O
Espiritismo se apresenta sob três aspectos diferentes: o das manifestações, o
dos princípios e da filosofia que delas decorrem e o da aplicação desses
princípios. Daí, três classes, ou, antes, três graus de adeptos: 1° os que creem
nas manifestações e se limitam a comprová-las; para esses, o Espiritismo é uma
ciência experimental; 2° os que lhe percebem as consequências morais; 3° os que
praticam ou se esforçam por praticar essa moral. Qualquer que seja o ponto de
vista, científico ou moral, sob que considerem esses estranhos fenômenos, todos
compreendem constituírem eles uma ordem, inteiramente nova, de ideias que surge
e da qual não pode deixar de resultar uma profunda modificação no estado da
Humanidade e compreendem que essa modificação não pode deixar de operar-se no
sentido do bem.
Quanto
aos adversários, também podemos classificá-los em três categorias.
1ª
– A dos que negam sistematicamente tudo o que é novo, ou deles não venha, e que
falam sem conhecimento de causa. A esta classe pertencem todos os que não
admitem senão o que possa ter o testemunho dos sentidos. Nada viram, nada
querem ver e ainda menos aprofundar. Ficariam mesmo aborrecidos se vissem as
coisas muito claramente, porque forçoso lhes seria convir em que não têm razão.
Para eles, o Espiritismo é uma quimera, uma loucura, uma utopia, não existe:
está dito tudo. São os incrédulos de caso pensado. Ao lado desses, podem
colocar-se os que não se dignam de dar aos fatos a mínima atenção, sequer por
desencargo de consciência, a fim de poderem dizer: Quis ver e nada vi. Não
compreendem que seja preciso mais de meia hora para alguém se inteirar de uma
ciência.
2ª - A dos que, sabendo muito bem o que pensar da realidade dos fatos, os combatem, todavia, por motivos de interesse pessoal. Para estes, o Espiritismo existe, mas lhes receiam as consequências. Atacam-no como a um inimigo.
3ª
- A dos que acham na moral espírita censura por demais severa aos seus atos ou
às suas tendências. Tomado ao sério, o Espiritismo os embaraçaria; não o
rejeitam, nem o aprovam: preferem fechar os olhos. Os primeiros são movidos
pelo orgulho e pela presunção; os segundos, pela ambição; os terceiros, pelo
egoísmo.
Concebe-se
que, nenhuma solidez tendo, essas causas de oposição venham a desaparecer com o
tempo, pois em vão procuraríamos uma quarta classe de antagonistas, a dos que
em patentes provas contrárias se apoiassem demonstrando estudo laborioso e
porfiado da questão. Todos apenas opõem a negação, nenhum aduz demonstração,
séria e irrefutável. Fora presumir da natureza humana supor que ela possa
transformar-se de súbito, por efeito das ideias espíritas. A ação que estas
exercem não é certamente idêntica, nem do mesmo grau, em todos os que as
professam. Mas, o resultado dessa ação, qualquer que seja, ainda que
extremamente fraco, representa sempre uma melhora. Será, quando menos, o de dar
a prova da existência de um mundo extracorpóreo, o que implica a negação das
doutrinas materialistas. Isto deriva da só observação dos fatos, porém, para os
que compreendem o Espiritismo filosófico e nele veem outra coisa, que não
somente fenômenos mais ou menos curiosos, diversos são os seus efeitos.
O
primeiro e mais geral consiste e desenvolver o sentimento religioso até naquele
que, sem ser materialista, olha com absoluta indiferença para as questões espirituais.
Daí lhe advém o desprezo pela morte. Não dizemos o desejo de morrer; longe
disso, porquanto o espírita defenderá sua vida como qualquer outro, mas uma
indiferença que o leva a aceitar, sem queixa, nem pesar, uma morte inevitável,
como coisa mais de alegrar do que de temer, pela certeza que tem do estado que
se lhe segue.
O
segundo efeito, quase tão geral quanto o primeiro, é a resignação nas
vicissitudes da vida. O Espiritismo dá a ver as coisas de tão alto, que,
perdendo a vida terrena três quartas partes da sua importância, o homem não se
aflige tanto com as tribulações que a acompanham. Daí, mais coragem nas
aflições, mais moderação nos desejos. Daí, também, o banimento da ideia de
abreviar os dias da existência, por isso que a ciência espírita ensina que,
pelo suicídio, sempre se perde o que se queria ganhar. A certeza de um futuro,
que temos a faculdade de tornar feliz, a possibilidade de estabelecermos
relações com os entes que nos são caros, oferecem ao espírita suprema
consolação. O horizonte se lhe dilata ao infinito, graças ao espetáculo, a que
assiste incessantemente, da vida de além-túmulo, cujas misteriosas profundezas
lhe é facultado sondar.
O
terceiro efeito é o estimular no homem a indulgência para com os defeitos
alheios. Todavia, cumpre dizê-lo, o princípio egoísta e tudo que dele decorre
são o que há de mais tenaz no homem e, por conseguinte, de mais difícil de
desarraigar. Toda gente faz voluntariamente sacrifícios, contanto que nada
custem e de nada privem. Para a maioria dos homens, o dinheiro tem ainda
irresistível atrativo e bem poucos compreendem a palavra supérfluo, quando de
suas pessoas se trata. Por isso mesmo, a abnegação da personalidade constitui
sinal de grandíssimo progresso.
Fonte:
O livro dos
Espíritos. Allan Kardec. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB, DF.
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