Transfiguração de Jesus no Tabor.
Aparição de Elias e de Moisés. Nuvem que cobriu os discípulos Voz que saiu
dessa nuvem e palavras que proferiu
(Mateus,
17:1-9; Lucas, 9:28-36)
1. E
acrescentou: Em verdade vos digo que, entre os que aqui se acham, alguns há que
não morrerão sem que tenham visto chegar o reino de Deus em seu poder. 2. Seis
dias depois, Jesus chamou de parte a Pedro, a Tiago e a João e os levou consigo
a um alto monte e se transfigurou diante deles. 3. Suas vestes se tornaram
brilhantes e alvíssimas como a neve, de uma brancura tal como nenhum pisoeiro
na terra poderia conseguir. 4. E lhes apareceram Elias e Moisés a falarem ambos
com Jesus. 5. Disse Pedro então a Jesus: Mestre, aqui estamos bem; façamos três
tendas: uma para ti, uma para Moisés e uma para Elias. 6. Ele não sabia o que
dizia, pois todos três estavam aterrorizados. 6. Uma nuvem se formou e os
cobriu; e dela uma voz saiu, dizendo: Este é meu filho muito amado, escutai-o. 7.
Logo, porém, olhando à volta de si, a ninguém mais viram, senão a Jesus. 8.
Quando desciam do monte, Jesus lhes ordenou que a ninguém falassem do que
tinham visto, até que o filho do homem houvesse ressuscitado dentre os mortos. 9.
E eles guardaram segredo do fato, excogitando entre si o que quereria dizer:
Até que o filho do homem ressuscite dentre os mortos.
O fenômeno, que se produziu
no monte Tabor, em presença de Pedro, Tiago e João, foi uma formidável
manifestação espírita, que teve por fim mostrar a elevação espiritual de Jesus,
afirmar a sua missão como Cristo, filho do Deus vivo, Cristo de Deus, e
enunciar, sob um véu que a nova revelação levantaria mais tarde, as promessas
para o futuro. Retomando, momentaneamente, diante daqueles discípulos, por meio
da transfiguração, os atributos da natureza que lhe era própria, se bem que
velados ainda, pois de outro modo eles não lhes teriam podido suportar o
brilho, Jesus lhes dava uma ideia da sua grandeza espiritual e da glória da
vida por que eles ansiavam.
A presença, visível para os discípulos, de Moisés e Elias que, como outros Espíritos, tanto e ainda mais elevados, rodeiam incessantemente a Jesus, foi um meio de que se serviu este para lhes ferir a imaginação e de, por assim dizer, confirmar, diante dos mesmos discípulos, a sua elevação espiritual e que Ele era o Cristo, o Messias prometido. Ambos, Moisés e Elias, haviam anunciado o Messias; a presença ali dos dois como que sancionava e santificava, aos olhos dos Apóstolos, a missão que Ele, Jesus, desempenhava.
A voz que saiu da nuvem e
que se foi perdendo no espaço, depois de haver dito: Este é o meu filho bem-amado, em quem pus todas as minhas
complacências; escutai-o, afirmava, dessa forma, em nome do Todo-Poderoso,
do Pai, a missão de Jesus, como sendo o Cristo, filho do Deus vivo.
Atestando, aquela presença,
a intervenção dos Espíritos junto dos homens, o fato de que tratamos foi a
revelação, aos apóstolos, da realidade das manifestações espíritas. Constituía,
pois, uma promessa feita para o futuro, promessa que se cumpre agora, quando
tais manifestações se produzem ostensivamente por toda a parte, explicadas e
tornadas compreensíveis pela Nova Revelação outorgada ao mundo mediante tais
manifestações. Verifica-se, pois, que são chegados os tempos então preditos.
Nessas condições, a Revelação Espírita é bem o outro Consolador, o Espírito da
Verdade, que Jesus, o Messias prometido por Moisés e Elias, a seu turno
prometeu. Assim como há dois mil anos se cumpriu a promessa desses dois grandes
profetas, hoje se cumpre o que prometeu Aquele cujo advento constituíra objeto
daquela promessa.
Escolhidos por serem os que
apresentavam condições físicas mais favoráveis a torná-los aptos,
mediunicamente, à produção da manifestação espírita que se ia dar, os três
discípulos, Pedro, Tiago e João, caíram nesse estado de sonolência, de torpor,
em que ficam os médiuns, quando se dá uma forte manifestação espírita. E o fato
da transfiguração se produziu para eles, com o esplendor correspondente à
elevação dos Espíritos que no mesmo fato tomavam parte. Os Espíritos, como o
ensina a Doutrina Espírita, têm a faculdade de tornar-se visíveis e tangíveis,
sob a forma humana, e transfigurar-se, reunindo em torno de si os fluídos
luminosos que sejam necessários ao fenômeno.
