O centurião
(Mateus,
8:5-13)
1.
Acabando de dizer todas estas coisas ao povo, entrou em Cafarnaum. 2. Um
centurião tinha doente, quase a morrer, um servo que lhe era muito caro. 3.
Tendo ouvido falar de Jesus, o centurião lhe mandou suplicar, por alguns
anciães judeus, que viesse curar o seu servo. 4. Falando a Jesus, os anciães o
imploraram instantemente, dizendo: 5 um homem que merece lhe faças esta graça; 5,
pois que ama o nosso povo e nos edificou uma sinagoga. 6. Jesus se pôs a
caminho com eles; mas, quando chegaram perto da casa do centurião, este lhe
mandou dizer por seus amigos: Senhor, não te dês esse incômodo, pois não sou
digno de que entres na minha casa, 7, como não me julguei digno de ir ter
contigo; dize uma só palavra e o meu servo estará curado; 8, porquanto sou um
homem submetido à autoridade de outro; tenho, sob minhas ordens, soldados e, se
digo a um: vai lá, ele vai; a outro: vem aqui, ele vem; a meu servo: faze isto,
ele faz. 9. Ouvindo isso, Jesus se mostrou admirado e, voltando-se para o povo
que o acompanhava, disse: Em verdade vos digo que ainda não vira em Israel tão
grande fé. 10. E quando para a casa do centurião voltaram os que este mandara a
Jesus, encontraram curado o servo que estava doente.
A cura do servo do
centurião, como a do leproso, também se operou pela aplicação do mesmo
princípio, o princípio magnético, e não por milagre. Assim como a pilha
galvânica pode momentaneamente dar movimento aos músculos e aos nervos de um
cadáver, também a concentração, por efeito magnético, de certos fluídos
espalhados na atmosfera pode operar sobre o organismo vivo um abalo violento
que o regenere.
Na força daquele que, pela ação exclusiva da sua vontade, obtinha tais efeitos é que se poderia ver um milagre; mas, é natural a explicação dessa força. Do mesmo modo que o solo que pisamos se acha juncado de plantas cujas propriedades curativas ainda se não conhecem, também a atmosfera que nos cerca contém propriedades fortificantes, purificadoras e regeneradoras, das quais só aprenderemos a servir-nos quando nos entregarmos a estudos morais, que nos elevem à altura da Ciência que teremos de adquirir para as conhecermos devidamente.
Dizemos estudos morais,
porque só esses estudos nos desembaraçarão dos instintos brutais que escravizam
a nossa vontade, tornando-a capaz de os dominar, de dominar os nossos sentidos,
de aproximar-nos, portanto, da perfeição e de aumentar os nossos poderes.
Somente a depuração moral
nos possibilitará os estudos necessários ao conhecimento dos fluídos magnéticos
dotados daquelas propriedades fortificantes, depurativas e regeneradoras.
Antes mesmo, porém, que
chegue às condições de se utilizar diretamente desses fluídos, poderá o homem
servir-se deles com bom resultado, mediante o auxilio dos Espíritos protetores
da Humanidade, os quais, valendo-se do magnetismo espiritual, lhos colocarão ao
alcance, como, aliás, já o fazem com os médiuns curadores.
Como, porém, a depuração
moral do homem só muito lentamente se vai operando, claro é que ainda muito
tardará que ele se ache apto a manejar sempre com eficácia aqueles fluídos.
Enquanto não atinge esse ponto, cumpre-lhe servir-se, oportuna e
criteriosamente, assim do sonambulismo magnético e do magnetismo humano, como
da ciência médica, que lhe indica as substâncias minerais, vegetais e animais,
possuidoras de propriedades curativas já conhecidas e de outras que ainda virão
a serem descobertas.
Em última análise, todas as
curas, que se obtém pelo uso de substâncias medicamentosas, são produzidas
pelos fluídos a que nos vimos referindo, pois que, quando uma planta, por
exemplo, denota possuir virtude curadora para tal ou qual enfermidade, o que se
dá é que essa planta tem a propriedade de saturar-se, por efeito da lei de
afinidade, dos fluídos apropriados a restabelecer, no organismo humano, o
desequilíbrio fluídico que ali se verificou e que é a enfermidade, fluídos que
ela leva ao dito organismo, quando é nele introduzida, sob esta ou aquela
forma.
