Violência doméstica e urbana

Os conflitos sociais representam uma das principais causas de sofrimento no mundo contemporâneo, pelo colapso no atendimento às necessidades humanas básicas, quais sejam: alimentação, habitação, saúde, educação, segurança e transporte. Entretanto, esclarece a Doutrina Espírita, em determinadas circunstâncias estes conflitos podem produzir reações positivas por parte de governantes e de pessoas esclarecidas, formadoras de opinião, desenvolvendo ações efetivas capazes de modificar o curso nefasto dos acontecimentos. “[...] É de notar-se [observa Allan Kardec] que em todas as épocas da História, às grandes crises sociais se seguiu uma era de progresso”.1

A violência doméstica é apontada pelos estudiosos como causa primordial dos severos conflitos sociais existentes no mundo.

A violência no lar, por sua vez, originando-se de fatores psicossociais e econômico-sociais, não resolvidos ou mal administrados, produzem um estado generalizado de violência na sociedade. Os fatores psicossociais estão relacionados à visão materialista da vida, em que os indivíduos adotam como normas de conduta uma permissibilidade moral que afeta os usos e os costumes humanos. Nesta situação, as pessoas se fecham em copas, agindo de forma indiferente aos sofrimentos e às necessidades do próximo: transformam-se em criaturas indolentes e omissas, nada fazendo para impedir ou minimizar o estado de criminalidade e violência reinantes à sua volta. É bom ficarmos atentos, pois esta visão materialista da vida pode nos conduzir ao caos social. Já as causas econômico-sociais dizem respeito às desigualdades humanas decorrentes da má distribuição de renda, permitindo-se que uma minoria viva em abundância e uma maioria de seres humanos sofra os rigores da pobreza e da miséria. Uma sociedade estabelecida sob tais bases está marcada pelos contrastes sociais, estimuladores do desemprego, da violência e do sofrimento superlativo.

É importante considerar, à luz do entendimento espírita, que a existência de conflitos sociais, em si, não representa, necessariamente, fator desencadeador das práticas generalizadas de violência. Uma coisa não tem relação com a outra. Na verdade, “é bem sabido que a maior parte das misérias da vida tem origem no egoísmo dos homens. Desde que cada um pensa em si antes de pensar nos outros e cogita antes de tudo de satisfazer os seus desejos, cada um naturalmente cuida de proporcionar a si mesmo essa satisfação, a todo custo, e sacrifica sem escrúpulo os interesses alheios, assim nas mais insignificantes coisas, como nas maiores, tanto de ordem moral, quanto de ordem material. Daí todos os antagonismos sociais, todas as lutas, todos os conflitos e todas as misérias, visto que cada um só trata de despojar o seu próximo”.2

A violência doméstica e urbana vem ocorrendo de maneira crescente, porque a criatura humana está espiritualmente doente. “[...] O homem, pois, em grande número de casos, é o causador de seus próprios infortúnios; mas, em vez de reconhecê-lo, acha mais simples, menos humilhante para a sua vaidade acusar a sorte, a Providência, a má fortuna, a má estrela, ao passo que a má estrela é apenas a sua incúria”.3

A violência doméstica é um problema que atinge, em especial, milhares de crianças, adolescentes e mulheres. As vítimas, muitas vezes silenciosas, são submetidas a algum tipo de sofrimento indescritível. Fazem parte da violência doméstica as agressões físicas e psicológicas, sendo as mais comuns os espancamentos, a negligência em relação aos cuidados com os bebês e as crianças, e o abuso sexual. A violência urbana, uma extensão da violência doméstica, tem amedrontado a população em razão dos frequentes relatos de assaltos, atropelamentos, homicídios e sequestros. As famílias estão cada vez mais isoladas dentro de suas habitações, construindo muros altos ou colocando grades elétricas nas residências; instalando mecanismos de vigilância ou de segurança e, mesmo assim, não se sentem a salvo da ação criminosa.

Como espíritas, como cristãos, sabemos que algo precisa ser feito, pois, a “[...] onda crescente de delinquência que se espalha por toda a Terra assume proporções catastróficas, imprevisíveis, exigindo de todos os homens probos e lúcidos acuradas reflexões”.4 Todavia, é válido ponderar que a simples preocupação nada resolve,“[...] se medidas urgentes e práticas não se fizerem impor, mediante a adoção de política educativa generalizada [...]. Tem-se procurado reprimir a delinquência sem se combaterem as causas fecundas da sua multiplicação. Muito fácil, parece, a tarefa repressiva, inútil, porém, quando não se transforma em fator a mais para a própria violência. A terapêutica para tão urgente questão há de ser preventiva, exigindo dos adultos que se repletem de amor nas ineuxaríveis nascentes da Doutrina de Jesus, a fim de que, moralizando-se, possam educar as gerações novas, propiciando-lhes clima salutar de sobrevivência psíquica e realização íntima”.5

O terrorismo urbano é um ato de extrema violência aplicado por personalidades extremistas e fanáticas, por meio de ações homicidas. São classificados como atos terroristas os atentados a bomba, os sequestros, a guerra biológica e outras ações semelhantes. O método básico do terrorismo é a destruição da vida humana em nome de certos princípios ideológicos, políticos ou religiosos.

Segundo o Espiritismo, as ações terroristas, assim como as guerras, acontecem devido à “predominância da natureza animal sobre a natureza espiritual e transbordamento das paixões. No estado de barbaria, os povos um só direito conhecem – o do mais forte. [...]”6 O assassinato individual ou coletivo é um grande “[...] crime, pois que aquele que tira a vida ao seu semelhante corta o fio de uma existência de expiação ou de missão. Aí é que está o mal”.7 Sendo assim, é natural que o responsável pelos atos de terrorismo e homicídios generalizados seja considerado grande culpado perante a Lei de Deus e necessite de muitas existências “[...] para expiar todos os assassínios de que haja sido causa, porquanto responderá por todos os homens cuja morte tenha causado para satisfazer à sua ambição”.8

Referências:

1 KARDEC, Allan: A gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB, 2006. Cap. XVIII, item 33.

2 ______. Obras póstumas. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB, 2005. Primeira parte, cap. “O egoísmo e o orgulho”.

3 ______. O evangelho segundo o espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB, 2005. Cap. V, item 4.

4 FRANCO, Divaldo P. SOS família. Por diversos Espíritos. 2. ed. Salvador: LEAL, 1994. Item: “Delinquência, perversidade e violência” (Mensagem de Joanna de Ângelis).

5 Idem, ibidem. p. 124.

6 KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 87. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Questão 742.

7 Idem, ibidem, questão 746.

8 Idem, ibidem, questão 745.

Fonte: Reformador, ano 124, nº 2.128, julho 2006, por Marta Antunes Moura.


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