A resplendecia que tomaram
as vestes de Jesus, as quais, segundo diz o Evangelista, eram de alvura tal,
que nenhum pisoeiro da Terra jamais poderia consegui-la, foi uma confirmação da
elevação sem par do Cristo, pois que aquelas palavras, entendidas em espírito e
verdade, significam que na Terra ninguém jamais poderia igualá-lo em elevação.
Com efeito, ainda quando haja alcançado a perfeição sideral, isto é, se tenha
tornado puro Espírito, qualquer dos que encarnem no nosso planeta será sempre
menos adiantado do que Jesus: ser-lhe-á inferior em ciência universal. Ë que
Jesus, Espírito que, como todos os demais, teve a mesma origem, partiu do mesmo
ponto de inocência e ignorância, havendo chegado sem o menor desvio, sem a mais
ligeira falta, sem se afastar jamais da diretriz traçada pelas leis do Pai, à
suprema perfeição moral, continuou e continua a progredir em ciência universal,
visto que esse progresso é indefinido. Assim sendo, nunca poderá Ele ser
alcançado, na senda desse progresso, por qualquer outro Espírito que haja
retardado a marcha da sua evolução, do seu aperfeiçoamento moral, por efeito de
uma transgressão que seja daquelas leis.
Quanto mais elevado, tanto
mais luminoso se revela o Espírito às vistas humanas. Do mesmo modo, quanto
mais elevado é um planeta na escala dos mundos, tanto mais branca e refulgente
é a sua luz. Os mundos espirituais, que qualificamos de celestes, aos quais só
têm acesso os puros Espíritos, são, na hierarquia dos mundos, os que projetam
luz mais branca e mais brilhante. Também entre os puros Espíritos, que em
pureza são todos iguais, por haverem todos chegados à perfeição moral, há
hierarquia, sob o ponto de vista da ciência universal, pois que se distinguem
pela soma de suas aquisições intelectuais. Todos, através da eternidade, se vão
cada vez mais aproximando de Deus, tendo do Criador mais perfeito conhecimento,
sem, no entanto, poderem jamais igualá-lo, nem abrangê-lo com o olhar, ou lhe
suportar as irradiações, quando se acercam do foco da onipotência, para se
inspirarem nas vontades daquele que é o Pai de tudo o que é.
A recomendação que Jesus fez
aos discípulos, para que a ninguém falassem do que tinham visto, até que Ele
houvesse ressuscitado dentre os mortos, obedeceu à razão de que, se os
discípulos divulgassem imediatamente os fatos que presenciaram, antes de
verificar-se o que se chamaria a “ressurreição” do mesmo Jesus, ninguém lhes
daria crédito.
O fenômeno da transfiguração
do Divino Mestre, assim como a de um Espírito muito elevado, nada tem de comum
com o da transfiguração do ser humano. Naqueles casos, há ação exclusiva do
Espírito sobre o seu corpo perispirítico; nos outros, há necessidade de uma
combinação do perispírito do Espírito que opera com o do encarnado que lhe serve
de instrumento, sendo, portanto, aparente a transfiguração, visto que resulta
do aspecto que o desencarnado dá aos fluídos em que envolve o encarnado.
O Espírito de Elias reencarnado na
pessoa de João, o precursor
10.
E o Interrogavam, dizendo: Por que é que os fariseus e os escribas dizem ser
preciso que primeiro venha Elias? 11. Jesus lhes respondeu: É verdade que Elias
tem que vir primeiro e restabelecer todas as coisas; que sofrerá muito e será
desprezado, como está escrito a respeito do filho do homem. 12. Mas eu vos digo
que Elias já veio e que eles o trataram como lhes aprouve, de acordo com o que
a respeito dele fora escrito. 13. Vindo ter com seus discípulos, viu Jesus que
grande multidão os cercava e que com eles alguns escribas discutiam.
Chamando a atenção dos
discípulos para o fato de haver Elias voltado à Terra na pessoa de João
Batista, Jesus assentava as bases da Revelação Espírita, que Ele, mais tarde,
no seu colóquio com Nicodemos, deixaria veladamente entrever e que, depois, os
Espíritos do Senhor trariam aos homens, nos tempos marcados por Deus,
explicando-lhes, em espírito e verdade, a lei natural e imutável da
reencarnação, seu princípio fundamental, suas regras, fins e consequências.