Por aí se vê que a medicina
não deve constituir um sistema, mas um meio de restabelecer-se no organismo
aquele equilíbrio, quando desfeito, e a harmonia das forças vitais, quando
perturbada. Os que se consagram à meritória missão de aliviar os sofrimentos
físicos da Humanidade devem entregar-se a profundos e perseverantes estudos
teóricos e experimentais, para poder lançar mão, com oportunidade e proveito,
tanto daquela ciência, adotando o princípio dos contrários, ou o dos
semelhantes, bem como do magnetismo humano e do sonambulismo magnético, visto
que todos esses elementos são do domínio da Natureza.
Cumpre, porém, que o homem
remonte sempre à origem do mal que deseje remediar; que, sobretudo, procure
sempre, em todas as dores físicas, dores orgânicas, bem entendido, a causa
moral de onde elas se geram. É claro que aquele que quebra um braço a nenhuma
dor secreta pode atribuir o fato, ou a maus pendores; mas, nos inúmeros males
que afligem o gênero humano, se pesquisarmos o fundo dos corações e das
consciências, encontraremos sempre a raiz dessa árvore que se estende por sobre
todos os membros. O coração ou a alma estão quase sempre atacados. Daí a
perturbação do sistema nervoso, fonte de todas as enfermidades, de todos os
sofrimentos. Perscrute o que sofre os seus antecedentes e descobrirá muitas
vezes o pesar oculto de uma ação, um acontecimento que interessou a saúde,
viciando o sangue que deve circular puro nas veias.
Em
verdade vos digo que ainda não vira em Israel tão grande fé.
—Assim dizendo, quis Jesus assinalar que filho de Deus, no sentido particular
em que Ele usava dessa locução, é todo aquele que em Deus tem fé, seja judeu ou
gentio; que ter fé em Deus não é privilégio desta ou daquela seita religiosa; e
que o que tem fé, seja ele o que for, Deus não o rejeita, como faz a Igreja
Romana com os que não se lhe curvam ao jugo, aos quais ela não só repele do seu
seio, como presunçosamente os declara repelidos do Senhor.
Orgulhosa dos bens que
recebeu, não admite lhe caiba reparti-los, esquecida do caso da Cananeana, de
quem Jesus, para dar sublime ensinamento, provocou uma resposta, que foi
formulada nos seguintes termos: O cãozinho se nutre das migalhas que caem da
mesa de seu dono. (MATEUS, capítulo 15, versículo 27; MARCOS, capítulo 7,
versículo 28.)
Chamada a continuar a obra
dos primeiros cristãos, a Igreja começou a desempenhar com zelo a sua tarefa; mas
o êxito a embriagou e ei-la sacrificando a Mamon, esquecida da humildade do
Mestre divino e dos princípios evangélicos, repelindo, cheia de orgulho, os que
procuram abrir-lhe os olhos e opondo-se, pelas conveniências políticas, até às
conversões à religião ortodoxa! O véu dos interesses inconfessáveis, da ânsia
de predomínio dos mistérios, lhe impede completamente a visão da luz. Esse véu,
porém, será arrancado, porque Deus o quer. A grandiosidade dos ensinos
espíritas, a verdade da ciência espírita irão tirando uma a uma as camadas de
obscurantismo que os séculos no seu perpassar lhe colocaram em cima,
ocultando-lhe a luz.
A Igreja do Cristo tem por
templo o nosso planeta, por fiéis todos os que praticam a sua moral simples e
sublime e por sacerdotes todos os corações puros que arrebanham os Espíritos
transviados, para reconduzi-los Àquele que empunha o grande cajado de pastor.
Mas os filhos do reino serão lançados nas trevas exteriores (capítulo 8,
versículo 12 de MATEUS). Isto significa que os que receberam a palavra do
Senhor e dela não fizeram o uso que deviam fazer; que os que se julgavam
salvos, pela única razão de suporem com o direito de absolver e de condenar,
serão pesados na mesma balança em que pesavam os outros e passarão na
erraticidade pelas torturas morais apropriadas a fazê-los aperfeiçoar-se.
