Evangelho segundo Mateus - cap. 3

Prédica de João Batista. Batismo. Espírito Santo. Anjos da guarda. Batismo de Jesus

(Marcos, 1:1-11; Lucas, 3:1-18; 21,22;João, 1:32-34)

1. A esse tempo, veio João Batista pregando pelo deserto da Judéia. 2. Dizia: “Fazei penitência, pois que o reino dos céus está próximo.” 3. Porquanto, eis aqui aquele de quem falou o profeta Isaías, dizendo: “Voz do que clama no deserto: preparai o caminho do Senhor; tornai retas suas sendas.” 4. João trazia uma veste de peles de camelo e um cinto de couro à volta da cintura; alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre. 5. Os habitantes de Jerusalém, de toda a Judéia e de toda a região circunvizinha do Jordão vinham ter com ele; 6, e, confessando seus pecados, eram por ele batizados no Jordão. 7. Mas, vendo muitos fariseus e saduceus que vinham para o batismo, disse-lhes: “Raça de víboras, quem vos impeliu a fugir da cólera do que há de vir? 8. Tratai de produzir dignos frutos de penitência, 9. e não procureis intimamente dizer: “Temos Abraão por pai”; porquanto eu vos declaro que destas pedras pode Deus fazer que nasçam filhos a Abraão. 10. O machado já está posto, raiz das árvores: toda Arvore que não dá bons frutos será cortada e lançada ao fogo. 11. Eu, por mim, vos batizo na água para vos induzir à penitência; mas aquele que há de vir depois de mim é mais poderoso do que eu, que não sou digno de lhe calçar os sapatos; ele vos batizará em Espírito Santo e no fogo. 12. Traz na mão a joeira e limpará completamente o seu eirado; empilhará o trigo no celeiro e Queimará a palha num fogo que jamais se extingue. 13. Então, Jesus veio da Galiléia ao Jordão ter com João, a fim de ser por este batizado. 14. Mas João obstava a isso, dizendo: Eu é que devo ser batizado por ti e tu vens a mim? 15. Jesus lhe respondeu: “Deixa-me fazer assim por esta vez; porquanto é necessário que cumpramos toda a justiça.” João consentiu. 16. Uma vez batizado, Jesus logo saiu da água e eis que os céus se abriram e ele viu descer sobre si o Espírito de Deus em forma de uma pomba. 17. Imediatamente uma voz ecoou no céu, dizendo: Este é o meu filho bem-amado, em quem hei posto todas as minhas complacências.

João, filho de Zacarias e de Isabel, o Precursor de Jesus, nasceu seis meses antes do aparecimento deste e desencarnou com 31 anos de idade. Cheio de um Espírito Santo desde o ventre materno, como diz o Evangelista, ele foi, conforme o declarou o divino Mestre, o maior dentre os nascidos de mulher.

Jovem ainda, retirou-se para o deserto, a fim de se entregar a uma vida de rigorosa austeridade, donde só regressou para dar início ao desempenho da sua missão, no ano 15 do império romano, aos 29 de sua idade, sob o reinado de Herodes Antipas. Entrou a pregar e a administrar o batismo de penitência, todos os profetas, recebeu no deserto a inspiração de que soara a hora de ter começo a missão, que trouxera, de Precursor do Cristo e que consistia em preparar os caminhos que este teria de percorrer, em abrir brechas nas consciências, por onde penetrasse a luz de que Jesus era portador. Foi o que fez, pregando, ensinando, aconselhando aos homens que lavassem de toda impureza suas almas, que se arrependessem de suas culpas e praticassem a penitência, para se tornarem dignos de receber aquela luz, consubstanciação da moral divina. Quer isto dizer que João aparelhava o terreno para a obra que o Cristo descera a realizar.

O batismo, que ele administrava, era precedido da confissão, feita de público e em altas vozes pelo batizando, de suas faltas e pecados, para lhe despertar no íntimo o sentimento da humildade e para o constranger a evitá-las pela vergonha de as ter que confessar publicamente. A prática dessa confissão durou longo tempo. Depois, os que se arvoraram em representantes do Cristo dela se apossaram e a fizeram cair no desprestígio e na desmoralização que conhecemos, imposta como mandamento pelos que pregam o que não praticam.