Talhava assim Jesus a pedra angular sobre que repousaria o edifício do futuro.
Aquelas suas palavras que,
cobertas pelo véu da letra, grande influência haviam de exercer no porvir, sob
o império do espírito, pouca importância tinham para os apóstolos, dada a
natureza da época em que foram ditas, pois a reencarnação, se bem não
constituísse lei entre os hebreus, estava no domínio das crenças da maioria
deles, embora já a houvessem combatido os “espíritos fortes”, como erros da
superstição. Jesus, portanto, ressuscitando Elias na pessoa de João Batista, não
fez mais do que ressuscitar essa velha crença, mostrando a lei natural e
imutável do renascimento, de cuja aplicação entre nós a reencarnação daquele
profeta era apenas um exemplo, dentro da ordem geral da Natureza, pelo que
respeita ao reino humano.
E não nos devemos admirar de
que os discípulos houvessem feito ao Mestre aquela pergunta, visto que, nas
condições sociais em que viviam, pouco sabiam da história sagrada, porquanto a
ciência teológica era, na Igreja Hebraica, o que ainda é em nossos dias: uma
luz que se oculta, para que não esclareça a multidão e não lhe patenteie as
feridas que a Escritura, essa pobre desfigurada, recebeu das interpretações
humanas.
Falando de João, disse Jesus
a seus discípulos que os escribas e fariseus não haviam compreendido que aquele
que pregava o arrependimento e o advento do Redentor era o Elias cuja volta o
Antigo Testamento prometera e os discípulos logo compreenderam que Ele se
referia ao Batista, que este era o mesmo Elias que as profecias anunciavam,
como tendo que ser o Precursor do Cristo.
O que, porém, Jesus, naquela
ocasião, não podia, nem devia dizer, mas que hoje a Nova Revelação nos diz é
que Moisés, Elias e João Batista são uma mesma e única entidade. Isso os
Espíritos do Senhor nos revelam agora, porque são chegados os tempos em que se
tem de efetuar a “nova aliança”; em que todos os homens, Judeus e Gentios, se
têm que abrigar debaixo de uma só crença, da crença num Deus uno, único,
indivisível, Criador incriado, eterno, único eterno: o Pai; em Jesus Cristo,
nosso Protetor, Governador e Mestre: o Filho; nos Espíritos do Senhor,
Espíritos puros, Espíritos superiores, Espíritos bons, que, sob a direção do
Cristo, trabalham pelo progresso do nosso planeta e da sua Humanidade: o
Espírito Santo.
Sim, Moisés, Elias e João
Batista são um só, são o mesmo Espírito encarnado três vezes em missão. Quando
foi Moisés, preparou a vinda do Cristo e a anunciou veladamente. Quando foi
Elias, deu grande brilho à tradição hebraica e anunciou, nas suas profecias,
que teria de ser o precursor do Cristo. Quando reencarnou em João, filho de
Zacarias e Isabel, foi esse precursor.
Essas três figuras formam o
emblema de uma tríplice missão desempenhada em três épocas diferentes, e, por
meio da aparição de Moisés e de Elias, no Tabor, aos três discípulos, foram
elas postas ao alcance das inteligências humanas, quando Jesus ensinou aos
homens que João Batista fora Elias, que volvera à Terra. Assim, Moisés, Elias e
João foram sempre o mesmo Espírito reencarnado, porém, não a mesma personalidade
humana, a mesma individualidade terrena.
Haverá, talvez, quem objete
que, sendo os três um só Espírito, não poderiam Moisés e Elias aparecer no
Tabor como dois Espíritos distintos, conforme se verificou. Entretanto, a Nova
Revelação explica o fato, ensinando que, ali, um Espírito superior, da mesma
elevação que Elias e João, tomou a figura, a aparência de Moisés. Tais
substituições se dão, quando necessárias, por Espíritos da mesma ordem.