O filho da viúva de Naim
11. No dia seguinte, Jesus
se dirigiu para uma cidade chamada Naim, acompanhado por seus discípulos e por
grande multidão. 12. Ao aproximar-se da porta da cidade, aconteceu-lhe ver que
levavam a enterrar um morto que era filho único de sua mãe, sendo esta viúva;
grande número de pessoas da cidade a acompanhava. 13. Vendo-a, o Senhor se
encheu de compaixão por ela e lhe disse: Não chores. 14. Aproximou-se e tocou o
esquife; os que o levavam pararam e ele disse: Mancebo, levanta-te, eu o
ordeno. 15. No mesmo instante aquele que estava morto se sentou e começou a
falar e Jesus o restituiu à sua mãe. 16. Todos os presentes foram tomados de
espanto e glorificaram a Deus, dizendo: Um grande profeta surgiu entre nós e
Deus visitou o seu povo. 17. O rumor desse milagre se espalhou por toda a Judeia
e por todas as suas cercanias.
Quando se encontra num
desses estados de repouso a que chamamos sono, síncope, catalepsia, o corpo
físico se acha separado da inteligência que o anima. Em tais casos, o Espírito
readquire uma liberdade momentânea e limitada, permanecendo, porém, ligado ao
corpo de que se separou, por uma como cadeia elétrica, que é o laço fluídico do
perispírito, laço que o reconduz ao invólucro material, logo que as
necessidades humanas o determinam.
Não há então morte real,
porque desta não há despertar material, uma vez que a vontade imutável do
Senhor jamais força o Espírito a se unir à podridão, que começa, pela
decomposição da matéria corporal, desde o instante em que se rompe
definitivamente aquele laço fluídico.
No caso do filho da viúva de
Naim, como no da filha de Jairo e no de Lázaro e, ainda, em todos os outros de
ressurreição de mortos aos olhos dos homens, esse laço não se quebrara, a morte
era apenas aparente, O que, portanto, em todos eles, fez Jesus foi chamar os
prisioneiros aos cárceres de carne, donde se haviam afastado, e eles volveram
imediatamente.
Nenhuma outra causa nem
outra explicação qualquer têm os fatos desta natureza, constantes assim do
Velho, que do Novo Testamento.
Desde que o Espírito tenha
voltado à sua vida primitiva, à vida espírita, não lhe é mais possível retornar
à vida corporal humana, a não ser por meio da reencarnação, isto é, renascendo,
de acordo com as leis naturais e imutáveis da reprodução, vigentes na Terra.
Discípulos de João mandados por este a
Jesus
(Mateus,
11:2-6)
18.
Os discípulos de João lhe referiram todas as coisas que Jesus fazia. 19. E João
chamou dois deles e os mandou a Jesus para lhe perguntarem: És aquele que tem
de vir ou é outro o que esperamos? 20. Esses homens, encontrando Jesus, lhe
disseram: João Batista nos mandou aqui para te perguntarmos se és aquele que
tem de vir ou se é outro o que esperamos? 21. Nesse mesmo instante, Jesus curou
muitas pessoas de enfermidade e chagas e dos maus espíritos e restituiu a vista
a muitos cegos. 22. Em seguida, respondendo aos discípulos de João, disse: Ide
narrar a João o que vistes e ouvistes: que os cegos veem, que os coxos caminham,
que os leprosos estão curados, que os surdos ouvem, que os mortos ressuscitam,
que o Evangelho é pregado aos pobres. 23. E bem-aventurado aquele que não se
houver escandalizado de mim.
A fama levara a João o rumor
dos atos de Jesus, João, porém, não tinha certeza de que Jesus fosse quem devia
ser. Enviou-lhe pôr isso dois de seus discípulos, para verificarem se se não
tratava de algum hábil impostor. Foi, portanto, para lhe comprovar a
identidade, que João mandou seus emissários ao Cristo. O Precursor queria
certificar-se de que Jesus era realmente aquele cuja vinda ele anunciara.
