Evangelho segundo João - cap. 9

Jesus cura um cego de nascença

1. Caminhando, viu Jesus um cego de nascença.

Trata-se de mais um episódio da vida de Jesus, do qual se podem extrair dois ensinamentos: há Espíritos tão idealistas que encarnam em condições precárias para servirem à causa do bem; “o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado”, ou seja, os preconceitos devem ser enfrentados e superados para que o progresso se realize. Jesus quis ensinar essas duas lições.

2. Os seus discípulos indagaram dele: Mestre, quem pecou, este homem ou seus pais, para que nascesse cego?

Que crença mais rigorista: alguém tem sempre de assumir a culpa de algum fato como as doenças, os sofrimentos! Jesus, por exemplo, arrostou situações adversas desde seu nascimento sem ter culpa alguma, pois é um Espírito Puro, que nunca errou. O divino Mestre aproveitou a oportunidade para ensinar essa verdade, igualmente não perdendo a ocasião para mostrar que as convenções humanas nem sempre devem prevalecer, como aquela de não poder fazer o bem em determinado dia da semana, quando o bem deve ser feito sempre e em qualquer lugar. Deus nunca aprovaria uma justificativa dessa a pretexto de respeitá-lo.

3. Jesus respondeu: Nem este pecou nem seus pais, mas é necessário que nele se manifestem as obras de Deus.

Jesus afirmava sempre que as curas e outros prodígios que realizava eram “obras de Deus”, o qual deveria ser glorificado, e não Ele, Jesus. É importante notarmos esse detalhe, que faz muita diferença e mostra a verdadeira personalidade de Jesus, muito diferente do que muitos pensam, tendo-o como “um de nós melhorado”, quando, na verdade, era totalmente diferente, pois nunca errou e sempre agia com humildade, desapego e simplicidade absolutos. Com razão, dizia Emmanuel que, em qualquer tema que diga respeito a Jesus, não temos a mínima condição de formular uma hipótese e um juízo.

4. Enquanto for dia, cumpre-me terminar as obras daquele que me enviou. Virá a noite, na qual já ninguém pode trabalhar.

As oportunidades surgem e passam: enquanto temos como fazer o bem, façamo-lo, porque, daqui a pouco tempo, será tarde!

5. Por isso, enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo.

Jesus sabia que tinha muito a realizar em pouco tempo.

6. Dito isso, cuspiu no chão, fez um pouco de lodo com a saliva e com o lodo ungiu os olhos do cego.

A força magnética de Jesus produziu algum medicamento desconhecido da nossa Ciência.

7. Depois lhe disse: Vai, lava-te na piscina de Siloé (esta palavra significa emissário). O cego foi, lavou-se e voltou vendo.

A cura foi instantânea, qual a do paralítico, narrada linhas atrás.

8. Então os vizinhos e aqueles que antes o tinham visto mendigar perguntavam: Não é este aquele que, sentado, mendigava?

O assombro foi grande: quem conhecia o homem cego de nascença ficou ciente de que realmente estava curado.

9. Respondiam alguns: É ele. Outros contestavam: De nenhum modo, é um parecido com ele. Ele, porém, dizia: Sou eu mesmo.

Alguns tiveram o desplante de afirmar que não era o cego de nascença, mas alguém parecido com ele, pois sempre há quem duvide das maiores evidências: são os Tomés, para quem nenhuma evidência é suficiente.

10. Perguntaram-lhe, então: Como te foram abertos os olhos?

Veio então a pergunta previsível: “Como te foram abertos os olhos?”, ou seja, quem lhe concedeu a cura? Seria mais uma demonstração de que Jesus era o Messias aos olhos das pessoas de boa fé e um motivo de irritação para os que questionavam que um homem do perfil de Jesus pudesse ser o Messias esperado, que deveria ser um arrogante homem de estado e, ao mesmo tempo, um guerreiro, para dar a Israel a supremacia mundial.

11. Respondeu ele: Aquele homem que se chama Jesus fez lodo, ungiu-me os olhos e disse-me: Vai à piscina de Siloé e lava-te. Fui, lavei-me e vejo.

O número de adeptos e de contraditores aumentava sempre, como sempre acontece quando se faz o bem. Jesus veio suscitar a reflexão e aqueles acontecimentos passaram a ser comentados até por aqueles que procuravam nada saber do que estava ocorrendo na sua cidade e no seu país: a propaganda das “obras de Deus” aumentava dia a dia. Aquela última cura foi o tema de muitos debates e reflexões.

12. Interrogaram-no: Onde está esse homem? Respondeu: Não o sei.

Queriam vê-lo, conversar com Ele, pedir-lhe alguma coisa. E aquele Espírito idealista tinha cumprido sua tarefa de servir na propagação do poder de Deus, manifestado pelo seu Médium, que era Jesus.

