Pacto de traição feito por Judas
Iscariotes com os príncipes dos sacerdotes. Lugar escolhido para a Páscoa
(Mateus,
26:14-19; Marcos, 14:10-16)
1.
Estava próxima a festa dos pães ázimos, que se chama a Páscoa. 2. Os príncipes
dos sacerdotes e os escribas procuravam um meio de tirar a vida a Jesus, mas
temiam o povo. 3. Ora, Satanás entrou em Judas, cognominado Iscariotes, que era
um dos doze; 4, e Judas foi e se entendeu com os príncipes dos sacerdotes e os
capitães das guardas do templo sobre o modo de lhes entregar Jesus. 5.
Alegraram-se todos e ajustaram com ele dar-lhe dinheiro. 6. Judas prometeu e
começou a procurar uma oportunidade de lhes entregar o Mestre, sem que o povo o
soubesse. 7. Chegou afinal o dia dos pães ázimos, em que se devia Imolar a
Páscoa. 8. Jesus despachou a Pedro e João, dizendo-lhes: Ide preparar tudo para
comermos a Páscoa. 9. Eles perguntaram: Onde queres que a preparemos? 10.
Respondeu Jesus: Ao entrardes na cidade encontrareis um homem carregando um
cântaro d’água; acompanhai-o até a casa onde ele entrar; 11, e dizei ao dono da
casa: O Mestre te manda perguntar: Onde o compartimento em que hei de comer a
Páscoa com meus discípulos 12. E ele vos mostrará uma grande sala mobiliada;
preparai aí o que for necessário. 13. Os dois foram e acharam tudo como ele
lhes dissera e prepararam a Páscoa.
Aproximava-se o momento de
se cumprirem os fatos preditos, e Jesus, falando daquele modo aos discípulos,
confirmava as predições já feitas. Enviados por Ele, Pedro e João encontram o
homem que lhes fora indicado e tudo se passa como Ele anunciara. Esses fatos,
que se verificavam em Jesus, de presciência, de visão à distância, bem como a
influência oculta que concorria para que eles se produzissem, já ficaram explicados,
quando estudamos outros pontos já considerados.
Quanto à traição de Judas, não resultou de uma predestinação. Aceitá-la como tal importaria em negar a justiça de Deus.
Judas, que era um Espírito
desejoso de adiantar-se, mas orgulhoso e por demais confiante nas suas forças;
pedira, antes de encarnar, lhe fosse concedido participar da obra do Cristo,
esperando tirar dessa participação abundantes e preciosos frutos. Em vão seus
guias lhe fizeram ver os escolhos contra os quais iria chocar-se. A nada quis
atender.
Jesus conhecia a Judas e lhe
aceitara o concurso. A lição terrível que o esperava fá-lo-ia sair afinal
purificado de todos os vícios que ainda o dominavam. Foi tendo em vista esse
futuro, patente a seus olhos, que o Mestre consentiu naquele ato de Judas, que,
além de orgulhoso, era invejoso e amante do luxo. Quantos e quantos Judas não
existem ainda neste mundo e quão tremenda é a expiação que os espera!
Os bons Espíritos nos dizem:
Queridos irmãos, desconfiai todos, todos
sem exceção, de vós mesmos, pois que estais sempre prontos a dar entrada a
“Satanás”, ao “demônio” do orgulho e da inveja, e muito prontamente sucumbis às
suas sugestões. Guarde-vos o Senhor, porquanto a queda é fácil, mas o
reerguimento é terrível!
Os discípulos, dizem os Evangelhos,
fizeram o que o Mestre lhes determinara, tudo se passou como lhes fora dito e
prepararam tudo para que Ele celebrasse a Páscoa com os doze, portanto com
Judas Iscariotes, também, o qual, sabia-o Ele, o havia de trair. E, com efeito,
celebrou com seus discípulos aquela festa, não numa sinagoga ou num templo
construído pelos homens, mas num amplo cenáculo todo mobilhado. Como cumpria acontecesse, tal festa, a
ceia pascal, serviu, sob o império e o véu da letra, de base a um culto
exterior. Em espírito e verdade,
porém, foi um ato puramente espiritual, emblemático, cujo sentido, alcance e
aplicações em seguida veremos.
A vida de Judas demonstra
até que extremo funesto pode o orgulho obstinado levar a criatura que se
exalta, julgando-se capaz de tudo, pelo seu saber e pelo seu poder. Faz,
entretanto, manifesta, ao mesmo tempo, a justiça e a misericórdia de um Deus,
cuja mão paternal está sempre pronta a estender-se para o filho indócil, a fim
de levantá-lo da queda, que lhe deve servir de lição.