João, cuja elevação espiritual as citadas palavras de Jesus patentearam, era, no entanto, menor do que o menor no reino dos céus, do que, por exemplo, Melquisedec, rei de justiça e rei de paz, que foi sem pai, sem mãe e sem genealogia, que não teve princípio, nem fim de vida, que fez o seu aparecimento na Terra à semelhança do Filho de Deus, Jesus Cristo, cuja natureza puramente espiritual, sob as vestes de um corpo celeste e não terrestre, aquelas palavras comprovam, comprovando, portanto, que ele não nasceu , nem “morreu”, que a sua vida humana foi apenas aparente. (1)

Não obstante tratar-se de um Espírito superior em missão, como Maria e José, João, por estar encarnado, se achava olvidado da sua existência anterior, dela perdera a consciência.. Assim é que não se lembrava de que fora Elias.

Para abater o orgulho dos hebreus, que só consideravam. filhos do Senhor os que suportavam o jugo de Moisés, tal qual a Igreja Romana, que assim só considera os que cegamente lhe aceitam os dogmas, João, missionário celeste, disse que poderoso é Deus para fazer das pedras filhos de Abraão, que estes, portanto, não são somente os que dizem: Senhor! Senhor! e vivem preocupados com fórmulas exteriores, ritos, cerimônias, etc., mas os que trazem puros os corações; que a árvore que não dá bons frutos será arrancada e lançada ao fogo, isto é, que o Espírito encarnado, que não progride, mediante as expiações, as provas e as reparações a que o sujeitam seus erros e transviamentos, que não apresenta frutos de regeneração, será, depois da desencarnação, a que comumente chama “morte”, lançado no fogo dos remorsos das torturas morais, correspondentes ao grau da sua culpabilidade.

O batismo, que João ministrava e a que Jesus se submeteu para exemplo, consistia na ablução, ou lavagem do corpo, fato material destinado a simbolizar a purificação da alma, pela humildade, pelo arrependimento, de que era prova a confissão pública das faltas e crimes cometidos. Era um meio material de impressionar homens materiais, mas ao mesmo tempo um ato emblemático, como um selo posto ao compromisso assumido de regeneração moral, a efetuar-se pelo batismo em fogo e em Espírito Santo, que tem sua expressão nos sofrimentos purificadores e na assistência dos Espíritos purificados, assistência que faculta ao culpado os meios e as forças de levar a cabo a sua purificação integral.

O batismo em Espírito Santo, ou seja a assistência dos Espíritos do Senhor compreendidos nessa denominação, as criaturas humanas o recebem mediunicamente, pela intuição e pela inspiração, quando não de maneira ostensiva, pelas comunicações do além. Concede-a o Cristo, enviado de Deus e seu preposto ao governo do mundo terreno, aos homens de boa-vontade, a fim de que sejam sustentados em suas provas, guiados nas suas missões e ajudados na obra de purificação de seus Espíritos e na de seu progresso pela senda do aperfeiçoamento moral e intelectual.

Esse batismo Ele o administrou, clara e exemplificativamente, fazendo que descessem até seus discípulos aqueles Espíritos, que os iam amparar e auxiliar no desempenho da missão de que se achavam incumbidos, e que se manifestassem sob a aparência de línguas de fogo, formadas pela luminosidade dos seus perispíritos. Essa também uma das razões por que ao batismo em Espírito Santo é dado o nome de “batismo de fogo”. É que por ele desce sobre a criatura o fogo da inspiração divina, a abrasá-la dos sentimentos puros e elevados, que geram os heroísmos da fé.

Hoje, como sempre, esse batismo, ou influência, podemos obtê-lo todos, pelo trabalho, pelo amor, pela humildade e, sobretudo, pela caridade, e a temos, constante, animadora e eficaz, fazendo-se mister unicamente, para que aproveitemos de todos os seus inestimáveis benefícios, que dela tenhamos consciência, que a prezemos e guardemos como preciosíssimo tesouro, de que nos podemos valer em todas as circunstâncias da vida. Temo-la, com efeito, continuamente, porque temos de contínuo, a velarem por nós, os nossos Anjos da Guarda, Espíritos elevados, caridosos, santos, que tomaram a si o encargo de nos proteger e conduzir pela estrada do progresso, com o que também eles avançam nessa mesma estrada.

Era, pois, o batismo um ato material e simbólico, mas a que só se submetiam criaturas conscientes de seus atos, possuídas do arrependimento de seus erros e faltas, desejosos de fazer penitência e de alistar-se sob o estandarte de uma fé conducente à regeneração, para a conquista do “reino dos céus”. Isto perfeitamente se compreende. Que fez, porém, a Igreja Romana? Fez do batismo material, da água derramada, não mais sobre a cabeça de homens em condições de reconhecerem e confessarem suas culpas, mas sobre a cabeça das crianças recém-nascidas, um meio de apagar nelas a mancha do pecado original, de remissão desse pecado de que se deve considerar onerado todo aquele que nasce na Terra, apesar de nenhum pecado ainda haver cometido, erro que provêm de ensinar a Igreja, por não admitir a lei das reencarnações, que quem nasce no mundo traz uma alma expressamente criada para o corpo com que se apresenta.