Líderes religiosos interrogam o cego

13. Levaram então o que fora cego aos fariseus.

Os fariseus tinham de ficar sabendo de mais essa “obra de Deus” realizada por Jesus, e o souberam.

14. Ora, era sábado quando Jesus fez o lodo e lhe abriu os olhos.

Pela segunda vez, Jesus curou em dia de sábado, mais irritando os ortodoxos.

15. Os fariseus indagaram dele novamente de que modo ficara vendo. Respondeu-lhes: Pôs-me lodo nos olhos, lavei-me e vejo.

Aquele homem demonstrava sua superioridade inclusive ao confirmar, perante os detratores de Jesus, indiretamente, que Ele era o Messias.

16. Diziam alguns dos fariseus: Este homem não é o enviado de Deus, pois não guarda sábado. Outros replicavam: Como pode um pecador fazer tais prodígios? E havia desacordo entre eles.

Não guardar o sábado era um pecado grave para uns; para outros Jesus, pelo fato de desobedecer a tradição de guardar os sábados, não poderia ser o intermediário do poder de Deus. No entanto, o ex-cego afirmava que foi curado por Jesus, com um medicamento que incluía saliva e lodo.

17. Perguntaram ainda ao cego: Que dizes tu daquele que te abriu os olhos? É um profeta, respondeu ele.

Mais complicada ficou a situação para os ortodoxos quando o ex-cego afirmou que Jesus só poderia ser um profeta, ou seja, um médium de elevada sintonia espiritual! Jesus veio para despertar os que dormiam o sono do descompromisso com Deus: as formas que utilizou foram todas as que se fizeram possíveis, pois nenhuma ovelha poderia permanecer perdida.

18. Mas os judeus não quiseram admitir que aquele homem tivesse sido cego e que tivesse recobrado a vista, até que chamaram seus pais.

A que ponto chegaram os julgadores do caso!

19. E os interrogaram: É este o vosso filho? Afirmais que ele nasceu cego? Pois como é que agora vê?

Não havia como negarem mais uma evidência.

20. Seus pais responderam: Sabemos que este é o nosso filho e que nasceu cego.

Não havia mais o que fazer, a não ser reconhecer que Jesus era o Messias ou, como se faz ainda hoje, eliminar a vida de quem passa a ser um motivo de desconforto para os poderosos do momento.

21. Mas não sabemos como agora ficou vendo, nem quem lhe abriu os olhos. Perguntai-o a ele. Tem idade. Que ele mesmo explique.

Os pais não tinham o estofo moral do ex-cego e procuraram eximir-se de responsabilidades. Esses são os que retardam o próprio progresso espiritual, omitindo-se, quando surgem as oportunidades de afirmarem a verdade.

22. Seus pais disseram isso porque temiam os judeus, pois os judeus tinham ameaçado expulsar da sinagoga todo aquele que reconhecesse Jesus como o Cristo.

O temor acomete os apegados aos interesses materiais. Jesus não temia nada, porque, além de amar a todos, indistintamente, nada tinha a perder, pois o próprio corpo Ele afirmou poder reconstruí-lo quando quisesse. O amor incondicional dá a coragem ilimitada enquanto que o desapego também prepara para qualquer perda, pois se sabe que tudo pertence a Deus. Aquele casal, todavia, pensava nas conveniências da sua vida horizontal e perdeu a oportunidade de testemunhar em favor do próprio Governador planetário, médium de Deus.

23. Por isso é que seus pais responderam: Ele tem idade, perguntai-lho.

O evangelista reprovou-lhes a conduta omissiva.

24. Tornaram a chamar o homem que fora cego, dizendo-lhe: Dá glória a Deus! Nós sabemos que este homem é pecador.

Pressionaram o ex-cego a desdizer-se, mas ele, como Espírito Superior, deu seu testemunho em favor da verdade, como todos devemos fazer.

25. Disse-lhes ele: Se esse homem é pecador, não o sei... Sei apenas isto: sendo eu antes cego, agora vejo.

Estava realizada a defesa do médium de Deus: a defesa da verdade, da realidade inquestionável do fato ocorrido, que, em são consciência, ninguém tinha condições de negar.

26. Perguntaram-lhe ainda uma vez: Que foi que ele te fez? Como te abriu os olhos?

Não queriam reconhecer a verdade do fato e voltaram à carga.

27. Respondeu-lhes: Eu já vo-lo disse e não me destes ouvidos. Por que quereis tornar a ouvir? Quereis vós, porventura, tornar-vos também seus discípulos?

O ex-cego pareceu, no final, responder com uma pitada de ironia àquele interrogatório tendencioso: “Quereis vós, porventura, tornar-vos também seus discípulos?...” Era o que mereciam, pela desonestidade na apuração da verdade. Como julgadores que eram cabia-lhes reconhecer o fato como provado e proferir sua decisão, assumindo a responsabilidade pelo erro ou acerto que ela contivesse!