Com efeito, Judas, tendo
falido no desempenho da missão que pedira, por ser esta superior às suas
forças, achou, pela infinita bondade de Deus, meio de se erguer e regenerar no
crisol do arrependimento, do remorso, da expiação, da reparação, do tempo, do
progresso, de forma a reaver o seu lugar entre os servidores fiéis e devotados
de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Quando recebia os
ensinamentos que acabamos de resumir, o médium, que servia de instrumento à
transmissão deste conjunto de revelações que nos iluminam o carreiro por onde
chegaremos aos pés do Nosso Senhor e Mestre, escreveu inopinadamente as duas
comunicações que se seguem e que constituem grandiosas lições, fontes de
esperança e de coragem para todos, a todos ensinando que, por maior que seja o
crime, ou a falta da criatura, jamais é tão grande quanto à bondade de Deus.
São estas as comunicações:
“Oh! como é grande esse Deus que permite que o filho culpado encontre, na sua
própria indignidade, o ponto de apoio que o ajudará a subir para a perfeição!"
Oh! Quanto é bom aquele que está sempre pronto a perdoar ao que sinceramente se
arrepende, que pensa com suas mãos benfazejas as chagas dos nossos corações
culpados, que nelas derrama o bálsamo da esperança e as cicatriza com o auxílio
da expiação!
Bendito
sejas tu, meu Deus! Judas Iscariotes
O
amor do Senhor se estende por sobre todas as suas criaturas. Vinde, pois, a
Ele, cheios de confiança. Não são os inocentes os que precisam de perdão. Não
são os fortes os que precisam de amparo. Vinde, filhos que chorais as vossas
faltas, o Senhor vos enxugará as lágrimas. Vinde, filhos fracos e enfermos, o
Senhor vos dará parte maior e mais ativa do seu amor. Vinde confiantes. Como
vós, também nós falimos. Como vós, também fomos culpados, amargamos as nossas
faltas e expiamos os crimes que cometêramos e as fraquezas que nos fizeram
sucumbir, por meio de longo e penoso labor numa série extensa de existências
humanas, que prepararam e realizaram a nossa purificação, graças à qual o
Senhor nos admitiu a gozar da sua alegria”.
Imitai-nos,
portanto, irmãos bem-amados. Todos tendes, mais ou menos, o que expiar, tendes
que pedir perdão. Vinde com confiança aos pés do vosso pai, confessai vossas
faltas perante o seu tribunal. O juiz é reto, o juiz é justo, mas também é pai.
Sua indulgência há de sempre prevalecer sobre a sua justiça; suas sentenças Ele
as profere sempre dentro dos limites das vossas forças. É Credor paciente e
brando; esperará que possais pagar a vossa dívida.
Oh! Vinde!
Possa a mão que vos estendemos sustentar-vos, fazendo-vos compreender que em
nós achareis grandes tesouros de amor.
Judas
é hoje um espírito regenerado no crisol do arrependimento, do remorso, da
expiação, da reencarnação e do progresso. Tornou-se um dos auxiliares humildes,
ativos e devotados do Cristo. Este exemplo vos mostra que não deveis nunca
repelir qualquer de vossos irmãos e ainda menos excluí-lo da paz do Senhor.
José
de Arimatéia. Simão de Cirene.
Assistidos
pelos Apóstolos Mateus, Marcos, Lucas, João.
Ceia pascal. Jesus prediz a traição de
Judas
(Mateus,
26:20-30; Marcos, 14:17-26)
14.
Chegada a hora, Jesus se pôs à mesa com os doze apóstolos, 15, e lhes disse:
Ardentemente desejei comer convosco esta Páscoa, antes de padecer; 16,
porquanto vos declaro que não tornarei mais a comê-la até que ela se cumpra no
reino de Deus. 17. Depois, pegou do cálice, rendeu graças e disse: Tomai-o,
passai-o entre vós; 18, pois declaro que não tornarei a beber do fruto da
videira, até que venha o reino de Deus. 19. Em seguida, tomou do pão, rendeu graças,
o partiu e passou aos discípulos, dizendo: isto é o meu corpo, que por vós é
dado: fazei isto em minha memória. 20. Terminada a ceia, tomou igualmente do
cálice e disse: Este cálice é a nova aliança em meu sangue, que se derramará
por vós. 21. Entretanto, a mão daquele que me trai está comigo a esta mesa. 22.