Quanto aos chamados
“milagres” que Jesus praticou em presença dos discípulos de João, já sabemos
como Ele os operava.
Os pobres, a quem o divino
Mestre se referia, falando mais para aquela época do que para o futuro, eram os
que se viam abandonados, desprezados, eram os que de ninguém mereciam atenção
alguma. De modo geral, pobres são todos os que, sentindo a necessidade de
enriquecer-se com a palavra evangélica, se dispõem a ouvi-la.
Todo aquele que não aceita a
moral do Cristo, o repele. Feliz, pois, do que lhe acolhe os preceitos e os põe
em prática, porque progride e não tem que temer uma repulsa.
João, precursor, e Jesus. Pedra
fundamental do edifício da regeneração. Missão nova e futura de João
(Mateus,
11:7-15)
24.
Logo que se foram os mensageiros de João, entrou Jesus a falar deste à turba:
Que é o que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? 25. Que é,
pergunto, o que fostes ver? Um homem vestido de finas roupas? Sabeis que nas
casas dos reis é que se encontram os que se vestem magnificamente e vivem nas
delícias. 26. Que é, então, O que fostes ver? Um profeta? Sim, certamente, eu
vo-lo digo, e mais que profeta; 27, porquanto, dele é que está escrito: Eis que
envio, na tua frente, o meu anjo, que te preparará o caminho adiante de ti. 28.
Pelo que, eu vos digo que, dentre os que hão nascido de mulher, nenhum ainda
houve maior do que João Batista; mas aquele que for o menor no reino de Deus é
maior do que ele. 29. E todo o povo e os publicanos que o ouviram se submeteram
aos desígnios de Deus recebendo de João o batismo. 30. Mas os fariseus e os
doutores da lei desprezaram os desígnios de Deus para com eles, não se fazendo
batizar por João.
16:16.
A lei e os profetas duraram até João; a partir daí, o reino de Deus é pregado
aos homens e cada um lhe faz violência.
Falando de João nesses
termos, Jesus dava testemunho da missão que o Precursor viera desempenhar,
assim como anunciava a nova e futura missão que ele desempenhará, e lançava a
pedra fundamental em que assentaria o edifício da regeneração, edifício que se
vai erguendo, embora lentamente.
A época do aparecimento de
Jesus na Terra, sob a forma corporal humana, nos é indicada como básica do
progresso que nas ideias se havia de produzir. Elas, de fato, se elevaram,
fracamente é certo, mas o bastante para se despojarem do envoltório material
que as constrangia e tendem, cada vez mais, a se elevar para as regiões
espirituais. Pois bem, para o acabamento dessa empresa, para a continuação da
obra de Jesus, é que trabalham os Espíritos elevados, sob as vistas e a direção
do Mestre.
Versículos 26 e 27.
Exprimindo-se dessa forma, Jesus testificava que o Espírito de João já atingira
um grau de elevação muito mais alto do que os dos profetas. Comparava estes
últimos, nas diversas épocas em que apareceram, com Elias reencarnado como
Precursor, para, apontando a extensa linha de progresso que fora percorrida,
mostrar que o Elias de então já era muito mais do que o Elias dos Hebreus.
Podemos, em consequência, imaginar qual será a grandeza desse Espírito, do
ponto de vista do poder e da ciência, quando desempenhar a sua missão espírita,
assinalando com essa missão a sua nova passagem pela Terra.
Referimo-nos ao seu progresso
em ciência universal, que é, conforme se sabe, indefinido e não limitado, como
o progresso moral, cujo limite o Espírito atinge no seio de Deus, alcançando a
perfeição moral.
Versículo 28. O pensamento
de Nosso Senhor Jesus Cristo, ao declarar que, dentre os varões nascidos de
mulher, João era o que mais alto se achava colocado, espiritualmente falando,
foi, em primeiro lugar, fazer sentir, embora deixando velada pela letra essa
verdade, que Ele, Jesus, não nascera de mulher. Em segundo lugar, quis revelar
a existência de outros Cristos, isto é, de outros Espíritos que, havendo
percorrido sempre, sem desvios, a linha reta do progresso, chegaram à suprema
pureza, sem terem necessidade de descer ao ventre da mulher, a fim de passarem
por provações, a fim de provarem a morte, segundo a sua própria linguagem.