28. Então eles o cobriram de injúrias e lhe disseram: Tu que és discípulo dele! Nós somos discípulos de Moisés.

Agredir verbalmente os que testemunham em favor da verdade é o máximo da injustiça e foi assim que aqueles julgadores se desmereceram e denegriram o nome da justiça que representavam.

29. Sabemos que Deus falou a Moisés, mas deste não sabemos de onde ele é.

Moisés não estava presente para impedir que lhe usassem o nome respeitável de maneira tão desonesta! Era apenas um pretexto para justificarem sua própria descrença em Deus!

30. Respondeu aquele homem: O que é de admirar em tudo isso é que não saibais de onde ele é, e entretanto ele me abriu os olhos.

O ex-cego representou um papel muito mais relevante que muitos discípulos, expondo a realidade do fato frente à frente com os julgadores do caso. Um Espírito Superior, que o evangelista fez questão de destacar, para servir de exemplo para as gerações que se sucederiam.

31. Sabemos, porém, que Deus não ouve a pecadores, mas atende a quem lhe presta culto e faz a sua vontade.

O testemunho daquele homem evoluído tornou-se em verdadeira preleção sobre religiosidade no verdadeiro sentido da palavra.

32. Jamais se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos a um cego de nascença.

E continuou expondo suas reflexões, que incomodavam a consciência defunta daqueles homens que de religiosidade só tinham a casca.

34. Se esse homem não fosse de Deus, não poderia fazer nada.

Terminou por afirmar seu entendimento no sentido do messianato de Jesus.

34. Responderam-lhe eles: Tu nasceste todo em pecado e nos ensinas? E expulsaram-no.

No entanto, aqueles falsos religiosos já tinham recebido a semente de Deus, que iria germinar algum dia. Assim se faz a evolução: os detratores acabam se tornando adeptos e propagadores quando chega a hora da sua “estrada de

Damasco”.

Jesus revela-se ao cego. Ensina sobre a cegueira espiritual

35. Jesus soube que o tinham expulsado e, havendo-o encontrado, perguntou-lhe: Crês no Filho do Homem?

Jesus o procurou e dialogou com ele, como dois homens de boa fé e sinceros cultores de Deus, apenas que sendo um caminheiro ainda tentando superar algumas falhas, mas firme no propósito de servir a Deus e o outro um Espírito Puro como a luz do Sol. Lindo esse diálogo, que mostra como são os puros de coração.

36. Respondeu ele: Quem é ele, Senhor, para que eu creia nele?

Queria encontrar a verdade e indagava como proceder: assim deveriam ter procedido aqueles que questionavam Jesus, se fossem humildes e bem intencionados.

37. Disse-lhe Jesus: Tu o vês, é o mesmo que fala contigo!

Tinha-se realizado um encontro entre o céu e a terra, num abraço de intenso amor à verdade, que iluminou quilômetros em volta e repercutiu junto ao próprio Pai celestial.

38. Creio, Senhor, disse ele. E, prostrando-se, o adorou.

Eis um dos maiores discípulos de Jesus, exemplo a ser seguido por todos os que querem merecer a denominação de aprendizes do Evangelho.

39. Jesus então disse: Vim a este mundo para fazer uma discriminação: os que não veem vejam, e os que veem se tornem cegos.

O importante é abrir a visão espiritual, através da qual se enxerga o Universo como uma obra maravilhosa de Deus e as outras criaturas como irmãos e irmãs muito amados. Jesus não tinha outro sentimento pelos empedernidos no orgulho que não a compaixão, que o levava sempre a procurar dialogar com eles, para despertá-los.

Daí os seguidos relatos do evangelista sobre esses diálogos, onde Jesus saía sempre com a palma da vitória, não por ter tido melhores argumentos, mas por ter enxertado em cada um daqueles corações as flores que iriam desabrochar no porvir. Louvado seja o divino Mestre por seu amor e sabedoria!

40. Alguns dos fariseus, que estavam com ele, ouviram-no e perguntaram-lhe: Também nós somos, acaso, cegos?

Eram questionadores, como as crianças que perguntam sobre os porquês de tudo, sem aguardarem a s respostas. Jesus tinha infinita paciência e lhes respondia às indagações ansiosas.

41. Respondeu-lhes Jesus: Se fôsseis cegos, não teríeis pecado, mas agora pretendeis ver, e o vosso pecado subsiste.

Depois de terem tido contato com a verdade, não poderiam mais pretextar ignorância para continuarem errando: nascia na consciência deles a responsabilidade se continuassem negando o próprio Deus, que diziam representar na Terra.

Fonte:

O Evangelho de João na visão espírita (e-book) 

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