O Filho do homem, na verdade, vai, conforme está determinado, mas ai do homem,
por quem ele será traído! 23. Começaram então os apóstolos a perguntar uns aos
outros qual deles iria fazer isso.
Jesus baixou ao convívio de
seus discípulos, para lhes dar ensinamentos verbais, capazes de impressioná-los,
tendo sempre o cuidado de ligar esses ensinos aos fatos e às tradições do
Antigo Testamento. Não voltará a nós, senão quando a semente que plantou e que
vem germinando há longos séculos se tenha tornado árvore carregada de frutos.
Quer isto dizer que não voltará, visível aos homens, senão quando houvermos
atingido tal grau de desenvolvimento, que lhe seja possível manifestar-se na
plenitude da sua natureza espiritual.
A Páscoa é um símbolo; nada
mais que um símbolo. É o selo aposto pelo Mestre aos ensinamentos que
ministrava pela palavra. É a confirmação da lei de amor e da união que deve
reinar entre os homens. Ë o derradeiro e solene apelo por Ele feito à prática
dessa lei e dessa união, portanto, à fraternidade universal. Ë a comunhão a que
convidou e convida os homens, servindo-se dos emblemas do pão e do vinho, aos
quais comparou o seu corpo e o seu sangue.
Assentados todos à mesa do
festim, todos temos que nos servir igualmente do mesmo alimento e que beber
pelo mesmo cálice, O pão tem que ser o mesmo para todos, pois que o sacrifício
do Salvador se verificou para servir de exemplo a todos; o vinho a todos os
sequiosos tem que dessedentar, visto que seu “sangue” o Salvador o derramou por
todos.
Devemos fazer com os nossos
irmãos transviados o que Jesus fez com o duodécimo discípulo, a ovelha
desgarrada, que mais tarde o bom-pastor carregaria aos ombros e reconduziria ao
aprisco. Embora soubesse que ele o havia de trair, que era um discípulo
prevaricador, o Mestre permite que Judas se sente à mesa com os onze discípulos
fiéis, que partilhe com estes do mesmo alimento e beba pelo mesmo cálice, para
que escute, receba aquele último apelo. E, ao aproximar-se o momento de deixar
a Terra, não teve para o infiel, como para os que o insultavam e flagelavam,
senão uma palavra de perdão: Perdoa-lhes,
meu Pai; eles não sabem o que fazem.
O pão e o vinho nada mais
são que símbolos. Nunca Jesus pensou em dar-lhes uma aplicação material. Porém,
o que ocorreu tinha que ocorrer, pois que, para a matéria, só a matéria. Daí,
entretanto, não se segue permaneça o erro, que até agora foi mantido pela
rotina, pela cegueira, pela obstinação. Bom é consagrem os homens um dia a
recordar a ceia do Mestre com seus discípulos, à rememoração do devotamento
daquele modelo excelso que baixou até nós, para fazer que até Ele nos elevemos.
Os primeiros discípulos,
cumprindo a recomendação expressa nas suas derradeiras palavras, se reuniam
para, em comum, fazerem um repasto comemorativo do último em que com Ele haviam
tomado parte. Mais tarde, nas reuniões dos que lhes sucederam, cenas
escandalosas se deram. Em vez da fraternidade que devia reinar entre todos,
passou a imperar o orgulho. Os cristãos tiveram que pôr termo a tais abusos e
instituíram a “comunhão”, tendo por símbolos o pão e o vinho. Posteriormente,
as dificuldades e perigos, que havia, de se reunirem em grande número, os
levaram a instituir a comunhão dada pelo sacerdote aos discípulos que se
apresentavam para recebê-la. Essas transformações se foram operando
sucessivamente no curso das perseguições de que os cristãos eram vítimas em
Roma. Tiveram, como se vê, a sua razão de ser.
Se, depois, as palavras do
Mestre fazei isto em minha memória tomadas à letra, deram lugar ao dogma da
“presença real”, da “transubstanciação”, causa de intermináveis controvérsias,
foi porque o homem se apega sempre à crosta superficial, sem cogitar da seiva
que a vivifica.