A esses Espíritos é que o
divino Mestre comparava o de João, para afirmar que, mal grado à extraordinária
elevação deste, ele era menor do que o mais pequenino no reino dos céus. Vê-se
assim que do fato de se achar encarnado o seu Espírito é que Jesus tirava
fundamento para a afirmativa que fez, porquanto esse fato constituía a prova
formal de que aquele Espírito ainda não galgara os cumes supremos da pureza,
visto que os que a tais altitudes chegam ficam, em absoluto, excluídos da ação
da lei das encarnações e reencarnações, que é o que já se verificara com Jesus,
antes mesmo que o nosso mundo se formasse.
Sofrendo, como estava, os
efeitos dessa lei, a João se lhe velara o passado. Tal qual sucede a todos os
encarnados, ele esquecera suas anteriores existências, como era necessário,
pois, a não ser assim, nenhum mérito lhe adviria do desempenho da missão de
Precursor, se sempre tivesse diante dos olhos tudo quanto fizera como Elias, o
profeta; se a todos os momentos pudesse apreciar os feitos do venerando
legislador, de cujas mãos recebera o povo hebreu as tábuas da lei, o Decálogo.
O Elias que tinha de vir
veio, de fato, na pessoa de João que, concluída na Terra a sua missão de
Precursor, continuou e continua a desempenhá-la na espiritualidade, trabalhando
para que progrida o planeta terreno e a sua Humanidade, preparando o novo
advento de Jesus, como Espírito da Verdade, como complemento e sanção da
verdade. E, ao abrir-se, como agora se abre, a era nunciativa desse advento, a
era espírita, ele novamente clama ao povo, a todo o povo da Terra, aos
publicanos, aos escribas, aos fariseus e aos doutores da lei em nossos dias:
Fazei penitência, arrependei-vos, arrependei-vos, que se aproxima a hora do julgamento,
pois que a morte, de um instante para outro, vos pode surpreender e entregar os
vossos Espíritos culpados à expiação na erraticidade e, depois, às aflições e
angústias das reencarnações.
Purifiquemo-nos, para sermos
recebidos na morada celeste, onde só têm entrada os eleitos, isto é, os puros,
condição a que todos havemos de chegar, visto que para o Senhor não há eleitos,
nem réprobos, segundo as falsas interpretações humanas. Só, porém, os que se
tornam puros podem acercar-se do centro da Onipotência. Notemos que,
confirmando ser João a reencarnação do Espírito Elias, o divino Mestre não
disse: “João é o Elias que havia de vir”, mas: "João é o Elias que há de
vir”. Assim, além de confirmar a presença de Elias entre os homens na pessoa de
João, anunciou o seu futuro reaparecimento na Terra, sempre como Precursor.
Trará então, por missão especial, o alargamento do círculo das ideias e
conhecimentos humanos, o fortalecimento do amor universal e, portanto, da
caridade e da fraternidade que lhe são consequentes.
A partir de João, o reino de
Deus é pregado aos homens e cada um lhe faz violência. É figurada esta
linguagem, significando que ninguém se aplica a fazer o que deve, para alcançar
o reino de Deus, para realizá-lo em sua alma, que é o meio de chegar a ele,
conforme ensinou Jesus. Cada um procura criar para si um reino da Terra,
caracterizado por honras extraordinárias e imenso poderio, e tenta violentar a
entrada do reino de Deus, por meio da hipocrisia, ou do anátema.
João e Jesus incompreendidos pelos
Hebreus, João e Jesus compreendidos hoje pelos que são os filhos do Senhor
(Mateus,
11:6-19)
31.
Disse o Senhor: Com que compararei os homens desta geração? A quem se
assemelham? 32. Assemelham-se a meninos que, sentados na praça pública e
falando uns para os outros, dizem: Tocamos flauta para vós e não dançastes;
entoamos lamentações e não chorastes. 33. João Batista veio e, porque não come
nem bebe vinho, dizeis: Está possesso do demônio. 34. O filho do homem veio,
come e bebe e dizeis: É um comilão e beberraz, amigo dos publicanos e dos
pecadores. 35. Mas a sabedoria é justificada por todos os seus filhos.
