O relato seguinte foi
extraído da Segunda Viagem ao Redor do Mundo, da Sra. Ida Pfeiffer:
“Já que vou falar de coisas
muito estranhas, é preciso mencionar um acontecimento enigmático, passado em
Java, há alguns anos, e que causou tal sensação que chegou a chamar a atenção
do governo.
“Na residência de Chéribon
havia uma casinha, na qual, segundo dizia o povo, apareciam Espíritos. Ao cair
da noite, chovia pedras no quarto, vindas de todas as direções e por todos os
lados cuspiam siri.* Tanto as pedras quanto as cusparadas caiam junto às
pessoas que estavam no aposento, mas nem as atingiam, nem as feriam. Parece que
tudo isso era dirigido particularmente contra uma criança. Tanto se falou desse
caso inexplicável que o governador holandês encarregou um oficial superior de
sua confiança de examiná-lo.
* Preparação que os
javaneses mascam continuamente e que dá à boca e à saliva a cor do sangue. O
nome de siris, do hindustani siris e do sânscrito sirisa, é dado a várias
plantas do gênero Albizzia, especialmente à A. Iebbek e à A. Julibrissin. (Nota
original, complementada pelo Tradutor).
O oficial determinou que se postassem em torno da casa homens sérios e fiéis, com ordem de vedar a entrada e a saída de quem quer que fosse. Examinou tudo, escrupulosamente e, tomando em seu colo a criança designada, sentou-se na sala fatal. Ao anoitecer começou, como de costume, a chuva de pedras e de siri. Tudo caía perto do oficial e do menino, sem atingi-los. Novamente examinaram cada recanto, cada buraco. Nada, porém, foi descoberto. O oficial não podia compreender.
Mandou juntar as pedras,
marcá-las e escondê-las num recanto bem afastado. Foi tudo em vão. As mesmas
pedras caíram novamente na sala, à mesma hora.
“Por fim, e para pôr termo a
essa história inconcebível, o governador mandou demolir a casa”.
A pessoa que colheu este
fato em 1853 era uma senhora realmente superior, menos por sua instrução e por
seu talento do que pela incrível energia de seu caráter.
Além dessa ardente
curiosidade e dessa coragem indômita, que a tornaram a mais admirável viajante
que jamais existiu, a Sra. Pfeiffer nada tinha de excêntrico. Era uma senhora
de uma piedade suave e esclarecida e que provou muitas vezes estar longe de ser
supersticiosa. Tinha como lei só contar aquilo que ela mesma tivesse visto, ou
captado em fonte insuspeita.
1. ─ Evocação da Sra.
Pfeiffer.
─ Aqui estou.
2. ─ Estais surpresa pelo
nosso chamado e por vos encontrardes entre nós?
─ Estou surpresa com a
rapidez da minha viagem.
3. ─ Como fostes prevenida
de que desejávamos falar-vos?
─ Fui trazida aqui sem o
perceber.
4. ─ Entretanto deveríeis
ter recebido um aviso qualquer.
─ Um arrastamento
irresistível.
5. ─ Onde estáveis quando do
nosso chamado?
─ Junto a um Espírito que
tenho a missão de guiar.
6. ─ Tivestes consciência
dos lugares que atravessáveis para vir até aqui, ou aqui vos encontrastes
subitamente, sem transição?
─ Subitamente.
7. ─ Sois feliz como
Espírito?
─ Sim. Não se pode ser mais
feliz.
8. ─ De onde vinha o vosso
pronunciado gosto pelas viagens?
─ Eu havia sido marinheiro
numa vida precedente. O gosto adquirido pelas viagens naquela existência
refletiu-se nesta, a despeito do sexo que eu havia escolhido para me subtrair a
isso.
9. ─ As viagens contribuíram
para o vossa progresso como Espírito?
─ Sim, porque eu as fiz com
espírito de observação, que me faltou na existência anterior, em que não me
ocupei senão do comércio e das coisas materiais. Eis porque supunha que pudesse
progredir mais numa vida sedentária. Mas Deus, tão bom e tão sábio em seus
desígnios para nós impenetráveis, permitiu que eu utilizasse as minhas
inclinações em favor do progresso que eu solicitava.
10. ─ Das nações que
visitastes, qual a que vos pareceu mais adiantada e qual preferis? Não
dissestes em vida que colocáveis certas tribos da Oceania acima das mais
civilizadas nações?
─ Era uma ideia errada. Hoje
prefiro a França, porque compreendo sua missão e prevejo o seu destino.
11. ─ Que destino prevedes
para a França?
─ Não vos posso dizer o seu
destino, mas sua missão é de semear o progresso e as luzes e, portanto, o
Verdadeiro Espiritismo.
12. ─ Em que vos pareciam os
selvagens da Oceania mais adiantados que os americanos?
─ Eu via neles, abstraídos
os vícios do estado selvagem, qualidades sérias e sólidas que não encontrava em
outros lugares.
13. ─ Confirmais o fato
passado em Java e relatado numa de vossas obras?
─ Confirmo-o em parte. O
caso das pedras marcadas e novamente atiradas merece uma explicação. Eram
pedras semelhantes, mas não as mesmas.
14. ─ A que atribuís esse
fenômeno?
─ Não sabia a que
atribuí-lo. Eu me perguntava se o diabo existiria de fato, e respondia para mim
mesma que não. Não passei disso.
15. ─ Agora que percebeis a
causa, poderíeis dizer-nos de onde vinham essas pedras? Eram transportadas ou fabricadas
especialmente pelos Espíritos?
─ Eram transportadas. Para
eles era mais fácil trazê-las do que aglomerá-las.
16. ─ E de onde vinha aquele
siri? Era feito por eles?
─ Sim. Era mais fácil e
mesmo inevitável, pois que impossível lhes era encontrá-lo já preparado.
17. ─ Qual era o objetivo
dessas manifestações?
─ Como agora, atrair a
atenção e fazer constatar um fato do qual se tinha de falar e procurar a
explicação.
Observação: Alguém observa
que tal constatação não poderia conduzir a nenhum resultado sério entre aquela
gente. Pode-se responder que há um resultado real, pois que, pelo relato e
testemunho da Sra. Pfeiffer, o mesmo chegou ao conhecimento de povos
civilizados, que o comentam e lhe tiram as conclusões. Aliás, os holandeses é
que foram chamados a constatá-los.
18. ─ Haveria nesse caso um
motivo especial, sobretudo quanto à criança atormentada por esses Espíritos?
─ A criança possui uma
influência favorável, eis tudo, pois pessoalmente não sofreu sequer um
arranhão.
19. ─ Desde que esses
fenômenos eram produzidos por Espíritos, por que cessaram quando a casa foi
demolida?
─ Cessaram porque foi
julgado inútil continuar, mas não iríeis decerto perguntar se eles teriam
podido continuar.
20. ─ Agradecemos a vossa
vinda e a bondade de responder às nossas perguntas.
─ Estou inteiramente às
vossas ordens.
* Preparação que os
javaneses mascam continuamente, e que dá à boca e à saliva a cor do sangue.
Revista espírita — Jornal de
estudos psicológicos, dezembro 1859.
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