Evangelho segundo Marcos - cap. 4

Parábola do semeador. Explicação dessa parábola

(Mateus, 13:1-23; Lucas, 8:1-15,18; 10:23,24)

1. Pôs-se de novo a ensinar próximo ao mar e, como enorme fosse a multidão que ali se reuniu, Ele subiu para uma barca e se sentou, ficando todo o povo na praia. 2. Muitas coisas ensinava por parábolas, dizendo, segundo o seu modo de doutrinar: 3. “Escutai. O semeador saiu a semear: 4, e, enquanto semeava, uma parte das sementes caiu à borda do caminho; vieram as aves do céu e a comeram. 5. Outra parte caiu em terreno pedregoso, onde pouca terra havia; as sementes germinaram logo, pois que pequena era a profundidade da terra; 6, veio, porém, o Sol, crestou as plantas e estas, por não terem raízes, secaram. 7. Outra parte caiu entre espinheiros, estes cresceram e a abafaram, de sorte que ela não deu frutos. 8. Outra, finalmente, caiu em terra boa; os grãos deram fruto; elevaram-se, multiplicaram-se e produziram cem, sessenta, trinta por um.’ 9. E acrescentava: Ouça quem tiver ouvidos de ouvir. 10. Quando com Ele ficaram a sós os doze que o seguiam interrogaram-no acerca dessa parábola, 11. e Ele lhes respondeu: Dado vos é a vós conhecer o mistério do reino de Deus, mas, para aqueles que são de fora, tudo se faz por parábolas; 12, a fim de que, vendo, vejam e não vejam e, ouvindo, ouçam e não compreendam, para que não se convertam e os pecados lhes sejam perdoados. 13. Perguntou-lhes em seguida: Não entendeis esta parábola? Como podereis entender todas as parábolas? 14. O semeador semeia a palavra. 15. A margem do caminho, ao longo do qual a semente caiu, são aqueles de cujos corações Satanás vem arrancar a palavra logo depois de ter sido nos seus corações semeada. 16. Semelhantemente, o terreno pedregoso são os que, ouvindo a palavra, a recebem jubilosos. 17. Como, porém, nesses ela não cria raízes, dura pouco tempo. Em vindo as tribulações e perseguições por causa da palavra, eles logo se escandalizam. 18. Os outros, designados pela parte das sementes lançadas entre espinheiros, são os que ouvem a palavra, 19, mas os cuidados do século, a ilusão das riquezas e as outras paixões, entrando em seus corações, a sufocam e ela não frutifica. 20. O terreno bom onde a última parte das sementes é lançada são os que ouvem a palavra, a recebem e dela tiram frutos, na proporção de cem, de sessenta, de trinta por um. 25. Mais será dado ao que já tem e ao que não tem se tirará mesmo o que tem.

As explicações que Jesus deu da parábola do semeador era a que convinha aos Espíritos encarnados naquela época e a de que necessitavam os apóstolos, a fim de desempenharem suas missões. As mesmas explicações bastam para que a compreendamos.

A razão por que Jesus preferentemente falava por parábolas era evitar que muitos se enchessem de maiores responsabilidades, que lhes acarretariam grandes sofrimentos no futuro: aqueles que, capazes embora de receber sem véu a sua palavra, não se lhe submeteriam. Por outro lado, para os que estivessem dispostos a avançar, a caminhar para diante, nenhum inconveniente havia em que os ensinos lhes fossem ministrados veladamente, visto que se esforçariam, como o fizeram os discípulos, por lhes descobrir o sentido oculto e o apreenderiam. Os que, ao contrário, assim não procedessem por considerarem pesadas demais para suas naturezas más a reforma que aqueles ensinos impunham, seriam culpados apenas de indiferença, de não procurarem devassar os mistérios que de pronto não compreendiam.

Dizendo, pois, que não lhes falava senão por parábolas, “para que não se convertessem”, aludia o Mestre aos que, cedendo a um primeiro impulso, tentariam avançar, mas que, detidos bruscamente pelos seus maus instintos, fariam sem demora um recuo, que lhes viria a ser causa de graves expiações, porquanto, conforme também o disse, “muito será dado ao que já tem; ao passo que àquele que pouco tenha, mesmo esse pouco será tirado”.

Estas palavras significam que aquele que deseja progredir e se esforça por consegui-lo, de todos os lados receberá amparo; enquanto que o outro, o que tem pouco, indiferente ao que lhe foi dado, negligente em guardar o que recebeu, deixará que as más paixões se apossem do seu coração, que os vícios e males, que o oprimirão durante séculos, tomem o lugar das poucas virtudes de cuja posse já desfrutasse.

Antes das revelações feitas por Jesus, o homem, nenhuma ideia clara formando da outra vida, não estava apto a conhecer os “mistérios do reino dos céus, os segredos do reino de Deus”, expressões que compõem uma imagem destinada a materializar, por assim dizer, para a compreensão de homens materiais, a felicidade dos bem-aventurados. Os “mistérios” do reino dos céus, os “segredos” do reino de Deus eram os meios, desconhecidos até então, de chegar-se àquela felicidade.