Usando, mais uma vez, de
linguagem apropriada à capacidade intelectual dos que o ouviam, Jesus, por
essas palavras, mostrava aos homens que suas inteligências rebeldes recusavam
todos os testemunhos da verdade, quaisquer que fossem, propensos sempre a
procurarem, no que observavam, uma razão de ser estranha à bondade de Deus, não
se rendendo nem mesmo à evidência.
Mas,
a sabedoria é justificada por todos os seus filhos.
Quer isto dizer que um dia os homens haviam de compreender tudo aquilo a cuja
compreensão obstava o atraso deles na senda do desenvolvimento e do progresso.
É assim que, de fato, hoje compreendemos.
São filhos de Jesus os que
se tornaram capazes de apreender as verdades que, quando cegos, negaram e que
ainda são negadas pelos que continuam cegos.
Para bem cumprir a missão
que lhe fora confiada, João adotara uma vida de austeridade extrema, de
abstinência e insulamento, com o que dava, como Precursor, o ensino e o exemplo
da penitência que viera pregar e que tinha por emblema, por símbolo, o batismo
às margens do Jordão, sendo a sua palavra o meio de os homens se prepararem
para entrar no caminho que leva ao Senhor. Surpreendidos com aquela existência
excepcional e não a podendo compreender, seus contemporâneos o tinham por
vítima de uma obsessão.
Jesus, contrariamente, vivia
entre os homens, a fim de lhes mostrar o que é praticar o amor e a caridade, a
fim de vulgarizar, por assim dizer, todas as virtudes que pregava e de que era
modelo, tornando-as compreensíveis. Para esse efeito, comia à mesa do pobre,
passava a noite sob o teto do publicano, embarcava com os pescadores,
oferecendo desse modo edificantes exemplos aos orgulhosos, que, entretanto, por
isso mesmo que o eram, o acusavam de se comprazer nos centros abjetos da
sociedade de então.
Jesus, em suma, veio, como
bem já o compreendemos, curar os enfermos, da alma principalmente, salvar os
que se achavam perdidos, encorajar os desesperados. Mas, sabendo que assim foi
e é, já teremos aproveitado dos seus exemplos, já estaremos dispostos a pô-los
em prática, a nos engrandecermos vencendo pela caridade, pelo amor, pela
humildade, o oceano de lama que a todo o momento ameaça tragar-nos?
Sigamos todos nós, homens da
Terra, e, principalmente, os que somos espíritas, o exemplo de Jesus, sem nos
preocuparmos com as opiniões e os conceitos dos escribas e fariseus de hoje, os
orgulhosos da nossa época. Entremos desassombrados na choupana do pobre e vamos
comer com os desgraçados, com os réprobos do mundo; levemos-lhes o que pudermos
desse alimento que os sustentará pelos séculos em fora: o pão da vida, que
nutre a alma, clareia a inteligência e purifica o coração!
Pecadora que banha de lágrimas os pés de
Jesus e os enxuga com seus cabelos, derramando bálsamo sobre eles
36.
Tendo-lhe um fariseu pedido que em sua casa fosse comer, Jesus entrou na casa
do fariseu e tomou lugar à sua mesa. 37. Logo uma pecadora da cidade, sabendo
que Jesus estava à mesa em casa desse fariseu, aí veio ter trazendo um vaso de
alabastro cheio de bálsamo; 38, e, colocando-se por trás dele, se pôs a
banhar-lhe de lágrimas os pés, a enxugá-los com os cabelos, ao mesmo tempo que
os beijava e os ungia com o bálsamo. 39. Vendo isso, o fariseu que o convidara
disse de si para si: Se este homem fora profeta, saberia quem é esta mulher que
o toca, que é uma pecadora. 40, Jesus então lhe disse: Simão, tenho alguma
coisa a te dizer. Ao que ele respondeu: Mestre, fala. 41. Um credor, disse
Jesus, tinha dois devedores; um lhe devia quinhentos denários e o outro
cinquenta. 42 Como não tivessem com que pagar, o credor perdoou as dividas a
ambos. Qual dos dois, em consequência, mais o estimará? 43. Simão respondeu:
Creio que aquele a quem ele mais perdoou. Jesus lhe retrucou: Julgaste bem. 44.
