Evangelho segundo Marcos - cap. 11

Entrada de Jesus em Jerusalém. Mercadores expulsos do templo. A casa do Senhor é casa de oração e não, pelo tráfico, um covil de ladrões. Predição da ruína de Jerusalém

(Mateus, 21:1-17; Lucas, 19:28-48)

1. Quando se aproximavam de Jerusalém, ao chegarem a Betânia, perto do monte das Oliveiras, despachou dois de seus discípulos, 2. Dizendo-lhes: Ide àquela aldeia que está em frente de vós; ao entrardes nela, encontrareis amarrado um jumentinho no qual ainda ninguém montou. Desamarrai-o e trazei-me. 3. Se alguém vos perguntar: Que fazeis? respondei: O Senhor precisa dele, e logo vo-lo deixarão trazer aqui. 4. Partiram os dois discípulos e acharam o jumentinho, numa encruzilhada, amarrado do lado de fora de uma porta e o desamarraram. 5. Alguns dos que por ali estavam lhes perguntaram: Que fazeis? Por que desamarrais esse jumentinho? 6. Eles responderam como Jesus lhes determinara e os que os haviam interpelado deixaram que o levassem. 7. Levaram então eles o jumentinho, cobriram-no com suas capas e Jesus montou-o. 8. Muitos também estenderam suas vestes ao longo do caminho, enquanto outros cortavam ramos de árvores e os espalhavam por onde ele passava. 9. E tanto os que iam à frente como os que o seguiam clamavam: Hosana! 10. Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o reino, que vemos chegar, do nosso Pai Davi! Hosana nas alturas! 11. Tendo entrado em Jerusalém, Jesus foi ao templo e, depois de tudo haver observado, como já fosse tarde, se retirou para Betânia com os doze apóstolos.

Versículo 15. Tendo voltado a Jerusalém, Jesus entrou no templo, donde expulsou os que ali vendiam e compravam: derrubou as mesas dos cambistas e os bancos dos que vendiam pombas. 16. Não permitia que ninguém andasse pelo templo carregando qualquer vaso. 17. E ensinava dizendo: Não está escrito que a minha casa será, entre todas as gentes, chamada casa de oração? E, no entanto, fizestes dela um covil de ladrões. 18. Ouvindo isso, os príncipes dos sacerdotes e os escribas cogitavam do modo por que o haviam de perder, pois o temiam porque o povo se mostrava maravilhado da sua doutrina. 19. Ao cair da tarde, saiu ele da cidade.

Aqui, como sempre, o ensinamento do manso Nazareno é o mesmo: a humildade, a santa humildade que purifica o coração, desarma os poderosos, lava de suas impurezas a alma e a leva aos sacratíssimos pés do Altíssimo.

Nem pompa, nem luxo teve a sua entrada em Jerusalém, que se tornou triunfal apenas pelo entusiasmo que suas virtudes despertaram na multidão. Ele era sempre modesto e simples, como a moral que pregava e exemplificava.

Expulsou do templo os vendilhões, dizendo: Não está escrito que a minha casa será, entre todas as gentes, chamada casa de oração? E, no entanto, fizestes dela um covil de ladrões. Essas palavras, entretanto, parece que até hoje não chegaram aos ouvidos de muita gente, pois que inúmeros são ainda os que negociam, comprando e vendendo orações, perdões e indulgências, resgatando crimes a peso de ouro e fazendo das bênçãos do Senhor objeto de vil comércio.

Era este o pensamento que aquelas palavras exprimiam: Desconfiai dos que vendem o perdão e as graças, dos que exploram a credulidade e a ignorância, porquanto praticam roubo, mercando o que lhes não pertence, o que não têm nem mesmo para si.

As palavras dos profetas Isaías (capítulo 42, versículos 1, 2 e 11) e Zacarias (capítulo 9, versículo 9), lembradas pelo Evangelista, encerravam, sob o véu da letra, uma alusão à graduação espírita de Jesus, nosso rei, que até nós desceu. Ë nosso rei, por isso que, preposto por Deus, é o protetor e o governador do nosso planeta, a cuja formação presidiu, encarregado do seu desenvolvimento, do seu progresso e de conduzir à perfeição a Humanidade que o veio habitar.

Mas, na marcha do tempo e do progresso humano, tudo tem a sua razão de ser, segundo a presciência e a sabedoria infinitas de Deus.

A revelação nova, despojando da letra o espírito, nos veio explicar, em espírito e verdade, quem é Jesus Cristo.

Quanto ao tráfico, tendo por objeto o reino de Deus, constitui uma impiedade. Os Judeus, como se sabe, resgatavam suas faltas por meio do sacrifício de vítimas propiciatórias e os mercadores lhes forneciam as vítimas, os vasos com perfumes, o que tudo era trazido para o templo e aí vendido. Essa a origem daquele tráfico. Depois, o negócio se ampliou e o templo, que era considerado a casa de Deus, se tornou sede de toda sorte de transações comerciais. A Bolsa dos tempos atuais, com as suas baixezas, teve um modelo no templo de Israel.