O princípio da reencarnação
esteve esquecido durante muito tempo e convinha que assim acontecesse, porque
preciso se tornara que um véu fosse lançado entre os homens cheios de vícios,
de charlatanices, de superstições, e os mistérios de além-túmulo, até que a
Humanidade, pelos progressos realizados, se mostrasse apta a apreender esses
mistérios e, com eles, a lei natural da reencarnação, que então lhe seria,
pelos Espíritos do Senhor, revelada, como o está nos ensinos da Terceira
Revelação, em espírito e verdade, no seu fundamento e nas suas consequências, lei
que, de par com aqueles mistérios, desvenda aos homens as sendas da expiação,
da reparação e do progresso, sempre abertas ao Espírito que, trilhando-as,
chegará à perfeição moral e, assim, à realização de seus destinos, por virtude
da justiça de Deus, cujos tesouros de bondade e misericórdia são inesgotáveis.
Lunático. Fé onipotente. Prece e jejum
14.
Logo que deu com Jesus, todo aquele povo, tomado de espanto e temor, correu a
saudá-lo. 15. Ele então lhes perguntou: Que é o que discutíeis? 16. Um homem do
meio da turba respondeu: Mestre, eu te trouxe meu filho que está possesso de um
espírito mudo, 17, o qual, todas as vezes que dele se apodera, o atira ao chão
e o menino espuma, range os dentes e fica seco; pedi a teus discípulos que o
expulsassem, mas eles não puderam. 18. Jesus lhes disse: Oh! Geração incrédula,
até quando estarei convosco? Até quando vos sofrerei? Trazei-me o menino. 19.
Trouxeram-no; e, tanto que viu a Jesus, o Espírito o agitou e atirou por terra,
a estorcer-se no chão e a espumar. 20. Jesus perguntou ao pai do menino: Há
quanto tempo isto lhe sucede? O pai respondeu: Desde a infância; 21. E o
Espírito o tem muitas vezes lançado ora à água, ora ao fogo, para fazê-lo
perecer. Se puderes alguma coisa, tem piedade de nós e socorre-nos. 22. Jesus
lhe disse: Se puderes crer, tudo é possível àquele que crê. 23. Logo o pai do
menino exclamou, banhado em lágrimas: Senhor, eu creio, ajuda a minha pouca fé.
24. Jesus, vendo o povo acorrer, ameaçou o Espírito impuro, dizendo: Espírito
surdo e mudo, eu te ordeno: sai deste menino e não entres mais nele. 25. O
Espírito, soltando um grito e agitando violentamente o menino, saiu, ficando
este como morto, de sorte que muitos diziam: Morreu. 26. Mas, tomando-lhe Jesus
as mãos e erguendo-o, ele se levantou. 27. Quando Jesus voltou para casa, seus
discípulos lhe perguntaram em particular: Por que não pudemos nós expelir
aquele demônio? 28. Jesus respondeu: Os demônios desta casta não podem ser
expulsos senão pela prece e pelo jejum. 29. Dali partindo, atravessaram a Galileia.
Ele não queria que ninguém o soubesse.
Destes trechos evangélicos
se vê que os discípulos de Jesus, apesar de investidos por Ele no poder de
curar os enfermos e de afastar dos obsidiados os Espíritos obsessores, não
puderam expulsar daquele rapaz, que lhes fora trazido, o perseguidor que o
atormentava. Entretanto, apresentado o moço ao Mestre, este ameaçou o “demônio”
que sobre ele atuava e no mesmo instante cessou a obsessão de que era agente
tal “demônio”.
Enquanto se achava com seus
discípulos, Jesus os preparava para desempenhar as missões que lhes iam ser
confiadas, sobretudo quando Ele houvesse terminado a sua entre os homens.
Eram ainda incipientes as
faculdades mediúnicas de seus discípulos, tinham que se desenvolver, para serem
exercidas cada vez em maior escala, até alcançarem toda a amplitude a que
haviam de chegar. O mesmo se dá com os médiuns atuais; mas, ao passo que
aqueles atingiram o seu pleno desenvolvimento sob as vistas de Jesus, como
devia suceder, o dos instrumentos mediúnicos da atualidade só se tornará
completo, quando estiver na Terra o Regenerador, grande Espírito que trará a
missão de aproximar a Humanidade do ponto de sua purificação integral, da sua
perfeição moral. Até lá, eles apenas obterão fatos isolados, estranhos à ordem
comum dos fatos.
Quanto ao não haverem podido
os discípulos expelir do rapaz, a que se referem os Evangelistas, o “demônio”,
a causa de tal insucesso está assinalada na resposta que Jesus deu, quando eles
lhe perguntaram por que não tinham conseguido “lançá-lo fora”. Foi por causa da
vossa pouca fé, disse o Divino Mestre, acrescentando: “Os demônios desta casta
não podem ser expulsos senão pela prece e pelo jejum”.