Vê-se assim que, como outras, a instituição do batismo da água foi completamente desvirtuada em sua natureza, em seu objetivo, em as condições precisas para ser administrado e nos fins a que visava, tudo por efeito de inovações e mandamentos humanos.

Ora, como é possível que, nunca tendo nascido antes, o Espírito do que nasce precise lavar-se de impurezas quaisquer? Será que já tenha saído impuro das mãos do seu Criador.

Em segundo lugar, se o prêmio, ou o castigo, decorrem das obras de cada um, como tantas vezes se encontra repetido nas Escrituras santas “a cada um segundo suas obras” não se compreende que a Humanidade seja responsável pela falta ou faltas que haja cometido o chamado primeiro homem, que não passa, como já mostramos, de um símbolo. E não se compreende, quer se deem aos batizandos as lições que lhes dava João, quer sejam eles dispensados dessas lições, bem como do exercício da vontade e do uso do livre-arbítrio, da manifestação do arrependimento e do desejo da penitência, condições então necessárias à administração do batismo.

É evidente que a Igreja Romana não entendeu, ou revogou a palavra do Senhor, transmitida por Moisés aos homens. Veja-se: Deuteronômio, capítulo 24, versículo 16 íbi Não se farão morrer os pais pelos filhos, nem os filhos pelos pais; mas cada um morrerá pelo seu pecado.

Ela não entendeu, ou não aceitou as palavras do apóstolo Paulo, na sua “Epístola aos Romanos”, capítulo 14, versículo 12: “E, assim, cada um de nós dará contas a Deus de si mesmo.”

Manifesto é, portanto, o absurdo do ensino da Igreja, ante os termos expressos da lei, ante os ensinamentos dos profetas e dos apóstolos. Essa a razão por que o clero romano foge a toda discussão, não admitindo que os leigos falem nos Evangelhos, e a razão também por que a Humanidade não dá às Escrituras sagradas a importância que lhes devia dar. Entretanto, assim não continuará a ser. Acreditamos e esperamos que o remédio não tardará, para extirpar o mal pela raiz, mal que lavra há muitos séculos, desde que os fariseus, ensinando que da aliança do Sinai viera a lei oral e não a lei escrita, reduziram o Código Sagrado a mero acervo de tradições e monopolizaram, por vaidade e interesse de seita, a inteligência e a interpretação dos livros santos, fazendo que a corrupção chegasse ao ponto de levar Jesus a declarar que os judeus haviam aniquilado a palavra do Senhor.

Sob o aspecto material, o batismo correspondia a uma necessidade daqueles tempos; destinava-se, como já dissemos, a fazer impressão em homens materiais. Se ainda hoje precisa ser mantido com esse aspecto, batizemos os nossos filhos; mas, desde que se tornem conscientes, mostremos-lhes que, ante a razão, somente a parte simbólica é de utilidade e proveito.

Jesus não tinha necessidade de ser batizado por João. A prova encontramo-la na circunstância de que recebeu um batismo, que era de penitência, que, por isso, exigia prévia confissão pública de pecados, sem ter confessado culpa alguma, sem de nenhum pecado se haver penitenciado. Quer isso dizer, evidentemente, que Ele era puro e perfeito, porquanto só os que alcançam a perfeição na pureza se acham livres de ter a mais leve culpa, a mais ligeira falta de que se acusar em consciência. E essa circunstância, por si só, indica e demonstra que Ele não podia estar encarnado, ser um homem como os demais, porquanto, conforme se lê em “O Livro dos Espíritos”, aqueles, dentre estes, que compõem a primeira classe, classe única, da primeira ordem, na escala espírita, já percorreram todos os graus do aperfeiçoamento e se despojaram de todas as impurezas da matéria. Tendo alcançado a soma de perfeição de que é suscetível a criatura, não têm mais que sofrer provas, nem expiações. Não estando mais sujeitos à reencarnação em corpos perecíveis, realizam a vida eterna, no seio de Deus.

Trazia ele, portanto, um corpo celeste, que não precisava ser lavado, como os nossos corpos de lodo, por motivo algum e ainda menos como expressão material da necessidade de purificação espiritual.