Entretanto, se atentarmos bem nas palavras de Jesus quando dali expulsou os que negociavam, veremos claramente que esse seu ato não obedeceu ao pensamento de defender a pureza de um templo de pedra, apresentando-o como lugar verdadeiramente sagrado, em que tais coisas constituíam uma ofensa à Divindade. Ele, que ensinara ser Deus espírito, e só dever ser adorado em espírito e verdade, estaria em contradição consigo mesmo, se expulsasse do templo os vendilhões, por ser ali a casa de Deus.

O mundo terreno, como todos os que o Criador semeou pelo espaço infinito, é uma das inúmeras casas existentes na infinita morada do Senhor do Universo e é também um templo, onde a cada uma de suas criaturas corre o dever de adorá-lo na prática do amor, cuja lei é a lei das leis. Casa, portanto, de oração, Ele o é igualmente, porquanto orar é trabalhar na obra do progresso comum, trabalhando cada qual pelo seu próprio progresso intelectual e moral.

Preposto pelo Pai à formação e ao governo dessa casa, tem Jesus a devorá-lo, na frase do profeta, o zelo dela e, tomado desse zelo, não obstante o seu amor ilimitado, ou, antes, impelido por esse amor, não hesita em expulsar da casa que lhe foi confiada e que, como tal é a “sua” casa, do templo onde só em espírito e verdade, conforme Ele o ensinou e exemplificou, se deve adorar a Deus, isto é, praticando a caridade, a fraternidade, a justiça e o perdão, aqueles que, mercadejando com as coisas santas, a transformam em covil de ladrões.

Mercadejam com as coisas santas os que, sendo Espíritos, como o são todos os homens, só prestam culto à matéria; os que, em vez do amor, cultivam o ódio, em vez da caridade, praticam a intolerância, movidos pelo egoísmo e pelo orgulho; os que, escravos de paixões subalternas, se esforçam por escravizar ao erro os seus semelhantes, a fim de melhor dominá-los; os que, em suma, se servem das faculdades espirituais, que lhes foram outorgadas para se elevarem gradualmente e se aproximarem do centro de toda a perfeição, empregando-as em rebaixar aquele que é esse centro, para dele fazerem cúmplice de seus delitos e iniquidades.

Esses, os que transformam a casa do Pai em covil de ladrões. Esses, portanto, os que daí serão expulsos, chegado o momento em que da presença deles deva ser expurgado o templo, para não continuarem a constituir-se pedra de escândalo aos que, redimidos pela dor, se hajam tornado capazes da verdadeira oração, da oração do trabalho santificado pelo amor e pela humildade.

E para onde serão expulsos os que sejam encontrados por Jesus no templo a mercadejar com as coisas santas? Para outras casas da morada infinita do Pai, casas que, como templos que também são, outras tantas oficinas de trabalho são igualmente, mas onde o trabalho é mais árduo, mais penoso, mais amargo, tão áspero e doloroso que dará aos que a Ele se vejam compelidos a impressão aflitiva de haverem perdido um paraíso, de terem sido expulsos de um éden, que tal se lhes afigurará o mundo donde foram banidos.

É isso o que Jesus simbolizou no fato, que os Evangelistas referiram, de ter expulsado do templo de Jerusalém os mercadores que lá assentaram suas bancas. Não foi, decerto, repetimos, o zelo por uma edificação material, onde Deus não habita, que o levou a Ele, que pregava a adoração do Pai em espírito e verdade, a vergastar com o látego de fogo da sua palavra de verdade os que ali comerciavam.

Expulsando-os de lá, ensinava, sobretudo, aos homens a expulsar com energia as paixões e os vícios de seus corações que, acima dos mundos, são os templos mais grandiosos que o Senhor, Ele próprio, edificou para ser adorado por seus filhos, templos onde passa a habitar eternamente, desde que neles só se encontrem virtudes os anjos de sua glória.

Dessa expulsão podemos e devemos concluir que tempo virá em que, praticando os homens a lei do amor, não mais eles adorarão o Pai nem no monte, nem em Jerusalém, mas em espírito e verdade, em que, por todas as nações, a Terra será chamada “casa de oração”.

Com a prudência e a habilidade do oculista que, operando a catarata, prepara o cego para ver a luz, os Espíritos do Senhor, como mensageiros do Espírito da Verdade, vêm e virão levantar progressivamente o véu que rouba às vistas humanas a verdade, a fim de que o que era secreto seja conhecido e o que estava oculto se torne patente. Eles vêm e virão encaminhar os homens, mediante a prática da humildade, do desinteresse, da justiça, do amor e da caridade, da renúncia de si mesmos, da indulgência, do perdão e do olvido das ofensas e das injúrias, do devotamento entre todos e por todos, para a verdadeira fraternidade, que só ela pode estabelecer e estabelecerá entre todos, com sinceridade, a igualdade e a liberdade, pela reciprocidade e pela solidariedade, efetivando desse modo a regeneração humana, que o Mestre predisse e prometeu.

