extremidade até a outra extremidade do céu.

A profecia indica a sucessão de dois grandes acontecimentos na humanidade terrestre: um de sofrimento, denominado Transição, outro de paz, conhecido como Regeneração. Por trás do simbolismo presente no texto evangélico, destacam-se quatro ordens de ideias: um alerta, a descrição da natureza das tribulações, o comportamento dos verdadeiros cristãos perante os acontecimentos e aspectos significativos do reinado da paz.

O alerta está relacionado aos falsos profetas (versículos 4-6; 11 e 23-26), pois

[...] Em todos os tempos houve homens que exploraram, em proveito de suas ambições, de seus interesses e do anseio de dominação, certos conhecimentos que possuíam, a fim de alcançarem o prestígio de um poder sobre- -humano, ou de uma pretensa missão divina. São esses os falsos cristos e os falsos profetas. [...]2

Sabemos, contudo, que o “verdadeiro profeta se reconhece por características mais sérias e exclusivamente morais”.2 Comuns nos dias atuais, os falsos profetas, encarnados e desencarnados, produzem um clima de intranquilidade e de negatividade por onde passam, à semelhança dos abutres que se alimentam de cadáveres (versículo 28: “onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão os abutres”).

Emmanuel pondera a respeito com sabedoria:

Essa figura, de alta significação simbológica, é dos mais fortes apelos do Senhor, conclamando os servidores do Evangelho aos movimentos do trabalho santificante. [...] Um homem que se afirma invariavelmente infeliz fornece a impressão de que respira num sepulcro; todavia, quando procura renovar o próprio caminho, as aves escuras da tristeza negativa se afastam para mais longe. Luta contra os cadáveres de qualquer natureza que se abriguem em teu mundo interior. Deixa que o divino sol da espiritualidade te penetre, pois, enquanto fores ataúde de coisas mortas, serás seguido, de perto, pelas águias da destruição.3

A natureza das tribulações é diversificada: a) Conflitos entre os povos (versículos 6, 7 e 10); b) Guerras (versículo 6) que, “como todo tipo de violência humana, individual ou coletiva, não são resultantes da vontade de Deus, mas sim expressões do egoísmo e do orgulho imperantes nos mundos atrasados como o nosso”;4 c) Flagelos e Catástrofes (versículos 7, 9, 15-21 e 29), alguns decorrentes da ação humana (versículos 7, 9 e 10), outros, como terremotos (versículo 7) e acidentes cósmicos (versículo 29), consequentes das transformações na Natureza. Os flagelos destruidores, naturais ou independentes do homem, devem ser considerados como “[...] provas que dão ao homem oportunidade de exercitar a inteligência, de demonstrar sua paciência e resignação ante a vontade de Deus, permitindo-lhe manifestar seus sentimentos de abnegação, de desinteresse e de amor ao próximo, caso o egoísmo não o domine”.5

Perante qualquer tipo de provação ou calamidade, Jesus ensina qual deve ser o comportamento do verdadeiro cristão: manter-se resguardado na firmeza da fé, pois quem “perseverar até o fim, esse será salvo” (versículo 13); não ter apego aos bens materiais: “então, os que estiverem na Judeia fujam para as montanhas, aquele que estiver no terraço, não desça para apanhar as coisas da sua casa, e aquele que estiver no campo não volte atrás para apanhar a sua veste!” (versículos 16 a 18). Demonstrar espírito de sacrifício e de resignação: “Ai daquelas que estiverem grávidas e estiverem amamentando naqueles dias! Pedi que a vossa fuga não aconteça no inverno ou num sábado. Pois naquele tempo haverá grande tribulação, tal como não houve desde o princípio do mundo até agora, nem tornará a haver jamais” (versículos 19 a 21).

O reinado da paz se instalará, efetivamente, a partir da Regeneração, quando o “Evangelho do Reino [for] proclamado no mundo inteiro, como testamento para todas as nações” (versículo 14). São palavras condizentes com outra profecia, registrada por João, (10:16):“então haverá um só rebanho e um só pastor”. Sendo assim,

[...] Jesus anuncia claramente que os homens um dia se unirão por uma crença única; mas, como poderá efetuar-se essa união? A tarefa parece difícil, tendo em vista as diferenças que existem entre as religiões, os antagonismos que elas alimentam entre os seus respectivos adeptos e a obstinação que manifestam em se acreditarem na posse exclusiva da verdade. [...] Entretanto, a unidade se fará em religião, como já tende a fazer-se social, política e comercialmente, pela queda das barreiras que separam os povos, pela assimilação dos costumes, dos usos, da linguagem. [...] Ela se fará pela força das coisas, porque se tornará uma necessidade, a fim de que se estreitem os laços de fraternidade entre as nações [...].6

Os versículos finais da profecia (30 e 31) – “Então aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem e todas as tribos da terra baterão no peito e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu com poder e grande glória. Ele enviará os seus anjos que, ao som da grande trombeta, reunirão os seus eleitos dos quatro ventos, de uma extremidade até a outra extremidade do céu”– sugerem o retorno do Cristo ao Planeta. Kardec analisa, porém, que Jesus “[...] não diz que voltará à Terra com um corpo carnal, nem que personificará o Consolador. Apresenta-se como tendo de vir em Espírito, na glória de seu Pai, para julgar o mérito e o demérito e dar a cada um segundo as suas obras, quando os tempos forem chegados”.7

Referências:

1 BÍBLIA DE JERUSALÉM. Diversos tradutores. São Paulo: Paulus, 2004. 3. reimp. Novo Testamento. Cap. Discurso escatológico.

2 KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Cap. 21, it. 6, p. 394.

3 XAVIER, Francisco C. Pão nosso. Pelo Espírito Emmnuel. 29. ed. 4. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 32.

4 SOUZA, Juvanir Borges. Tempo de renovação. 3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. Cap. 16, p. 131.

5 KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Q. 740.

6 ______. A gênese. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 17, it. 32, p. 489.

7 ______. ______. It. 45, p. 498.

Fonte: Reformador, ano 130, nº 2.196, março 2012, por Marta Antunes Moura (e-book).

 

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