Ocorre, entretanto,
perguntar como é que, já tendo eles produzido, dentro de certos limites, fatos
considerados “milagrosos”, pela assistência que lhes dispensava o Mestre,
quando os mandara às cidades vizinhas, com o poder de curar os enfermos e
expulsar os demônios (MATEUS, capítulo 10, versículo 8), ficaram sem essa assistência
naquele caso do lunático. É que Jesus lhes quis significar não se terem eles
ainda tornado capazes de cumprir com segurança a tarefa que lhes cabia,
preservando-os desse modo do orgulho a que, na condição de homens, poderiam dar
entrada em seus corações e levando-os a reconhecer que ainda precisavam
fortalecer a fé, tornar absoluta a confiança, que deviam depositar naquele em
cujo nome iam falar e agir, para estarem aptos a realizar com firmeza as obras
que o viam praticar pelo só poder da sua vontade, em virtude da sua perfeita
pureza.
Foi, ao mesmo tempo, um
exemplo, para os que de futuro viessem a ser os continuadores da obra dos
discípulos. De fato, se estes, edificados como eram, constantemente, pelos
ensinos, conselhos e exemplos do Mestre, santificados pela sua presença, ainda
estavam sujeitos a fracassos, como o que nesta passagem dos Evangelhos se
registra, quão maiores não hão de ser esses fracassos, na atualidade, entre
nós, que carecemos de fé, que não sabemos orar e que não praticamos o jejum
espiritual! A fé, alavanca poderosa, capaz por si só de levantar o mundo,
constitui o meio único de que podemos lançar mão eficazmente, para afastar os
Espíritos atrasados e sofredores. Da fé nasce a prece que, se, além de
fervorosa e perseverante, é acompanhada do jejum espiritual, acaba sempre por
tocar o Espírito culpado, o esclarecer e encaminhar para a verdade.
Que é a fé? Que é a prece?
Que é o jejum? Em que consistem este e aquelas?
Disse Jesus ao pai do moço:
Se puderes crer, todas as coisas são possíveis àquele que crê. Cumpre notar
que, dizendo isso, o Mestre falou figuradamente, como, aliás, de ordinário,
sucedia. Mas, dentro da figura de que usou, está a verdade. Efetivamente, que
prodígios não pode a fé operar? Que é o que não consegue essa alavanca
prodigiosa, essa força motriz incoercível, esse calor fecundante, que dá à alma
a essência pura da crença, sem sombras, na existência de Deus, no seu amor e na
sua misericórdia infinitos, que a faz librar-se às regiões luminosas do espaço
e subir até ao seu Criador, sem mesmo perceber como e por que sobe. A fé
consiste na confiança absoluta, sem a mais ligeira dúvida, sem vacilações. Ë
uma virtude difícil, senão impossível de definir-se e quase incompreensível
para nós outros, pobres pecadores de todos os instantes, cheios de imperfeições
e fraquezas. Dizemo-la incompreensível para nós, porque, propensos a
considerá-la apanágio somente de Espíritos elevados, por verificarmos que, nas
ocasiões em que mais necessária nos é, ela nos falece a nós que a todos os
instantes recebemos provas da bondade e misericórdia extremas de Nosso Senhor
Jesus Cristo; que estudamos e aceitamos, com lágrimas de reconhecimento, as
lições por Ele dadas e exemplificadas até ao cimo do Gólgota, vemos, no
entanto, que, noutros irmãos, menos aparelhados de outras virtudes, ela é
forte, esclarecida e sábia, como deve ser em todo cristão, segundo ensinam os
Evangelhos.
A verdade, porém, é que:
àquele que crê, todas as coisas são possíveis, por isso que em torno dele se
grupam os Espíritos do Senhor, para assisti-lo. À fé se alia sempre a esperança
e ambas se desdobram em caridade. Não tendo ainda os nossos corações bastante
abertos para agasalharmos essas virtudes, esforcemo-nos, pelo estudo, pela
meditação dos ensinos e exemplos do nosso Salvador e dos seus apóstolos, por
fortalecê-los em nossos espíritos, aprendendo a pedir somente o que possa ser
de justiça aos olhos de Deus.
Sim,
Senhor, eu creio; ajuda a minha pouca fé. —Na humildade e
simplicidade do seu coração, aquele pai não se sentia bastante forte em sua fé,
para merecer tal graça; porém, esse mesmo temor militava por ele e lhe facultou
ser atendido pela bondade infinita. Aí temos o valor e o alcance da prece!