E, voltando-se para a mulher, disse ainda a Simão: Vês esta mulher? Entrei na
tua casa, não me deste água para lavar os pés, enquanto que ela, ao contrário,
mos banhou com suas lágrimas e os enxugou com seus cabelos. 45. Não me deste
ósculo e ela, desde que entrou, não cessa de me beijar os pés. 46. Não me
ungiste com bálsamo a cabeça, ao passo que ela me unge com bálsamo os pés. 47.
Eis te declaro que muitos pecados lhe são perdoados, pois que ela muito amou.
Aquele a quem menos se perdoa menos ama. 48. E disse à mulher: Teus pecados te
são perdoados. 49. Os que com ele estavam à mesa começaram a dizer entre si:
Quem é este que até perdoa os pecados? 50. Jesus disse ainda à mulher: Tua fé
te salvou; vai em paz.
O fato referido nestes
versículos constitui um exemplo da influência que o arrependimento tem sobre os
destinos do homem. Por isso é que repetidamente se nos diz que nos arrependamos
de nossos pecados, se queremos salvar-nos, que se nos aconselha a penitência.
Maria, a Madalena, a
pecadora de Magdala, obteve o perdão de suas culpas, não por haver banhado os
pés de Jesus com bálsamo e com lágrimas, mas porque esse ato foi a consequência
do pesar profundo que lhe causavam suas faltas, do arrependimento sincero de
que se achava possuída e por serem imensas sua fé e sua esperança naquele
diante do qual se prosternava.
Mulher de costumes livres,
vaidosa da sua beleza, não hesitou, uma vez tocada de viva mágoa dos seus
erros, em se humilhar, enxugando com os cabelos aqueles pés que o seu
arrependimento inundava de lágrimas, em sacrificar a esse arrependimento os
perfumes que serviam para mais sedutora torná-la e que se santificavam ao
contacto com o Santo dos Santos. Foi o testemunho mais alto e mais eloquente
que ela podia dar, aos homens, porquanto Jesus lhe perscrutava os arcanos do
coração, de renunciar ao seu passado de desordens e foi, ao mesmo tempo, a mais
positiva promessa, que podia fazer, de reparação no futuro.
Longe de a censurarmos,
imitemos todos, todos, a Madalena, prostrando-nos aos pés de Jesus e
derramando-lhe na fronte os inebriantes perfumes que nos perdem. Façamo-lo, e
de sua boca ouviremos palavras de paz, de consolação e de amor, pois que a Ele
e só a Ele deu o Pai onipotente o poder de ligar e desligar na Terra e no céu,
poder que os apóstolos também exerciam sob a sua obediência, e inspirados e
guiados pelos Espíritos superiores.
Duas circunstâncias devemos
assinalar, no caso de Maria Madalena, porque explicam o procedimento que teve
Jesus e servem para nossa orientação. Em primeiro lugar, conquanto fosse mulher
de vida dissoluta, possuía um coração compassivo, sensível à miséria de seus
semelhantes. Era de natureza fraca e impressionável, donde as suas quedas;
porém, era a sua caridade tão grande, que jamais um infortúnio apelara em vão
para a sua piedade, que jamais um desgraçado lhe batera a porta e não
encontrasse a compaixão e o devotamento, levado este até à abnegação. Essa a
razão por que Jesus pôde dizer ao fariseu, que o convidara para a sua mesa com
o intuito de descobrir nele algum ponto vulnerável, tanto que facilitara à
pecadora entrar-lhe em casa: “Eis te declaro que muitos pecados lhe são
perdoados, porque ela muito amou”. O amor de que Ele falava era o amor
considerado do ponto de vista da caridade, do desprendimento, da piedade.