Devemos, sem dúvida,
comemorar a Ceia Pascal, em memória do Mestre, mas pela prece do coração,
apoiada em atos de uma vida íntegra, pura, humilde, ativa e consagrada ao bem
de todos os membros da grande família humana. Aquele que se julgue no dever de
aproximar-se do Senhor pelo ato ritualístico da comunhão, faça-o, porém, só
emprestando valor ao ato espiritual. Que se prostre, para isso, curvada a
fronte, aos pés do sacerdote, mas sem atentar no homem, nem se preocupar com a
matéria e sim elevando sua alma a Deus, lembrando-se das virtudes praticadas
pelo seu Enviado e escutando aquelas palavras suas Fazei isto em minha memória.
Cristãos, quem quer que
sejais romanos, gregos ou protestantes praticai o ato material comemorativo, se
as exigências do vosso coração, ou mesmo os hábitos da vossa infância a isso
vos impelem. Nunca, porém, o pratiqueis preocupados com a opinião dos homens.
Suportai, se for preciso, a censura injusta; mas, sejam puras as vossas ações,
ditem-nas a verdade e o amor.
Comemoremos a Ceia Pascal,
vendo, naquele que a ela presidiu, o Manso Cordeiro a ser imolado para salvação
da Humanidade inteira.
Comemoremo-la, com o mesmo
sentimento com que celebramos as nossas festas intimas; para expandir as
satisfações da nossa alma, para estreitar os laços do amor, da amizade que nos
ligam aos que nos são caros. Reunamo-nos com os nossos irmãos em torno de uma
mesa, simbolizando essa reunião a unidade em que devemos estar com Jesus,
idêntica à em que Ele se acha com o Pai que está nos céus, o seu Deus e nosso
Deus (JOÃO, capítulo 17, versículos 21 e seguintes); simbolizando a
fraternidade que nos deve prender uns aos outros, como filhos que somos do
mesmo Pai.
Façamo-lo em perfeita
comunhão de crença e com o propósito de pautarmos os nossos pensamentos,
palavras e obras pela doutrina ensinada e exemplificada pelo Mestre divino,
doutrina que Ele simbolizou no pão que distribuiu a seus apóstolos; com o de
tonificarmos os nossos corações com o licor que Ele os fez beber, semelhante ao
sangue que verteu no Calvário, símbolo do seu amor sem limites, o qual, seiva
vivificante daquela doutrina, não se deteve ante o supremo sacrifício de
imolar-se para nos mostrar o caminho da redenção.
Se fizermos assim, em
espírito e verdade, a nossa comemoração, demonstraremos haver bem compreendido
as sagradas letras.
Orgulho. Ambição. Dominação. Interditos
24.
Suscitou-se depois entre eles uma contenda sobre qual deveria ser reputado o
maior. 25. Jesus então lhes disse: Os reis das nações as tratam com Império e
os que sobre elas exercem autoridade são chamados benfeitores. 26. Não seja
assim entre vós: ao contrário, aquele que for entre vós o maior faça-se como o
mais pequenino, e seja aquele que manda, igual ao que serve. 27. Porque, qual é
o maior, o que está à mesa ou o que serve? Não é o que está à mesa? Entretanto,
eu me acho entre vós como o que serve. 28. Vós, porém, sois os que haveis
permanecido comigo nas minhas tentações; 29, por Isso, eu vos preparo o reino,
como meu pai mo preparou, 30, para que comais e bebais à minha mesa no meu
reino e vos senteis sobre tronos a fim de julgardes as doze tribos de Israel.
Ninguém será excluído,
ninguém será repelido. Mas, também, ninguém se há de considerar superior a seu
irmão e ambicionar lugar mais elevado.
A questão, que se travou
entre os discípulos, sobre qual deveria ser considerado o maior, é, no fundo,
análoga ao pedido que a Jesus dirigiram os filhos de Zebedeu e que deu lugar à
resposta e aos ensinamentos que o Mestre, nesta outra ocasião, repetiu, usando
apenas os termos diferentes (Veja-se o capítulo 20, versículo 20 ao 28, de
MATEUS.)
Tais discussões surgiam com
frequência entre os discípulos, porque, não obstante a missão que traziam, se
achavam sob o império da carne, sofrendo-lhe os desfalecimentos.
Versículos 25 ao 27. Esta
resposta encerra um ensinamento simples e conciso de humildade, desinteresse,
renúncia de si mesmo, o orgulho constitui uma barreira que se ergue entre o
homem e Deus.
Versículos 28 ao 30. O termo
“tentação” não deve ser tomado na sua acepção vulgar. Segundo o espírito,
significa, com relação a Jesus, tribulações, provas, a que qualquer outra
natureza, que não a sua, houvera sucumbido. Empregando o termo “tentações”, Ele
objetivava deixar uma arma com que de futuro se pudesse combater a divindade
que mais tarde os homens lhe haviam de atribuir.
Os apóstolos fiéis eram
Espíritos adiantados, mas ainda não perfeitos. Tendo permanecido com Jesus no
bem, seriam auxiliados e guiados por Espíritos superiores, para alcançarem a
vida eterna, atingirem a perfeição pela qual se esforçavam.
As doze tribos de Israel
simbolizam as divisões do gênero humano em povos diferentes. Já tratamos do
assunto, quando estudamos o capítulo 19, versículos 27 ao 30, de MATEUS.
Predições de Jesus. Predição da negação
de Pedro
(Mateus,
26:31-35; Marcos, 14:27-31)
31.
Disse ainda o Senhor: Simão, Simão, Satanás vos reclamou a todos para
joeirar-vos como se faz ao trigo. 32. Eu, porém, rogarei por ti, a fim de que a
tua fé não desfaleça. E tu, quando te houveres convertido, fortalece teus
irmãos. 33. Respondeu-lhe Pedro: Senhor estou pronto a ir contigo, assim para a
prisão, como para a morte. 34. Disse-lhe então Jesus: Declaro-te, Pedro, que
não cantará hoje o galo, sem que três vezes tenhas negado que me conheces. E
perguntou-lhes em seguida: 35. Quando vos mandei sem bolsa, sem alforje e sem
sandália, porventura vos faltou alguma coisa? 36. Eles responderam: Nada.
Disse-lhes então Jesus. Pois, agora, tome a sua bolsa e o seu alforje aquele
que os tiver; e aquele que não o tenha venda a sua capa e compre uma espada. 37.
Porque, eu vos declaro ser preciso também que em mim se cumpra isto que está
escrito: Ele foi incluído no rol dos celerados; porquanto, o que de mim foi
profetizado está prestes a cumprir-se. 38. Eles disseram: Senhor, aqui estão
duas espadas. Respondeu-lhes Jesus: Basta.
Jesus dá a ver, de antemão,
a seus discípulos quão frágil é a vontade humana e quão pouco deve o homem
contar com as suas próprias forças. Dizendo a Pedro: Roguei por ti, mostra que
só na prece pode o homem encontrar amparo. Naquela ocasião, nenhum assim o
compreendeu, tanto que nenhum recorreu a esse cordial da alma, pelo que todos
faliram no momento do perigo. Foi uma lição que muito devemos aproveitar.
Nisto que também disse a
Pedro: Simão, Simão, satanás vos reclamou
a todos para vos joeirar, como se faz ao trigo, aludia à influência que,
sobre aquele apóstolo, exerceria o temor dos acontecimentos que poderiam
dar-se, aos maus pensamentos que lhe germinavam no coração e que, por vezes, o
faziam deplorar ter enveredado por tão perigoso caminho, pensamentos esses que,
embora fugazes, não escapavam à percepção do Mestre. Pedro compreendia que um
grande perigo os ameaçava, a eles e a Jesus, e a fraqueza humana lhe fazia
nascer no íntimo, de quando em quando, um vago sentimento de pesar, por se
haver exposto de tal modo.
Versículos 35 ao 36. As
palavras constantes nestes versículos objetivavam manter os discípulos em
guarda contra os acontecimentos que sobreviriam e fazer-lhes compreender que se
aproximava o momento da luta. Falando-lhes da necessidade de se proverem de
alforje, bolsa e espada, queria compreendessem que iam entrar em ação e que
cumpria se armassem para resistirem aos ataques.
Mas, é claro que tais
palavras eram simbólicas. Jesus, que proibiu a Pedro o uso da espada, não podia
aconselhar a seus discípulos que se armassem de espadas para combater
materialmente.
Em espírito, o que Ele assim
lhes dizia era: “Aproxima-se o momento em que ireis percorrer a Terra. Tomai
todas as precauções para que nada vos falte. Sabeis qual o fim da viagem que
ides empreender. Fazei provisão de ensinamentos, de moral e de exemplos. Sereis
atacados; armai-vos para a defesa. As únicas armas, porém, de que deveis
utilizar-vos são o amor e a caridade”.
Ditas que foram para o
momento e para o futuro, vemos, por essas palavras, que todos os que se
esforcem por imitar os discípulos fiéis do Mestre, no apostolado da era nova,
são apóstolos todos e se devem armar como os do Cristo.