Orai e jejuai, disse-nos o
Bom Jesus. Mas, que é orar? Será repetir palavras mais ou menos harmoniosas,
mais ou menos sonoras, mais ou menos humildes, ditas de lábios para subirem ao
Senhor?
Jejuar será abster-nos de
alimentos quaisquer, necessários à sustentação do nosso corpo material e
indispensáveis ao regular funcionamento do nosso organismo?
Não. Não nos iludamos. Não é
prece uma reunião de palavras que se repetem todos os dias, por ofício, como
meio de ganhar a vida, e que acabam tornando-se maquinais.
A prece poderosa, a prece de
Jesus são os atos da vida praticados com o pensamento em Deus, e sempre a Deus
reportados. É um arroubo contínuo do pensamento, uma aspiração incessantemente
dirigida ao Criador e a guiar-nos na prática da verdade, da caridade e do amor,
a bem do nosso progresso moral e intelectual e do progresso dos nossos irmãos.
O jejum que Jesus nos
recomendou consiste em nos abstermos de pensamentos culposos, inúteis, frívolos
mesmo; em sermos sóbrios na satisfação das nossas necessidades materiais,
reservando o supérfluo para o repartirmos com os nossos irmãos a quem falte o
necessário; em sermos sinceros na modéstia, na regularidade dos costumes, na
austeridade do proceder.
Tais são o jejum e a prece
que expelem os “demônios” da pior espécie, os “demônios” que nos tornam cegos,
surdos e mudos.
Jesus não precisava recorrer
à prece ocasional, porque, puro Espírito, Espírito perfeito, investido de
onipotência sobre os Espíritos impuros, sua vida, aquela vida que os homens
supunham humana, decorria continuamente piedosa aos olhos do Senhor e também
porque a sua missão já era um ato de fé e amor, uma prece ativa e permanente,
que o colocava (mesmo posta de lado a sua superioridade espiritual) acima de
todos os Espíritos, pelo poder e pela persuasão.
Predição, por Jesus, da sua morte e
ressurreição
(Mateus,
17:21,22; Lucas, 9:44,45)
30.
Ensinando a seus discípulos, dizia: O filho do homem será entregue às mãos dos
homens, que o farão morrer, mas ele ressuscitará ao terceiro dia depois da sua
morte. 31. Os discípulos, porém, não entenderam essas palavras suas e receavam
interrogá-lo. 32. Vieram a Cafarnaum e, quando chegaram a casa, perguntou-lhes
ele: De que vínheis tratando pelo caminho?
Estes versículos se explicam
por si mesmos. Jesus revelava antecipadamente os acontecimentos que se iam dar,
a fim de tocar mais fundamente o espírito dos discípulos e lhes aumentar a fé.
Predisse-lhes que “habitaria
com os mortos”, a fim de tornar mais frisante a sua ressurreição.
O que eles, porém,
compreenderam foi, apenas, que o Senhor se preparava para morrer, que corriam o
risco de perder o Mestre bem-amado, crentes de que este pertencia, pelo seu
invólucro corpóreo à humanidade terrena. Ao mesmo tempo, receavam interrogá-lo,
porque a ressurreição, após uma morte que, no parecer deles, seria real,
material, povoava de dúvidas os Espíritos, quanto à possibilidade de tal fato,
mesmo como um milagre, dúvidas de que lhes nascia o temor de interpelarem a
Jesus.
A vida, a morte e a
ressurreição do Salvador, fatos aparentes, mas que deviam ser consideradas
reais, tiveram uma razão e um fim que hoje se justificam e explicam, sem que
haja mister sejam impostas, dogmaticamente, como milagres, isto é, como
derrogações de leis naturais e imutáveis.
Lição de caridade e de amor, de amparo
ao fraco, de fé, confiança, humildade e simplicidade
(Mateus,
18:1-5; Lucas, 9:46-50)
33.
Vieram a Cafarnaum e, quando chegaram a casa, perguntou-lhes ele: De que
vínheis tratando pelo caminho? 34. Todos se calaram, por isso que tinham vindo
a discutir sobre qual deles era o maior. 35. Jesus então se sentou, chamou os
doze apóstolos e lhes disse: Se algum quiser ser o primeiro, seja o último de
todos e o servo de todos. 36. Em seguida, tomou de um menino, colocou-o no meio
deles e, depois de o beijar, 37, disse-lhes: Quem receber em meu nome a uma
criança como esta a mim me recebe e quem me receber não me recebe a mim, recebe
sim àquele que me enviou. 38. Disse-lhe em seguida João: Mestre, vimos um homem
que expulsa os demônios em teu nome, mas que não te segue; nós lho proibimos. 39.
Jesus disse: Não lho proibais, porquanto não há ninguém que, tendo feito em meu
nome um milagre, possa depois dizer mal de mim; 40. Visto que quem não é contra
vós é por vós; 41. E quem quer que em meu nome vos dê de beber um copo d’água,
por serdes do Cristo, não perderá, eu vo-lo digo em verdade, sua recompensa.
Nestas palavras de Jesus,
temos mais uma lição de caridade, de amor, de amparo ao fraco, de fé, humildade
e simplicidade. “Aquele que quiser ser o primeiro seja o último, o servo de
todos”, disse Ele.
Sejamos crianças que o
Divino Mestre tome em seus braços. Fracos, como somos e nos reconhecemos,
confiemos nele e, se nos tornarmos simples de coração, nele encontraremos a
chave de toda a ciência. Sejamos caridosos com os nossos irmãos e nele teremos
o mais admirável tipo da caridade.
Aquelas palavras suas
significam: Não procureis elevar-vos pelas vossas próprias forças, porque elas
vos trairão; não acrediteis valer mais do que os vossos irmãos, aos olhos de
vosso pai; nem desejeis sobrepor-vos a eles; procurai, ao contrário, ajudá-los
a se elevarem, dando-lhes o melhor dos conselhos: o do exemplo.
Supunham os discípulos que o
Senhor tinha preferência por um deles, que João era o mais amado. Daí o ciúme
que lhes nasceu no intimo, tal a miserabilidade da carne, mesmo entre os bons,
ciúme, entretanto, desculpável, até certo ponto, por provir do grande amor que
consagravam ao Mestre. Esse o sentimento que lhes trouxe ao espírito a ideia de
saberem qual era o maior e motivou a discussão em que se empenharam.
João, porém, não era o mais
amado, era, antes, o que mais amava, o que o impelia a aproximar-se mais de
Jesus, dando isso lugar a que os outros pensassem que lhe coubera a melhor
parte.
“Se não vos converterdes e
não vos tornardes quais crianças, não entrareis no reino do céu", advertiu
o Divino Mestre. Quer dizer, se não abandonardes as ideias e tendências
humanas, não chegareis à perfeição. A criança é o símbolo da inocência. O
pensamento de Jesus, ao servir-se de tal símbolo, era este: Se não vos fizerdes
simples e inocentes, o orgulho vos impedirá a entrada no reino dos céus, ou:
não sereis moralmente perfeitos.
Quando disse que aquele que,
em seu nome, recebe a uma criança, recebe-o a Ele, quis significar que,
pondo-nos ao alcance do fraco e do simples, de partilharmos com este o que
possuirmos em inteligência, em força, em saber, tê-lo-emos a Ele ao nosso lado.
Versículos 38 – 40. O que
consta nestes versículos mostra que a ninguém é lícito sofrear os impulsos da
fé, nem pretender forçar que os outros caminhem pela senda que se lhe abriu,
quando podem, seguindo a que a essa fica paralela, chegar ao fim que lhes
cumpre atingir. Mostra, portanto, quão errados andam e divorciados de seus
ensinos os intolerantes, que entendem de impor a todos a tirania mística,
dizendo-lhes: crede como eu, adorai como eu, do contrário sereis condenados às
penas eternas.
Eis aqui a doutrina do
Cordeiro de Deus: Não lho proibais, que lícito não vos é impedir que quem quer
que seja pratique o bem. Aquele que não é contra mim (estas são, textualmente,
as palavras do Mestre) por mim é.
Compare-se essa doutrina à
que, por questões de fórmulas, de palavras, de ritos, excomunga as criaturas de
Deus e as condena a suplícios atrozes, praticando contra elas inomináveis
crueldades, e dizei se os que assim procedem seguem o Cristo e podem, sem
blasfemar, usar do seu nome.
Que importava que aquele
irmão não pertencesse ao número dos que seguiam a Jesus, se, Espírito
esclarecido, compreendendo a missão do Messias prometido, possuído de fé viva e
ardente, ia, por seu lado, pregando aos homens que escutassem o Mestre, de quem
apenas ouvira falar, e praticando o que este pregava? Certo de que, com o apoio
do nome de Jesus, atraía sobre si as graças do Senhor, ele expulsava os
Espíritos impuros, sustentado por Espíritos superiores, que lhe secundavam os
esforços. Era uma pedra insulada, mas que servia para a construção do edifício,
como tantas outras houve, há hoje e haverá no futuro.