Em segundo lugar, a fé que
Jesus inspirou a Maria Madalena foi que lhe abriu os olhos para o próprio
proceder e a levou a se arrepender profundamente deste. A comparação entre a vida
sem mácula do Mestre e os inumeráveis excessos da sua vida de pecadora foi o
que a impressionou e impeliu a vir, cheia de arrependimento sincero, rogar, em
preces fervorosas, prostrada aos pés daquele a quem considerava um enviado
celeste, o perdão de suas faltas. Jesus, que lhe lia no fundo da alma a
disposição de não mais falir, de se regenerar, lhe concedeu a graça suplicada,
graça cuja obtenção, aliás, está ao alcance de qualquer pecador, desde que vivo
seja o seu remorso e verdadeiro o seu arrependimento, como os tinham aquela
pecadora; porquanto a graça não é o que a Igreja humana forjou.
A graça, o mesmo que o
perdão, de que já tratamos longamente, tem por efeito abrir ao culpado as vias
da reparação, que então lhe não é duramente imposta, como sucede nos casos de
culpados endurecidos, mas facultada de maneira a ser feita com felicidade, com
alegria, visando sempre o pecador efetuar o progresso que deixara de realizar e
entrar de novo em graça perante o amor do Pai.
Assim foi que o fariseu
Simão, que pretendera armar a Jesus uma cilada, a fim de apanhá-lo em falta,
lhe proporcionou ensejo para uma lição edificantíssima, adequada àquela época e
ao futuro.
Submissamente imploremos ao
Espírito ora purificado Maria Madalena (1) que por nós interceda junto ao Nosso
Divino Mestre e Senhor, para que também saibamos arrepender-nos e merecer-lhe o
perdão que nos salvará.
(1) Explanando o caso de
Maria Madalena, o autor destas “Elucidações Evangélicas” o dá como sendo Maria
de Betânia, irmã de Marta e de Lázaro, a qual, durante uma ceia a que Jesus
esteve presente nessa aldeia, seis dias antes da Páscoa, também lhe ungiu os
pés com perfumes e os enxugou com os próprios cabelos, segundo referem os
Evangelhos de Mateus (capítulo 26, versículos 1 ao 13), de Marcos (capítulo
14, versículos 1 ao 9) e de João (capítulo 12, versículos 1 ao 8.)
Parecendo-nos manifesta aí a
confusão, que, aliás, outros comentadores das letras evangélicas têm feito, de
dois episódios diversos, ocorridos em ocasiões diferentes, um quando Jesus
principiava a desempenhar a sua missão, o outro quando já esta se aproximava de
seu termo, diversidade que se patenteia não só das palavras que a propósito de
cada um proferiu o divino Mestre, como dos comentários que a um e outro fizeram
os Evangelistas na obra “Revelação da Revelação”, em que esta se baseia,
suprimimos, neste passo, todas as referências a Maria de Betânia, cujo ato,
semelhante ao da Madalena, é estudado adiante, a propósito dos versículos 1 à
13 do capítulo 26 de MATEUS e dos versículos 1 a 9 do capítulo 14 de MARCOS.
Ainda duas outras
circunstâncias nos induziram a levar a efeito essa supressão, que nos julgamos
no dever de assinalar, como revisor da presente obra. A primeira é que, nela,
quando se comenta o episódio em que foi protagonista a irmã de Marta e de
Lázaro, nenhuma alusão há ao de Maria Madalena, como seria natural e lógico que
houvesse, desde que de um só fato se tratasse, já considerado anteriormente, e
não de dois.
A segunda é que Bittencourt
Sampaio, em a sua Divina Epopeia, nas “Notas ao Canto 12”, páginas. 417, in
fine, e 418, depois de mostrar que os episódios são diversos, conclui, dizendo:
“Não se confunda, pois, a ação praticada por Maria, irmã de Marta e de Lázaro,
com o que fizera a pecadora em casa do fariseu, numa cidade da Galileia, no
começo da missão de Jesus”. (Nota do revisor, Dr. Guillon Ribeiro, por ocasião
da segunda edição desta obra.)
SAYÃO, Antonio Luiz. Elucidações evangélicas.
FEB (e-book).
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