Jesus veio levantar o véu e esclarecer as inteligências. Porém, apenas uma ponta do véu foi levantada; a “luz” permaneceu velada. Hoje, a luz já brilha com mais vivo fulgor, porque os Enviados do Senhor ergueram um pouco mais o véu que a encobria, tanto quanto os olhos humanos, tornados mais fortes, o permitiam. O véu, entretanto, só será levantado completamente, quando os homens houverem alcançado alto grau de desenvolvimento moral e intelectual. Só então lhes será facultado conhecerem todos os “mistérios do reino dos céus”, todos os “segredos do reino de Deus”.

Grão de mostarda. Fermento da massa. Semente lançada à terra

(Mateus, 13:31-35; Lucas, 13:18-22)

26. E dizia: O reino de Deus é como quando um homem lança à terra a semente. 27. Quer o homem durma quer vele dia e noite, a semente germina e cresce sem que ele saiba como; 28, pois que a terra, por si mesma, produz primeiro a erva, depois a espiga e afinal o grão que cobre a espiga. 29. E, amadurecido o fruto, passa-se-lhe a foice, pois é esse o momento da ceifa. 30. E dizia: A que compararemos o reino de Deus? Por que parábola o representaremos? 31. Ele se assemelha a um grão de mostarda que, ao ser semeado, é a menor de todas as sementes que existem na terra. 32. Uma vez, porém, semeada, ela cresce e se torna maior do que todos os arbustos; dá galhos tão grandes que os pássaros do céu se podem abrigar à sua sombra. 33. E assim lhes falava por muitas parábolas, de acordo com o que eles podiam entender. 34. Não lhes falava sem parábolas; mas, a sós com os discípulos, tudo lhes explicava.

Comparando o reino dos céus ao grão de mostarda, quis Jesus mostrar à multidão que o gérmen, por mínimo que seja, donde se parta para chegar ao céu, pode desenvolver-se e produzir grandes resultados.

No seu pensamento acerca do futuro, a comparação do reino dos céus com um grão de mostarda, que, de pequenino que é, se torna árvore grande, em cujos ramos os pássaros vêm habitar, constitui uma alegoria em que aquele grão representa o ponto de partida, a origem do planeta e da Humanidade, o estado rudimentar de uma e outro; em que o crescimento oculto do grão, sua afloração, desenvolvimento e transformação em árvore simbolizam as fases por que tem passado o nosso mundo, as da formação e desenvolvimento dos reinos mineral, vegetal, animal e humano e as de depuração e transformação física do planeta e física, moral e intelectual da Humanidade. Os ramos da árvore indicam o grau de evolução que aquele atingirá, para se tornar morada de paz e de felicidade, que os Espíritos purificados virão habitar e onde, continuando a progredir com ela, chegarão à perfeição.

Na parábola em que comparou o reino de Deus ao fermento que se lança na massa de farinha para levedá-la e torná-la em pão, figurou Jesus o trabalho de transformação e purificação das almas, por efeito da doutrina de amor e bondade que Ele lançava nos corações único fermento apropriado à preparação do pão espiritual, que alimenta para a vida eterna.

Na em que o reino dos céus é comparado à semente que o homem lançou à terra, o divino Mestre indicava o trabalho, secreto, mas contínuo, da semente de regeneração que Ele imergia nos corações, ao mesmo tempo que mostrava as fases de germinação, crescimento, transformação, desenvolvimento e frutificação que o Espírito atravessa, para atingir a maturidade moral e intelectual, estado em que será aproveitado pelos ceifadores incumbidos de proceder à colheita para o celeiro divino, o reino de Deus.

Por outro lado, esta última parábola, despojado da letra o Espírito, é o emblema dos períodos que a nossa Humanidade tem percorrido e transposto na via do progresso, desde o aparecimento do homem na Terra, assim como dos períodos que ela tem de percorrer e transpor, para sua regeneração completa.

A erva, que aflorou ao solo, como produto da germinação da semente, designa o tempo que se escoou antes que Jesus aparecesse na Terra; a formação da espiga indica o que decorreu desde esse aparecimento até os nossos dias; a formação dos grãos que cobrem a espiga, os próprios grãos já formados e o fruto ao qual, quando maduro, se passa a foice, por ser essa a época da ceifa, indicam os tempos atuais e futuros da era do Espiritismo, que vem preparar e efetivar a regeneração da Humanidade e as promessas que as proféticas palavras do Salvador encerram.

Neste momento, o grão, aqui, se está formando; ali, amadurece e, em certas partes escolhidas, já se acha maduro, ou já foi ceifado.

Tais os resultados que o Espiritismo, que apenas há alguns anos apareceu, está produzindo.