Qualquer que seja o caminho
que trilharmos, desde que o palmilhemos praticando a caridade, espalhando o
bem, em nome de Jesus, aí descobriremos as marcas de seus pés e seremos com Ele
e Ele será conosco, e faremos milagres, quais esse de que fala MARCOS no
capítulo 9, versículo 38, isto é, atos que se efetuam pela vontade de Deus,
segundo leis verdadeiras e imutáveis da Natureza, ainda desconhecidas dos
homens mas existentes de toda a eternidade, que essa é a significação única que
devemos dar àquele termo e não o de derrogação das leis naturais, como o
pretende a Igreja Romana.
Evitar o escândalo. É necessário que se
deem escândalos, é impossível que não se deem. Mas, ai do homem que cause o
escândalo
(Marcos, 9:42-50; Lucas, 17:1,2)
42.
Aquele que escandalizar a um destes pequeninos que creem em mim, mais valera lhe
atassem ao pescoço uma mó de moinho e o lançassem ao mar. 43. Se vossa mão vos
é motivo de escândalo, cortai-a; mais vale entreis na vida com uma só mão do
que com duas e ir para a geena do fogo que jamais se extingue, 44. onde o verme
que os rói não morre e o fogo não se apaga. 45. Se vosso pé vos é motivo de
escândalo, cortai-o; mais vale entreis coxos na vida eterna do que com dois pés
e serdes precipitados na geena do fogo que jamais se extingue; 46. onde o verme
que os rói não morre e o fogo nunca se apaga. 47. Se vosso olho vos é motivo de
escândalo arrancai-o; melhor será que entreis no reino de Deus com um só olho
do que com dois e serdes precipitados na geena do fogo, 48. Onde o verme que os
rói não morre e o fogo jamais se extingue, 49. pois todos terão que ser
salgados com fogo, como toda vítima tem que ser salgada com sal. 50. O sal é
bom, mas, se se tornar insípido, com que o temperareis? Tende sal em vós e
entre vós guardai a paz.
No planeta atrasado em que
habitamos, as encarnações, em geral, são concedidas aos Espíritos que as pedem,
para expiação e reparação de faltas que anteriormente cometeram. Consistem as
expiações em sofrimentos físicos e morais, sofrimentos esses que, muitas vezes,
são causados pelos maus atos, maus conselhos, maus exemplos de outros que,
obstinados no mal, se tornam assim causas ou instrumentos de escândalo.
Constitui este, para o que lhe experimenta as consequências, uma como punição
de suas culpas e, portanto, um fator do seu progresso.
Necessário é, pois, que haja
escândalo no mundo, visto que só mediante eles muitas consciências despertam
para o reconhecimento dos erros praticados e para o arrependimento, e que, pelo
contacto com os vícios, e que as virtudes se fortalecem e deles triunfam. Ai,
porém, dos que ocasionem o escândalo, e ai também, ainda que menor lhes seja a
culpa, dos que se deixem levar até ao escândalo. Mais valera não houvessem
encarnado, antes de estarem bastante amadurecidos para uma vida melhor.
Qualquer que seja o
sacrifício que nos custe à destruição, em nossas almas, de todas as causas do
mal, preferível é que o façamos, a que nos tornemos causa de escândalo, com o
que nos condenaremos a sofrer, durante séculos talvez, na vida errante do
Espírito culpado, uma tortura de todos os momentos, sem que nos sorria a
esperança de ver-lhe o fim, enquanto o arrependimento não nos abrir o coração
para aninhá-la, induzindo-nos ao desejo de baixarmos de novo ao mundo, para,
numa outra vida, expiar e reparar o mal praticado.
O fogo exprime
emblematicamente a expiação, como meio de purificação e, assim, de progresso,
para o Espírito culpado.
O sal, entre os hebreus, era
o emblema da purificação de toda vítima oferecida em oblata ao Senhor.
Recorrendo sempre aos costumes, preconceitos e tradições hebraicas, para compor
a linguagem figurada de que necessitava usar, Jesus ainda aqui apresentou a
infância como emblema da pureza e da virtude.
SAYÃO, Antonio Luiz.
Elucidações evangélicas. FEB (e-book).
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