Jesus, conseguintemente, e só Jesus, segundo proclamou João que Ele o faria, estava capacitado para administrar o batismo em Espírito Santo e em fogo e para, investir a outros de o ministrarem, como investiu os apóstolos que, depois de terem recebido esse batismo, foram incumbidos de pregar e exemplificar a moral que Ele trouxera ao mundo e de o conferirem a quantos, escutando-lhes as palavras, praticassem a lei do amor e, a seu turno, a propagassem pela palavra e pelo exemplo.

Segue-se, então, que apenas para dar um exemplo, para confirmar a missão de que o Precursor se achava encarregado, e ainda para receber pública e ostensivamente a confirmação da sua, foi que Jesus se fez batizar por João. Essa confirmação Ele a teve, de fato, mediante aquelas palavras que se ouviram, vindas do alto, e que continham, em seu sentido profundo, a afirmação de que à Terra descera o Espírito excelso, cujo advento os profetas anunciaram, e mediante o aparecimento de uma pomba a lhe pairar sobre a cabeça.

Foi esta uma manifestação espírita, que se produziu pela faculdade que tem o Espírito de dar ao próprio perispírito as formas e aparências que queira. Um dos que secundavam a Jesus no desempenho de sua missão, tomou, obedecendo aos desígnios de Deus, a forma de uma pomba que, considerada pelos antigos como emblema da pureza, veio atestar, naquele momento, a do Messias prometido.

Segundo a narração evangélica, aconteceu que, batizado Jesus, quando estava em oração (LUCAS, capítulo 3, versículo 22), o céu se abriu e uma voz ressoou no espaço, dizendo: Este é o meu filho bem-amado, em quem hei posto toda a minha complacência. Disse essas palavras um dos Espíritos Superiores, órgãos das inspirações divinas e executores das vontades de Deus. E as disse quando Jesus orava, para demonstrar aos homens que a prece do coração atrai as bênçãos do Senhor e os testemunhos do seu amor infinito; que determina, por intermédio dos Espíritos protetores, a influência divina; e também como sanção expressa da legítima autoridade de Jesus, da sua identidade na condição de enviado direto de Deus.

(1) Com esta palavra muito jogo costumam fazer os que combatem a revelação da corporeidade fluídica do Cristo, pretendendo que, se houveram sido aparentes, essa corporeidade e a vida humana de Jesus nenhuma realidade teriam tido. Convêm, pois, precisar o significado verdadeiro de tal palavra, ou, pelo menos, o sentido em que é empregada, quando se trata daquela vida. Para esse efeito, de nenhuma autoridade maior, nem melhor, nos podemos socorrer, do que do Mestre Allan Kardec. Citemos, conseguintemente, o passo em que ele nos dê esse significado.

Encontramo-lo no capítulo 8 da segunda parte de O Livro dos Médiuns, capitulo que se intitula “Do laboratório do mundo invisível”, numa nota por ele aditada a uma das respostas do Espírito que o instruía, em o n 128 do volume. Vamos reproduzir, para boa Inteligência da explicação, as perguntas e respostas que deram lugar a essa nota.

2. Aquela caixa de rapé (tratava-se da aparição de um Espírito encarnado, que trazia na mão esse objeto) tinha a forma da de que ele se servia habitualmente e que estava em sua casa. Que era então a que foi vista com a aparição?

“Uma aparência. Era para que a circunstância fosse notada, como o foi, e para que não tomassem a aparição como uma alucinação produzida pelo estado de saúde da vidente, O Espírito querendo que aquela senhora acreditasse na realidade da sua presença, tomou todas as aparências da realidade.”

3. Dizes que foi uma aparência; mas uma aparência nada tem de real, é uma como ilusão de ótica. Desejáramos saber se a caixa de rapé era apenas uma imagem sem realidade, ou se havia nela alguma coisa de material?

“Certamente; é com o auxílio desse princípio material que o perispírito toma a aparência de vestes semelhantes às que o Espírito trazia quando vivo.”

NOTA. É verdade que se deve entender aqui a palavra “aparência” no sentido de aspecto, imitação. A caixa de rapé, real, não estava lá: a que o Espírito trazia era apenas a representação da outra: era, pois, uma aparência, comparada ao original, se bem que formada de um princípio material.

A experiência nos ensina que nem sempre devemos tomar ao pé da letra certas expressões empregadas pelos Espíritos. Interpretando-as segundo as nossas ideias, expomo-nos a grandes equívocos. Cumpre, por isso, aprofundar o sentido de suas palavras, todas as vezes que apresente a menor ambiguidade. É uma recomendação que os próprios Espíritos repetidamente nos fazem. Sem a explicação que provocamos, a palavra aparência, constantemente reproduzida em casos análogos, podia dar azo a uma falsa interpretação.

Elucidações evangélicas. FEB (e-book).

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário