No volume intitulado Les Six
Nouvelles de Maxime Ducamp, encontra-se uma história tocante, que recomendamos
aos nossos leitores. É a de uma alma errante que conta suas próprias aventuras.
Não temos a honra de conhecer o Sr. Maxime Ducamp, a quem jamais vimos.
Consequentemente, não
sabemos se colheu seus ensinamentos em sua própria imaginação ou em estudos
espíritas. Mas, seja como for, não podia ser mais felizmente inspirado.
Podemos julgá-lo pelo
seguinte fragmento. Não falaremos do quadro fantástico no qual a novela é
encaixada. Isto é um acessório sem importância e puramente formal.
“Eu sou uma alma errante,
uma alma penada. Vago através dos espaços, esperando um corpo. Viajo nas asas
do vento, no azul do céu, no canto dos pássaros, nas pálidas claridades do
luar. Eu sou uma alma penada...
“Desde o instante em que Deus nos separou d’Ele, muitas vezes temos vivido na Terra, avançando de geração em geração, abandonando sem pesar os corpos que nos são confiados e continuando a obra do nosso próprio aperfeiçoamento através
das existências às quais nos
submetemos.
“Quando deixamos este
hospedeiro incômodo, que nos serve tão mal; quando ele vai fecundar e renovar a
terra, de onde saiu; quando em liberdade, enfim, abrimos as asas, então Deus
nos dá a conhecer o nosso objetivo. Vemos nossas existências precedentes;
avaliamos o nosso progresso realizado durante séculos; compreendemos as
punições e as recompensas que nos atingiram, pelas alegrias e pelas dores de
nossa vida; vemos nossa inteligência crescer de nascimento em nascimento, e
aspiramos ao estado supremo, pelo qual deixaremos esta pátria inferior para
ganhar os planetas radiosos, onde as paixões são mais elevadas, o amor menos
ambicioso, a felicidade mais constante, os órgãos mais desenvolvidos, os
sentidos mais numerosos, e que serve de morada para os habitantes de mundos
que, por suas virtudes, se aproximaram da beatitude, mais do que nós.
“Quando Deus nos envia
novamente a corpos que devem viver para nós uma vida miserável, perdemos
totalmente a consciência daquilo que antecedeu a esses novos renascimentos. O
eu que havia despertado volta a dormir; não persiste mais. De nossas passadas
existências restam apenas vagas reminiscências, que são para nós a causa de
simpatias, de antipatias e por vezes de ideias inatas.
“Não falarei de todas as
criaturas que viveram do meu sopro, mas a minha última existência sofreu uma
desgraça tão grande, que é apenas dela que eu vos quero contar a história”.
Seria difícil definir melhor
o princípio e a finalidade da reencarnação, a progressão dos seres, a
pluralidade dos mundos e o futuro que nos espera. Eis agora, em duas palavras,
a história daquela alma.
“Um moço amava uma jovem e
era correspondido. Havia obstáculos opondo-se à sua união. Ele pediu a Deus que
permitisse que durante o sono do corpo, sua alma se desprendesse a fim de ir
visitar a bem-amada. Esse favor lhe foi concedido.
“Assim, todas as noites sua
alma se evola, deixando o corpo em estado de completa inércia, estado de que
não sai senão quando a alma retorna para se reincorporar. Durante esse tempo,
vai visitar a sua amada.
“Ele a vê, sem que ela o
suspeite. Quer falar-lhe, mas ela não o escuta. Observa-lhe os menores
movimentos e surpreende-lhe o pensamento. Fica feliz com as alegrias dela e
triste com as suas dores. Nada mais gracioso e mais delicado que o quadro
destas cenas entre a moça e a alma invisível.
“Mas, oh! fraqueza do ser
encarnado! Um dia, ou melhor, uma noite, ele esquece de si mesmo. Três dias se
passam sem que pense em seu corpo, que não pode viver sem sua alma. De repente,
pensa em sua mãe, que o espera e que deve estar inquieta por causa desse sono
tão prolongado. Corre, mas é demasiado tarde. Seu corpo cessara de viver.
“Assiste aos seus funerais,
depois consola sua mãe. Em desespero, a noiva não quer ouvir falar de nenhuma
outra união. Vencida, entretanto, pelas solicitações da própria mãe, acaba
cedendo, depois de longa resistência.
“A alma errante lhe perdoa
uma infidelidade que não está em seu pensamento. Mas, para receber suas
carícias e não mais deixá-la, pede para encarnar-se no filho que vai nascer”.
Revista espírita — Jornal de
estudos psicológicos, novembro 1859.
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