Versículos 37 e 38. Não
tendo compreendido o sentido figurado das palavras deste, os apóstolos logo lhe
apresentaram as duas espadas de que dispunham. O Mestre lhes respondeu: Basta,
o que significava: preciso é que os acontecimentos materiais se cumpram. Os
sucessos é que lhes haviam de abrir o entendimento. De fato, os apóstolos
receberam exemplos de caridade, de paciência e de poder, no que se passou
quando da prisão de Jesus, com o ato de Pedro contra Malco e com a cura operada
neste.
Jesus no horto de Getsêmani. Palavras e
ensinamentos dirigidos aos discípulos. Ele ensina os homens a morrer, depois de
lhes haver ensinado a viver, objetivando o progresso do Espírito
(Mateus,
26:36-46; Marcos, 14:32-42)
39.
Saindo dali, foi, como costumava, para o monte das Oliveiras e seus discípulos
o seguiram. 40. Lá chegando, disse-lhes: Orai, para que não entreis em
tentação. 41. Afastou-se deles obra de um tiro de pedra, ajoelhou-se e orou,
dizendo: 42. Pai, se quiseres, afasta de mim este cálice; entretanto, faça-se,
não a minha vontade, mas a tua. 43. Apareceu-lhe então um anjo do céu a
confortá-lo. Ele, presa de agonia, com mais instância orava. 44. Veio-lhe um
suor como de gotas de sangue que corriam até ao chão. 45. Terminada a sua
prece, levantou-se, foi ter com os discípulos e os achou dormindo em consequência
da tristeza que os acabrunhava. 46. Disse-lhes então: Por que dormis?
Levantai-vos e orai, para não sucumbirdes à tentação.
Jesus desceu até nós, para
nos ensinar a viver e a morrer, pelo que necessário lhe foi tomar um corpo de
aparência humana, a fim de que os homens o tivessem por um homem igual aos
outros. Tudo, pois, tinha que ser e foi, nos fatos, como nas palavras,
apropriado a essa crença.
A Getsêmani, lugar situado
numa das vertentes do monte das Oliveiras, levou Ele consigo os mesmos três
discípulos que o acompanharam ao Tabor, para assistirem à sua transfiguração e
à aparição de Elias e Moisés. Esses discípulos foram Pedro, Tiago e João, que
eram mais apropriados à manifestação espírita que se ia produzir, com
especialidade à aparição do anjo. (Vejam-se as elucidações do capítulo 17,
versículos 1 ao 9, de MATEUS.)
Dizendo-se possuído de
mortal tristeza, quis o Mestre significar aos discípulos e aos homens que,
pressentindo o que ia suceder, seu coração se enchia de amargura extrema pelas
tribulações a que se votavam aqueles a quem viera salvar. Recomendou-lhes que
ficassem ali, para testemunharem o que se ia passar, e que velassem com Ele,
para poderem narrar às gerações futuras o que presenciassem.
Prostrando-se e orando,
fê-lo para ensinar a submissão, a fé, a resignação e a vigilância sobre si
mesmo, com que o homem deve receber as tribulações e as provas, a fim de não
falir nestas, e mostrava o socorro que advém da prece, poderoso cordial da
alma.
Se fosse Deus e quisesse que
os homens assim o considerassem, precisaria Jesus de pedir amparo? Não traria
em si mesmo toda a força de que pudesse necessitar?
Se as manifestações
espíritas são uma mentira e se Jesus era um homem igual aos outros, com uma
veste carnal igual a dos demais, como se há de admitir que um anjo se lhe haja
mostrado e aos três apóstolos? Nem se diga ter sido Ele quem da manifestação
deu notícia aos discípulos. Em tal caso, teria sido um impostor. Como, porém,
nada prova que o Mestre lhes haja falado de semelhante coisa, a manifestação
não houvera passado de uma invencionice dos discípulos. Mas, com que fim a
teriam eles forjado, uma vez que procuravam estabelecer uma divindade em que
não podiam deixar de crer, como o reconhecerá quem se coloque no ponto de vista
dos contraditores a quem nos referimos? A se lhes admitirem as objeções,
forçoso será se reconheça que tudo aquilo foi uma farsa e que todo o Evangelho
é uma fábula.