E, quando a unidade fraternal estiver consumada, o reino de Deus estará estabelecido. Então, no nosso planeta depurado (nova Jerusalém) aparecerá em todo o seu fulgor espírita o nosso protetor e governador, Jesus nosso Mestre e nosso Rei, e reboará por toda a parte o brado imenso que os homens, regenerados, tornados verdadeiramente irmãos, soltarão em conjunto e em uníssono, como outrora a multidão, quando da sua entrada em Jerusalém: Bendito o rei que vem em nome do Senhor! E os Espíritos que houverem preparado e efetuado a regeneração, a purificação da Humanidade, farão de novo ouvir o cântico dos anjos que conduziram os pastores ao presepe de Belém: Glória a Deus no mais alto dos céus e paz na Terra aos homens de boa-vontade!

Parábola da figueira que secou

12. No dia seguinte, ao saírem de Betânia, ele teve fome, 13, e, divisando ao longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se acharia nela alguma coisa. Aproximando-se, porém, nada achou senão folhas, pois que não era tempo de figos. 14. Disse-lhe então: Nunca mais coma alguém fruto de ti; o que por seus discípulos foi ouvido.

Versículo 20. Na manhã seguinte, ao passarem por ali, viram eles que a figueira secara até à raiz. 21. Pedro, lembrando-se da palavra do Cristo, disse: Olha, Mestre, como a figueira que amaldiçoas-te secou. 22. Respondeu-lhe Jesus: Tende fé em Deus. 23. Em verdade vos digo que aquele que disser a este monte: Tira-te dai e lança-te no mar, sem hesitar no seu coração, crente, ao contrário, de que se cumprirá o que houver dito, verá que assim será feito. 24. Por isso vos digo: Quando orardes, crede que obtereis o que pedis e assim sucederá. 25. Mas, quando vos puserdes a orar, se alguma coisa tiverdes contra alguém, perdoai-lhe, a fim de que vosso Pai, que está nos céus, também vos perdoe os pecados. 26. Porque, se não perdoardes, também vosso Pai, que está nos céus, não perdoará os vossos pecados.

Perguntando-lhe Pedro, que já tinham a percepção das coisas espirituais: Olha, Mestre, como a figueira que amaldiçoaste secou. O Mestre apenas respondeu: tende fé em Deus, o que equivalia a dizer que a sua vontade forte fora a causa determinante do fato que os surpreendia.

O exemplo, de molde a tocar a imaginação dos que o seguiam, fazendo-lhes compreender a necessidade de não serem estéreis em tempo algum, foi também de molde a lhes ensinar o poder e a força da vontade, se apoiada na fé, ensino que era necessário aos seus discípulos, para que fossem instrumentos simultaneamente dóceis e inconscientes dos Espíritos do Senhor, que os assistiriam no desempenho de suas missões, quando Ele, o Mestre, não mais na Terra estivesse.

A figueira secou subitamente, por lhe terem sido retirados da seiva, a uma ordem mental de Jesus, juntamente com a essência espiritual, que foi levada para outro ponto, os fluídos que dão vida à planta e os fluídos necessários à vegetação material.

A parábola da figueira que secou teve por objeto concitar o homem a utilizar a existência terrena, progredindo, mediante a expiação e a reparação de suas faltas, e adverti-lo também de que o Espírito culpado, que até à época em que deva operar-se a separação do joio e do bom grão, permanecer surdo às inspirações de seus guias e dos bons Espíritos, não mais dará frutos na Terra: será rechaçado para mundos inferiores, correspondentes ao grau da sua culpabilidade e às necessidades do seu progresso, do seu adiantamento.

Resposta de Jesus aos príncipes dos sacerdotes, aos escribas e aos anciães do povo

(Mateus, 21:23-32; Lucas, 20:1-8)

27. Voltaram novamente a Jerusalém. E, andando Jesus pelo templo, dele se aproximaram os príncipes dos sacerdotes, os escribas e os anciães. 28. E lhe perguntaram: Com que autoridade fazes estas coisas? Quem te deu o poder de fazer o que fazes? 29. Respondeu-lhes Jesus: Também eu vos farei uma pergunta; respondei-me e depois então vos direi com que autoridade faço estas coisas. 30. O batismo de João era do céu ou dos homens? Respondei-me. 31. Eles se puseram a raciocinar entre si deste modo: Se respondermos que era do céu, ele dirá: Por que, então, não o crestes? 32. Se dissermos que era dos homens, teremos que temer o povo, porque todos consideravam João verdadeiramente um profeta. 33. À vista disso, responderam a Jesus: Não sabemos. Jesus lhes retrucou: Nem eu tampouco vos direi com que autoridade faço estas coisas.

Os que interpelaram o Cristo sobre a autoridade com que Ele fazia aquelas coisas e procedia da maneira que todos viam, eram príncipes dos sacerdotes, escribas e fariseus, os quais, tendo sido testemunhas dos atos de João, não se renderam à evidência. Não havendo percebido em que fonte hauria Ele a sua força, ainda menos compreenderiam e admitiriam o testemunho da sua palavra.

Se lhes respondera que o poder lhe vinha de Deus, houvera-os provocado a apressar o termo da sua missão.

O que deixou transparecer claramente, evitando responder de modo direto à pergunta que lhe fora feita.

SAYÃO, Antonio Luiz. Elucidações evangélicas. FEB (e-book).

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