Tempestade aplacada

(Mateus, 8:23-27; Lucas, 8:22-25)

35. Nesse dia, ao cair da tarde, disse-lhes Ele: Passemos para a outra margem. 36. E, despedida a multidão, levaram consigo Jesus na barca, onde Ele se achava, outras barcas o seguiam. 37. Levantou-se grande ventania, que, atirando as vagas sobre a barca, a enchiam d’água. 38. Jesus, que se achava à popa, dormia reclinado num travesseiro. Eles o acordaram, dizendo-lhe: Mestre, não se te dá que pereçamos? 39. Jesus, levantando-se, falou ao vento e ao mar dizendo: Cala-te, emudece; o vento cessou e logo reinou grande calma. 40. E Ele lhes disse: Por que sois tão tímidos? Ainda não tendes fé? E todos, cheios de temor, diziam uns aos outros: Quem julgas seja este a quem o vento e o mar obedecem? 41. E eles, possuídos de grande temor, diziam uns aos outros: quem é este que até o vento e o mar lhe obedecem?

Jesus, como governador, diretor e protetor do nosso planeta, a cuja formação presidiu, missão que por si só indica a grandeza excelsa do seu Espírito, tinha, por efeito dessa excelsitude, o conhecimento de todos os fluídos e o poder de utilizá-los conforme entendesse, de acordo com as leis naturais que lhes regem as combinações e aplicações.

Ora, dados esse conhecimento e esse poder, tão fácil lhe era curar uma enfermidade, como aplacar uma tormenta, modificando as condições dos elementos que as produzem, todos de natureza fluídica, fazendo cessar entre eles o desequilíbrio que as ocasiona.

Cumpre ponderar que tais fenômenos visam a um fim providencial o aperfeiçoamento do orbe, em correspondência com o progresso da Humanidade e de tudo o que lhe concerne.

Os que sucumbem, vitimados por eles, são os que escolheram ou se viram obrigados a passar pela prova de terminarem dessa maneira a existência terrena. É o que igualmente se dá com os que perecem nos incêndios, nos terremotos, pela peste, pela fome, pela guerra, etc., visto que nada se dá por obra do acaso; que tudo tem uma justa razão de ser. A pena de talião é uma realidade, do ponto de vista espiritual, para os Espíritos culpados, os quais, amiúde, sentem a necessidade de passar por aquilo que fizeram a outros e então encarnam nas condições apropriadas à satisfação dessa necessidade.

O certo é que tudo segue marcha regular, estabelecida pela onisciência divina, concorrendo tudo para um contínuo progresso, assim de ordem física, como de ordem intelectual e moral. Tudo, pois, em a Natureza, é preparado e conduzido pela ação de Espíritos prepostos à execução dos sábios desígnios de Deus, exercendo-se essa ação de conformidade com as leis naturais e imutáveis que o Supremo legislador do Universo pôs, desde toda a eternidade.

Com o conhecimento perfeito de todas essas leis e com o poder, por assim dizer, divino que possui, em relação ao nosso planeta, a vontade potentíssima de Jesus, o mais graduado daqueles Espíritos, era e foi bastante, para fazer que a tempestade cessasse, o tempo se tornasse de novo calmo e sereno o mar.

Também o homem operará um dia fatos desses, que aos seus olhos ainda assumem as proporções de verdadeiros prodígios, porque grande nele só há o orgulho, causador único da sua extrema fraqueza. Operá-los-á quando, pela elevação dos sentimentos, pelo progresso espiritual, se tornar senhor da ciência do Magnetismo e capaz de praticá-la, sob a influência e o auxílio espíritas, determinando, pelas combinações fluídicas, a atração magnética e todos os demais efeitos decorrentes daquele agente universal. Assim, dia virá em que todos os fatos que presentemente ainda nos maravilham e assombram se nos tornarão familiares. Tal se dará quando houvermos chegado a um alto grau de pureza moral. Ë esta uma verdade, cujo fundamento integral se encontra nas seguintes palavras do divino Mestre: Fareis as obras que eu faço e fareis outras ainda maiores. (João, capítulo 14, versículo 12.)

No estado de inferioridade em que ainda se acha o nosso planeta, as hecatombes, as pestes, a fome e a guerra contribuem para o progresso dos povos, porque são meios de provação e expiação e servem para o desenvolvimento da civilização e da Ciência, de adiantamento moral e intelectual, abrindo ensejos à atividade, à prática do devotamento e da caridade.

São efetivamente flagelos, no sentido de que atingem indistintamente grandes e pequenos; mas, são, principalmente, meios apropriados a lembrar ao homem que todos estamos sujeitos ao poder divino, perante o qual todas as cabeças se encontram à mesma altura. Não devemos, pois, lamentar que tais calamidades se abatam sobre este ou aquele país. Devemos, ao contrário, bendizer do Senhor, “que estende seu flagelo por sobre as massas e pesa na sua balança o valor de seus povos; que manda às nações o progresso e a paz aos homens de boa-vontade”.

Tudo, repetimos, segue marcha regular, objetivando o progresso, assim de ordem física, como de ordem intelectual e moral.

SAYÃO, Antonio Luiz. Elucidações evangélicas. FEB (e-book). 

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