Vejam, porém, diante desse
dilema, não os que exploram a cegueira humana, nem os que monopolizam a
Ciência, ou vivem a compor facécias para divertir com futilidades os homens,
mas os que se interessam seriamente pelas coisas santas, os que creem e aspiram
à verdadeira bem-aventurança, vejam, dizíamos, a importância da ciência
espírita, a grandeza e sublimidade dessa revelação nova, que vem cumprir e não
destruir, que vem explicar e não rejeitar, que, pondo o Espírito no lugar da
letra, vem mostrar aos homens a origem e a natureza de Jesus, de que modo e em
que condições se deu o seu aparecimento na Terra.
Sendo puro Espírito, apenas
revestido de um corpo perispirítico, para ser visível aos terrícolas, Jesus
estava acima de todos os desfalecimentos e terrores humanos. Assim, com o que
disse e fez no Horto de Getsêmani, apenas deu aos homens um exemplo da
submissão, da perseverança e da fé que lhes cumpre demonstrar nas maiores
angústias. E que o exemplo foi grandemente eficaz e proveitoso, podemos
verificá-lo no espetáculo dos mártires, avançando para o suplício, sem
experimentarem, sequer, aquela agonia mortal de que falam os discípulos, com
referência ao Mestre, dando, com o que disseram, uma demonstração de quão
fortemente os abalou e impressionou a lição que receberam.
Beijo de Judas. Um dos que acompanhavam
a Jesus corta a orelha a um dos do séquito do sumo sacerdote e Jesus a cura
(Mateus,
26:47-56; Marcos 14:43-52; João, 18:1-12)
47.
Falava ele ainda, quando surgiu uma turba, vindo à sua frente um dos doze
apóstolos, o que se chamava Judas, o qual se chegou a Jesus para o beijar. 48.
Jesus O interpelou assim: Pois que, Judas, com um ósculo entregas o Filho do
homem? 49. Vendo os que o rodeavam o que ia acontecer, disseram: Senhor, se os
passássemos à espada? 50. E um deles com um golpe decepou a orelha direita de
um servo do sumo sacerdote. 51. Jesus, porém, disse: Deixai-os, basta; e,
tocando a orelha do ferido, a curou. 52. Depois, dirigindo-se aos príncipes dos
sacerdotes, aos oficiais do templo e aos anciães que tinham vindo prendê-lo,
disse: Viestes armados de espadas e varapaus como contra um ladrão. 53.
Entretanto, todos os dias estava eu convosco no templo e nunca me deitastes as
mãos. É que esta é a vossa hora e o poder das trevas.
Estes trechos apenas referem
fatos históricos que não reclamam comentários.
Juntamos aqui, as dos três
outros Evangelhos, com os quais unicamente nos temos ocupado, a parte
correspondente do de João, para darmos a narrativa integral dos fatos de que
tratamos, visto que as narrações evangélicas se completam e explicam umas pelas
outras.
Tudo o que se deu com relação
à prisão de Jesus, que de tudo quanto aconteceu sabia de antemão, assim como
com relação ao ato de Pedro contra Malco e à cura deste, constituiu um exemplo
de caridade, de paciência e de poder.
Pelo que concerne à queda
dos primeiros que avançaram para se apoderarem do Mestre, resultou de uma ação
fluídica exercida pelos Espíritos que o cercavam. Foi um fato semelhante aos
que hoje se podem observar nas sessões espíritas.
Continham igualmente uma
advertência aos que, de futuro, se ririam e constituiriam diretores da sua
Igreja, dando-lhes a ver que nunca deveriam fazer deste mundo um reino para si,
empunhando armas materiais, como instrumentos de justiça humana, ou de defesa
contra os ataques exteriores.
O mancebo que seguiu a
Jesus, conforme dizem o Evangelista (Marcos, 14:51), envolto num lençol,
simbolizava a lei antiga, que trazia consigo o emblema da morte. Detida no seu
curso, ela se despoja de suas insígnias e se mostra tal qual o Senhor a fez.
Também nós nos devemos despojar das insígnias da morte.
Estamos envoltos em fraudes,
maldades e vícios. Esse o lençol que nos cobre. Abandonemos esse invólucro
fúnebre, como o fez o mancebo de que falam os Evangelistas, nas mãos dos que
tentem embaraçar-nos os passos na senda do progresso moral e apresentemo-nos ao
Senhor nus, isto é, com um coração puro, tal como Ele no-lo deu. Acompanhemos o
Cristo no seu trajeto para o Pretório, deixando pelo caminho os nossos vícios e
paixões, causa da sua ida até lá. Sigamo-lo, trilhando as sendas que Ele traçou
e assim abrandaremos os sofrimentos que lhe causamos à sua passagem pela Terra.
Jesus levado à presença do sumo
sacerdote. Jesus ultrajado e tido por merecedor de condenação à morte
(Mateus,
26:57-68; Marcos, 14:53-65)
54.
Logo o prenderam e levaram a casa do sumo sacerdote. Pedro o seguia de longe. 55.
E como os que ali estavam acendessem um fogo no meio do pátio e se sentassem ao
derredor, Pedro também se sentou entre eles. 63. Os que guardavam a Jesus dele
zombavam e lhe davam pancadas. 64. Vendando-lhe os olhos, batiam-lhe nas faces
e diziam: Adivinha, quem é que te bateu? 65. E, blasfemando, lhe dirigiam
muitas injúrias. 66. Logo que foi manhã, os anciães do povo, os príncipes dos
sacerdotes e os escribas se reuniram e, tendo feito comparecer Jesus perante o
conselho assim formado, lhe disseram: Se és o Cristo, dize-nos. 67.
Respondeu-lhes ele: Se eu disser que sou, não me acreditareis: 68, e, se vos
interrogar, não me respondereis, nem me deixareis partir. 69. Mas, desde agora
o Filho do homem estará sentado à direita do poder de Deus. 70. Então
perguntaram todos: És, portanto, o filho de Deus? Ele respondeu: Vós mesmos o
dizeis, eu o sou. 71. Eles exclamaram: Que mais necessidade temos de
testemunhos, uma vez que nós mesmos o ouvimos da sua própria boca?
Do ponto de vista histórico,
nenhuma explicação se faz necessária. Os fatos são patentes. Do ponto de vista
espírita, já sabemos, pelas explicações que nos foram dadas sobre outros
textos, que sentido cumpre atribuamos às palavras Filho de Deus, quando pronunciadas
ou aceitas por Jesus.
Eu o
sou,
respondeu Ele ao sumo sacerdote. Essa palavra encerrava mais uma alusão velada
à reencarnação, pois se referia àqueles, dentre os que as escutavam, cujos
Espíritos, regenerados pela reencarnação, viverão de novo na Terra, quando esta
se achar depurada. Esses os que o verão, quando Ele, em todo o seu fulgor
espírita, como soberano visível, descer ao seio da Humanidade purificada.
Negação de Pedro
(Mateus,
26:69-75; Marcos, 14:66-72)
56.
Uma criada, que o viu sentado ao lume, o encarou e disse: Este também estava
com aquele homem. 57. Mas Pedro o negou, dizendo: Mulher, não o conheço. 58. Daí
a pouco, um outro: vendo-o, disse: Tu também és daqueles. Respondeu Pedro:
Homem, não sou. 59. Cerca de uma hora depois, outro afirmava: Certamente este
andava com ele, pois que também é Galileu. 60. Pedro respondeu: Homem, não sei
o que dizes. Ato continuo, estando ele ainda a falar, cantou o galo. 61. O
Senhor então, voltando-se, olhou para Pedro e este se lembrou do que o Senhor
lhe dissera: Antes que o galo cante, tu três vezes me negarás. 62. Dali saindo,
Pedro chorou amargamente.
Grande foi o seu remorso,
pois que nele houve apenas fraqueza e não culpa. Houve apenas falta de
previdência, de desconfiança de si mesmo, e não traição premeditada, fruto da
covardia e do egoísmo.
Ao deixar a casa do sumo
sacerdote, ele reconheceu o seu erro e se dispôs a repará-lo. Essa a distinção
que se deve fazer entre a fraqueza e a culpabilidade.
Dificilmente pode o culpado
reparar, no curso de uma existência, a falta durante ela cometida; ao passo que
o fraco pode adquirir a força de que careça. Eis por que são quase sempre
temerários os nossos juízos. Eis como é por que às vezes condenamos o que o
Senhor desculpa e desculpamos o que Ele reprova.
Quando o galo cantou, Jesus
não estava perto de Pedro. Mas, naquele instante, o apóstolo experimentou uma
impressão fluídica que, por um efeito de mediunidade, lhe recordou as palavras
do Mestre, fazendo-o ao mesmo tempo ver o semblante doce e calmo deste, que se
limitava a dirigir-lhe um olhar triste, quando com a ingratidão era pago da
afeição que lhe testemunhara.
Houve, da parte de Jesus,
ação magnética à distância e, da de Pedro, vidência.
SAYÃO, Antonio Luiz. Elucidações evangélicas. FEB (e-book).
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